Os trabalhadores brasileiros, que nada fizeram para provocar a crise, são os que mais pagarão pelas trapalhadas na economia. Pagarão com seus empregos, seus salários, seus direitos e suas horas de trabalho. Muitos já perderam seus empregos e, pelo andar da carruagem, outros milhões deverão perdê-los nos próximos meses. Os que conseguirem manter-se trabalhando perderão renda. Acuados, aceitarão acordos com reajustes de salários abaixo da inflação.
Também não foram os empresários que causaram a crise, sendo estes também vítimas da trapalhada macroeconômica. Mas, dos donos do capital era de se esperar, ao menos, alguma solidariedade, uma palavra de consolo para aqueles que enfrentam o desafio da sobrevivência. Mas, não. A insensibilidade e a arrogância estão na alma de seus representantes.
Na sexta-feira, o presidente da CNI, o mineiro Robson Andrade, e mais um grupo de 150 empresários de um grupo auto-intitulado Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), almoçaram com o presidente interino Michel Temer. Foram defender a adoção de medidas “duras e modernas” como as reformas da Previdência Social e da legislação trabalhista. Na saída, Andrade conversou com jornalistas e citou o exemplo do governo francês que elevará, sem submeter ao parlamento, a jornada de trabalho para até 60 horas semanais.
Ainda na tarde de sexta, ante a repercussão negativa e imediata das declarações de seu presidente, a CNI distribuiu nota na qual afirma que Andrade “jamais defendeu o aumento da jornada de trabalho brasileira, limitada pela Constituição Federal em 44 horas semanais”. E, ainda, que a CNI tem “profundo respeito pelos trabalhadores brasileiros e pelos direitos constitucionais”. Porque, então, Andrade teria citado o exemplo da França? Apesar dos esforços de sua assessoria, o estrago já estava feito.
O fato é que Robson Andrade falou aquilo que de fato acredita. Que os direitos assegurados pela legislação trabalhista são uma amarra que impede o crescimento do capital. E, em parte, ele tem razão. As leis do trabalho e a Previdência precisam, de fato, serem modernizadas. Mas não agora, não por um governo interino (e, portanto, ilegítimo para tal), e não para quebrar o círculo vicioso da crise no qual entramos.
A crise, como sabemos, é consequência da conjunção de inúmeras variáveis não estruturais. Externamente, tivemos a depressão das commodities e a sequência de duas crises financeiras internacionais. Internamente, a paralisia da Petrobras, o ajuste fiscal suicida e a insistência numa política macroeconômica baseada em juros estratosféricos e câmbio artificialmente valorizado.
É na política macroeconômica, e não nos direitos trabalhistas, que os empresários deveriam estar batendo neste momento. É risível ouvir representante empresarial falar de jornada de trabalho enquanto o governo privilegia descaradamente o capital financeiro em detrimento ao capital produtivo.
Discutir com Temer as taxas de juros, a baixíssima liquidez da economia, a falta de crédito, o absurdo do compulsório e os cortes nos investimentos do governo seria muito mais produtivo. Já as mudanças estruturais, aquelas que levarão a mudanças constitucionais, é melhor deixar para um governo legitimamente eleito pelos brasileiros.