"Amour" questiona sobre até onde a vida deve ser vivida

Homero Gottardello - Do Hoje em Dia
30/12/2012 às 10:52.
Atualizado em 21/11/2021 às 20:10
 (Divulgação)

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O que você faria pela pessoa que ama? Você seria capaz de matá-la, por amor? "Amour", que estreia no Brasil em janeiro, conta a história de um casal de idosos parisienses, interpretado por Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva, que vive com cumplicidade e independência. Ambos são professores de música aposentados e sua única filha, vivida por Isabelle Huppert, mora no exterior.

A tranquilidade idílica do casal é interrompida por um episódio, em que Anne perde momentaneamente a memória, enquanto conversa com Georges, na cozinha. Pouco tempo depois, ela sofre um acidente vascular cerebral e passa a necessitar de cuidados especiais.

O diretor alemão Michael Haneke venceu a Palma de Ouro do Festival de Cannes deste ano, com o filme. O cineasta, mais conhecido pela abordagem cética da violência ("A Fita Branca" e "Violência Gratuita", além de "O Tempo do Lobo") e da sexualidade ("A Professora de Piano"), trata agora do mais complexo aspecto filosófico do casamento.

Schopenhauer

E o casamento de Georges e Anne é um exemplo da dívida contraída na juventude que, segundo Arthur Schopenhauer, será paga na velhice. Seguindo a tradição judaico-cristã de "até que a morte nos separe", o marido octogenário desafia a doença degenerativa da esposa com paciência e resignação.

Todos os seus esforços físicos e economias são aplicados na sobrevida de Anne e, aqui, vale destacar a atuação de Emmanuelle Riva (que já recebeu sete premiações pela interpretação), que transmite não só as limitações físicas que seu personagem passa a enfrentar, mas também seu flagelo e debilidade.

É impossível o espectador não se sentir profundamente tocado pela luta infrutífera de Georges, até porque "Amour" se passa quase que integralmente dentro do apartamento do casal, não dando brechas para fuga de seus "hóspedes".

As aparições pontuais da filha, sempre preocupada com questões mundanas, e do aluno do passado, hoje um consagrado intérprete, servem para pontuar a vergonha que Anne sente de sua própria situação, o respeito de seu velho companheiro em relação à ela e a compreensão cada vez maior com o que é irreversível.

Os filmes de Haneke sempre provocam quem os vê e, neste caso, a doçura do sublime amor de um casal de velhinhos dá lugar ao extremo da eutanásia. Mais do que à controvérsia, o cineasta nos leva a refletir sobre a senilidade e até onde a vida vale a pena ser vivida.

O dever de um marido, diante do sofrimento incurável da mulher, e a vontade implícita de uma personagem, que parece preferir a morte a seguir entrevada, são apenas duas de centenas de questões que ficam na cabeça, depois de assistir "Amour".

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