(Lucas Braga/Divulgação)
Crianças subnutridas do Brasil e de outras partes do mundo podem ser beneficiadas por um produto 100% mineiro, desenvolvido em Montes Claros, no Norte do Estado. Criada no laboratório da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), uma fórmula à base de soro de leite, frutas do Cerrado e um complemento ferroso mostrou-se eficaz contra o problema de saúde em meninos e meninas de 2 a 5 anos. Os bons resultados foram comprovados em apenas 60 dias de uso.
Para se ter uma ideia, no país todo, quase 150 mil crianças sofrem com a desnutrição, segundo levantamento do Observatório da Criança e Adolescente. Em Minas, o número é igualmente alto: cerca de 26 mil.
A próxima etapa do projeto é viabilizar parcerias para que o produto seja desenvolvido em escala industrial e possa ser, inclusive, incorporado como suplemento alimentar na merenda de escolas públicas.
Desenvolvida por pesquisadores do Instituto de Ciências Agrárias (ICA) da UFMG e parceiros como a Pastoral da Criança, a pesquisa teve como foco inicial o desenvolvimento físico e cognitivo de meninos e meninas que vivem na área urbana de Montes Claros.
Financiado pelo Ministério da Educação (MEC), o estudo contemplou, na primeira etapa, cerca de 15 crianças com subnutrição comprovada por exames clínicos. Durante dois meses, elas receberam garrafinhas de 200 ml da bebida láctea. O produto foi consumido diariamente como fonte principal para reposição de ferro, nutriente pouco presente na dieta alimentar das famílias.
De perto
Professor de engenharia bioquímica na UFMG e coordenador do projeto, o engenheiro de alimentos Igor Viana Brandi explica que, além de distribuir o iogurte, a equipe, formada por profissionais de diferentes áreas, fez um acompanhamento nutricional e antropométrico dos pacientes.
“Cadastramos as famílias, analisamos o material coletado nas crianças e fizemos também um trabalho de conscientização quanto à importância de uma dieta equilibrada”, reforçou o pesquisador. A cada 15 dias, as famílias voltam a ser visitadas para novas análises.Lucas Braga/Divulgação
Desenvolvido em laboratório por pesquisadores e bolsistas da UFMG, suplemento recebeu aprovação da Vigilância Sanitária e pode, agora, ser incluído até na merenda escolar
À base de frutas regionais, suplemento alimentar foi aprovado por 85% das crianças
Antes de ser produzida em laboratório, a bebida láctea passou por uma prova de fogo: uma avaliação sensorial feita por crianças de 5 a 8 anos. No teste, realizado em escolas da rede pública, 85% dos potenciais pacientes para consumo da fórmula aprovaram a bebida. O aval positivo tem a ver com a escolha dos ingredientes, dentre eles frutas regionais, como mangaba, coquinho e umbu, e do composto de ferro adicionado à receita e que não deixa gosto residual.
Nutricionista responsável pelo projeto, Karoline Soares Farias explica que, diferentemente do sulfato ferroso, que costuma ter baixa adesão entre as criança, o fumarato ferroso, escolhido pelos pesquisadores, não prejudica o paladar. “Além de ser melhor absorvido pelo nosso sistema, não provoca distensão abdominal, aquela sensação de estufamento, portanto a criança quase não sente dores de barriga, nem escurecimento dos dentes. O composto também não tem gosto amargo, como o sulfato”, detalha.
Segundo a especialista, além da recomendação de ingestão diária da bebida láctea, as famílias foram orientadas a melhorar a qualidade da alimentação, incluindo, principalmente, fontes de vitamina C nas refeições para ajudar na absorção do ferro presente na bebida.
Pais de crianças subnutridas também foram orientados a suspender o consumo de leite e derivados uma a duas horas antes de almoço e jantar, pois isso também dificulta a absorção do nutriente.
Responsável pela pesquisa, o engenheiro de alimentos Igor Viana Brandi diz que um dos próximos passos do grupo é conseguir desenvolver a fórmula em pó, tanto para facilitar a distribuição do composto quanto o armazenamento e a administração pelas famílias dos pacientes.
Além disso:
Problema que atinge milhares de pessoas no mundo todo, sobretudo em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, a subnutrição é causada por alimentação deficiente e, consequentemente, por falta de determinados nutrientes essenciais à saúde. Geralmente, o problema acomete pessoas submetidas a dietas baseadas somente em carboidratos e gorduras, pobres, portanto, em frutas, verduras e proteínas, como a carne.
Deficiente, a alimentação mata a fome, mas não fornece elementos essenciais como vitaminas e sais minerais, necessários para o bom funcionamento do corpo. A ingestão de alimentos em quantidade menor que a necessária leva o organismo a gastar as reservas de gordura para manter o metabolismo do corpo. “Nesse processo, a pessoa perde, além de massa magra, gordura, tornando-se apática”, detalha a nutricionista Karoline Soares Farias.
As consequências do agravamento do problema de saúde vão desde doenças como raquitismo, escorbuto, osteoporose e cegueira-noturna à mais grave delas, a morte. Dentre os fatores que agravam o problema estão aumento da população, má distribuição de renda, precários sistemas de distribuição de alimentos e baixa escolaridade.