Carmina Burana grandiloquente

23/03/2016 às 18:08.
Atualizado em 16/11/2021 às 02:37

Um dos objetivos do consagrado compositor alemão Carl Orff (1895-1982) foi liberar a ópera da complexidade crescente que assumira desde o romantismo. Simultaneamente, apelou para a simplicidade melódica, procurando estabelecer relações mais diretas entre a cena e o público. 
“Carmina Burana” é, pois, a consecução da proposta, estruturada como cantata cênica. Aborda poemas profanos, escritos em baixo-latim e baixo-alemão. Literatura difícil de se mostrar, tem nos textos íntimas revelações de clérigos do Mosteiro Beneditino de Beuron, na Bavária.
Apresentada pela primeira vez em Francoforte do Meno, em 1937, tornou-se popular em toda Alemanha. Atingiu as camadas sociais mais simples, num apelo aos princípios estéticos, propugnados pelo Terceiro Reich.
De grandiloquente concepção, trata-se das mais desafiantes propostas corais, tanto sob o aspecto rítmico, quanto do andamento; da exatidão vocal, uníssona, afinada, cuja dinâmica da palavra sustentada musicalmente, requer especial atenção.
Tais atributos não faltam ao Coral Lírico de Minas Gerais, preparado e conduzido pelo festejado maestro Lincoln Andrade. De singelas maneiras, busca na energia toda força construtiva, em prol do grupo que lidera. O resultado tem sido o melhor, registrando-se o êxito pela magnífica atuação do aludido coral, na Sala Minas Gerais, por ocasião da recente apresentação da “Nona Sinfonia”, de Beethoven. Igualdade das vozes femininas e masculinas, ou a polifonia de acurada precisão na dificílima “Ode à Alegria”, momento de suprema emoção!
Quanto à “Carmina Burana”, sua temática nada tem de sagrado, como sugere o subtítulo “Cantiones profanae”. É a exposição dos meandros monásticos de remotas eras – ao sabor dos mais intransigentes – diversa da música ostentada de belíssimo estilo, explicam os musicólogos.
A música não carece de quaisquer avaliações da sua finalidade, no que concerne aos aspectos meramente morais. Não tem pátria, nem idioma e preconceitos. Fala à emoção, ao coração e à alma, valendo-se de si mesma. É a tese de Mozart (1756-1791) – antagonista a Christophe von Gluck (1714-1787) – ao ser atacado pelos textos de algumas das suas óperas. Para o gênio de Salsburgo pouco importava o que se dizia a respeito. Importante, isto sim, era a música... Favorável ou não, vejo-me incapaz de opinar tecnicamente. Mas, fico com Mozart, em razão do arrebatamento suscitado musicalmente.
Concorreram ao sucesso desta apresentação de “Carmina Burana”, no Grande Teatro do Palácio das Artes, o soprano Maíra Lautert; o tenor Gian Nardot e o barítono Eduardo Sant’Anna, assim como os pianistas Islei Correia e Wagner Sander. Elogiável, o Grupo de Percussão da UFMG.
Loas à direção artística da Fundação Clóvis Salgado, na pessoa de Cláudia Malta, cujo nome se insere nos mais elevados quadros da representatividade artística e cultural deste Estado.
Em prol da nossa memória, vale lembrar que por ocasião da inauguração do Palácio das Artes levou-se à cena “Carmina Burana”, com a intervenção da grande mezzo Anna Maria Martins, de saudosa lembrança.
A próxima atração (nos dias 29 e 30) será o “Requiem”, de Giuseppe Verdi, com a Orquestra Sinfônica e o Coral Lírico de Minas Gerais, além de consagrados solistas. Trata-se do espetáculo de abertura da temporada de obras eruditas, tradicional compromisso da Fundação Clóvis Salgado, no cumprimento da sua precípua competência.

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