Ana Paula Seixas
Nos últimos anos, o Brasil sofreu com os escândalos de corrupção envolvendo o governo e empresas privadas. Matérias relacionadas a propina, caixa 2 e condutas inadequadas invadiram os noticiários, deixando uma sensação de impotência e inconformismo nos brasileiros. Afinal, todo um sistema parecia corrompido. Só para se ter uma ideia, uma pesquisa divulgada pelo Datafolha, durante a corrida eleitoral de 2018, apontava que a corrupção era a terceira maior preocupação do brasileiro, empatando com o desemprego e ficando atrás apenas da violência e da saúde.
Na contramão disso e como maneira de melhorar a imagem frente ao consumidor, diversas empresas têm apostado em políticas de compliance. Pautada pela transparência e ética – filosofia responsável pela investigação dos princípios que motivam, disciplinam ou orientam o comportamento humano –, essa prática nada mais é do que estar em conformidade com as leis, padrões morais e regulamentos internos e externos. É por meio dela que o agente econômico reforça o seu compromisso com os valores e objetivos da empresa e busca promover uma cultura corporativa de respeito às leis e regulamentos. Não por acaso, o termo compliance significa “estar em conformidade com”.
Curiosamente, é exatamente em épocas turbulentas como a que vivemos hoje que essa prática ganha força. Seu próprio surgimento remonta à virada do século XX, com a criação do Banco Central dos Estados Unidos, cujo objetivo era tornar o ambiente financeiro mais flexível, seguro e estável. Algumas décadas depois, nos anos 70, a Foreing Corrupt Practies Act (FCPA), uma lei anticorrupção transnacional, endureceu as penas para organizações americanas envolvidas com corrupção no exterior. No entanto, foi só com os escândalos de corrupção envolvendo empresas privadas e governos que diversas companhias iniciaram, de maneira espontânea, a adoção de práticas de compliance.
Movimento semelhante aconteceu no Brasil, quando, em 1992, o tema ganhou destaque nas propagandas do governo Collor e, principalmente, em seu processo de impeachment. Após a queda do caçador de marajás, que foi derrubado pelo próprio irmão, o país começou a adequar-se aos padrões éticos e de combate à corrupção. Ainda na década de 90, a abertura do capital financeiro e a entrada de transnacionais no mercado brasileiro serviram como gatilho para que essas posturas fossem implementadas. Mesmo assim, nunca se falou tanto em compliance quanto nos últimos anos – principalmente depois que setores administrativos e financeiros de algumas empresas foram evidenciados na Lava Jato de forma negativa.
E é justamente para evitar esse tipo de atitude que essa prática é tão importante. A ética profissional no trabalho está entre as qualidades mais valorizadas do mercado. É por meio dela que a empresa é enriquecida. Como gerente Jurídico e Compliance, posso afirmar que, quando aplicadas da maneira certa, essas medidas melhoram a credibilidade da indústria perante os consumidores, investidores e fornecedores. Mas não é só isso, em uma perspectiva mais ampla, o cultivo de uma ética profissional traz benefícios imediatos. A saúde (física e psicológica) no ambiente de trabalho melhora consideravelmente; as relações e comunicações interpessoais se tornam mais positivas; há um aumento na qualidade dos produtos e serviços e diminuição das falhas. Ou seja: é uma medida positiva para o ambiente corporativo em meio a tempos sombrios.
Gerente Jurídico, de Relações Institucionais e Compliance da Leão Alimentos e Bebidas