Wagner Dias Ferreira*
O mês de maio traz fortes manifestações culturais à vida brasileira. Foi no 13 de maio de 1888 que se promulgou a lei de libertação dos negros brasileiros, que até ali eram escravizados, completando 130 anos agora deste feito. A lei não eliminou o racismo, o preconceito e nem abriu um lugar social digno para os negros. Esta é uma luta que se trava ainda hoje, a cada momento, no enfrentamento de cada olhar. Com organização e ação permanente. Tudo para implantação de uma justiça real, onde sejam observáveis os valores da liberdade e igualdade para todos.
Em maio, a igreja católica comemora o dia de Santo Ivo (19 de maio), o patrono da advocacia e da justiça. E, exatamente dentro deste mesmo mês, há, na história brasileira, o registro da abolição da escravatura. Desta forma, serão sempre associados os temas da negritude no Brasil com o da efetivação da justiça, e tendo como justiça a permanente ideia de realização da igualdade e liberdade.
Assim, toda atividade desenvolvida pelas comunidades negras no mês de maio são comemorações da preservação de sua cultura, mas antes de tudo registros da luta pela igualdade e liberdade, no permanente combate ao racismo e outras manifestações de preconceito.
Maio permite o desenvolvimento de necessárias reflexões associando a mística de Santo Ivo com as lutas contra o racismo e o preconceito racial porque ambas são lutas por justiça. Não uma justiça qualquer, mas uma justiça plena de amor, aquele amor misericórdia que Jesus descreveu na parábola do samaritano.
Na parábola, um homem é agredido por salteadores e, convalescente na margem da estrada, é ignorado e até repudiado por “nobres” na sociedade da época. Somente um samaritano, “escória social” da época (hoje nós chamaríamos de minorias), pode exercer por aquele homem a misericórdia. Por isso, no final, a demonstração de que este é o verdadeiro amor. Sem preconceitos e sem racismo. Num conto totalmente cristão pode e deve permitir uma associação direta do Santo Cristão com as lutas do povo. Sempre respondendo à pergunta “Quem serão os próximos dessas pessoas que hoje lutamos por espaço social equivalente ao dos brancos?”.
É fato na história de Santo Ivo que o santo advogado e juiz cuidava dos pobres. Tinha forte preocupação com a saúde desses, por vezes em sacrifício de si mesmo. Ou seja, considerava a todos como seus próximos, tendo com eles a atitude do samaritano.
A reflexão que nos propõe o mês de maio é de que devemos, segundo o carisma do Santo Ivo, atentos a esta sincronia de datas no mês, dia do santo e abolição da escravatura, buscar uma atitude pessoal, social e de governo semelhante a do samaritano, sem preconceitos, sem racismo e de misericórdia com o próximo, de solidariedade e fraternidade.
Nesta breve reflexão sobre racismo, preconceito, a justiça e seu santo patrono, registra-se a estima e a homenagem ao desembargador Hebert Carneiro, recém falecido, que deixou grande legado de justiça misericordiosa.
*Advogado e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG