Antônio Álvares da Silva*
As recentes declarações do deputado Jair Bolsonaro de que não aceitará o resultado das eleições para a Presidência da República se sair derrotado causou profunda preocupação em todas as classes sociais. É um ato de violência e insubordinação ao estado democrático de direito, nosso maior bem.
A democracia é um longo aprendizado, que vem desde a Grécia. Sofreu correções através dos tempos e assumiu nos tempos hodiernos forma definitiva, na qual se consagraram princípios que constituem a base de todo estado democrático. Eleição livre, sem mácula ou fraudes, é um destes princípios.
Por ele o cidadão, última e maior referência do Poder, delega aos poderes da República sua vontade política, indicando livre e autonomamente, por meio dos partidos políticos, os nomes que vão exercer as atividades de governo.
Pelas eleições o povo delega diretamente ao Estado sua preferência aos candidatos que, através de um partido, vão preencher legitimamente os principais cargos e através deles, agirfuncionalmente para satisfazer os interesses coletivos. Por isso, eleições livres são a maior demonstração da vitalidade das democracias que hoje existem no mundo ocidental.
O estado de direito é um amplo tecido de leis que regulam as condutas individuais e coletivas. Estabelecem a base que é a referência de tudo, a fim de as ações, tanto dos indivíduos quanto do Estado, não vão além das fronteiras marcadas pela lei. Esta situação é que forma “as regras do jogo” que todos devem observar e cumprir, exatamente porque todos são iguais perante elas.
Por isto as declarações de Bolsonaro constituem uma agressão fundamental ao jogo democrático, pois estabelecem uma cláusula leonina e unilateral: o jogo só vale se eu ganhar.
Mas o mais grave desta atitude é que ela transformaria as eleições numa ampla e ridícula farsa em que há vários candidatos, mas já se sabe que só um “pode” ganhar. Por isto é que a primeiro ato dos ditadores em todo o mundo é impedir eleições livres pois qualquer candidato pode ganhar e contrariar as vontades dele.
Bolsonaro não explicou, pelo menos até agora, o que acontecerá se ele rejeitar a vontade das urnas. Vai se levantar contra a vontade do povo? Vai pegar em armas para garantir sua eleição e obrigar o povo a tomá-lo como presidente?
São perguntas para as quais não sabemos ainda a resposta exata, mas o certo é que houve um desafio à ordem democrática constituída e precisamos saber o que está atrás destas palavras que têm a ousadia de ameaçar a democracia brasileira, consolidada com tanto esforço.
A alegação de erro ou má programação do sistema de apuração eleitoral não é seguida de nenhum dado concreto. Portanto não existem provas para colocar sob suspeita um modelo de apuração que sempre funcionou bem e é admirado no exterior.
Se se trata de palavras de um bravateiro, o fato morrerá por si mesmo. Mas caso sejam ameaça concreta com base em algo submerso que viria à tona depois de resultado desfavorável a Bolsonaro, é preciso, como nunca, a união de todos. A democracia é um bem que pertence à nação.. Por isto precisa da defesa de todos. O povo brasileiro vai mostrar nas urnas sua vontade livre e soberana e nossa democracia vai crescer mais ainda ao aceitá-la.
(*)Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG