Bady Curi Neto* A primeira turma do STF iniciou o julgamento da denúncia feita pela Procuradoria Geral da República contra o deputado Jair Bolsonaro por crime tipificado no art. 20 da Lei 7716/89, que diz sobre praticar, induzir ou incitar discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Segunda a denúncia, Jair Bolsonaro palestrou no Clube Hebraico manifestando de forma negativa e preconceituosa sobre os quilombolas, indígenas, refugiados, mulheres e LGBTQI+, caracterizando em sua fala palavras de ódio. Bolsonaro, com sua forma rude de manifestar, defendeu o fechamento das fronteiras brasileiras aos estrangeiros refugiados, chamou os quilombolas de preguiçosos, disse do absurdo das reservas indígenas – que caso eleito não vai dar dinheiro do governo para ONGS e que eles vão ter que trabalhar, tudo isso de maneira enfática e acintosa. Em seu discurso, grosseiramente, chegou a dizer que encontrará um “quilombola com sete arroubas”. O processo foi suspenso com dois votos proferidos em favor do recebimento da denúncia e dois votos contra, pediu vista o ministro Alexandre de Moraes. O relator, ministro Marco Aurélio, ao rejeitar a denúncia, discorreu de forma professoral que, para a configurar o crime de discriminação ou preconceito, não basta que o indivíduo aponte diferenças entre grupos de pessoas, apontando superioridade de um sobre o outro, pois isto verdadeiramente pode ocorrer, seja de forma intelectual, moral ou de outra avaliação. É necessário para a configuração do crime não a distinção entre grupo superior ou inferior como dito no voto, pois esta relação pode derivar tanto da concepção de que o superior tem o dever de ajudar o inferior, quanto a concepção de que o superior tem o direito de suprimir o inferior. Somente quando esta diversidade leva a este segundo modo de conceber a relação entre superior e inferior é que pode falar corretamente em uma verdadeira discriminação. Em outras palavras, para configurar a discriminação ou preconceito existe a necessidade de que a fala proferida incite a supressão, eliminação ou mesmo a escravização de um grupo. Acrescente-se que para tipificação do crime é necessário que as palavras possam desencadear prática de atos discriminatórios, mesmo que estes não venham a ocorrer.Fora desses paramentos, bem delimitados, estamos diante de um permissivo legal, de ordem Constitucional, a Liberdade de Expressão, valor maior de um Estado Democrático de Direito. Mesmo quando um discurso ou ponto de vista não se encaixa no Politicamente Correto, não há falar em crime, se não preenchido os requisitos acima, sob pena de voltarmos à época da censura. Ao inverso, acaso alguém profira um discurso que a política do governo está voltada para brancos de olhos azuis (determinação de um grupo) pode-se falar em discriminação? Evidentemente que não, se está diante de uma fala política, protegido pela liberdade de expressão. Não há duvidas sobre a rudeza das palavras proferidas por Bolsonaro, mas tipificá-la como crime há uma distancia abissal, sob pena de, perigosamente, mitigarmos a liberdade de expressão, permitindo manifestações de acordo com o politicamente correto. *Advogado fundador do Escritório Bady Curi Advocacia Empresarial, ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) - bady.curi@badycuri.com.br