Antônio Álvares da Silva
A greve dos caminhoneiros pôs o governo de joelhos. A anarquia fez com que a ordem se recolhesse, dando lugar ao caos. Alguns insensatos chegaram a pedir, através de cartazes, a “volta dos generais”, como se o problema social se resolvesse com mobilização de tropas.
A situação duvidosa ainda permanece e o incêndio não se apagou completamente. Do ponto de vista jurídico, é preciso entender os fatos para depois chamar a lei e aplicá-la. Acontece que a situação é um amálgama de forças e interesses em jogo e não é fácil colocar de novo a locomotiva nos trilhos para o país sair da crise e continuar sua viagem de prosperidade na direção de um futuro melhor.
A primeira dificuldade está nas diversas entidades que atuam no conflito, pois os caminhoneiros têm vários órgãos representativos: sindicato dos caminhoneiros, União nacional dos caminhoneiros- Unican; Sindicato das empresas de transporte de cargas - Setcemg. Associação brasileira de caminhoneiros.
Todos sabem que a associação, mesmo que seja associação profissional, não é sindicato. Este é que representa a categoria para efeitos legais, podendo fazer greves e firmar convenções coletivas que são atividades exclusivas de sindicatos. As associações cuidam também de interesses da categoria, embora não possam entrar na área sindical. Elas se multiplicam porque os interesses das categorias são muitos e múltiplos, sendo impossível aos sindicatos administrá-los sozinho.
Quando a greve explodiu, o caos imperou. Não se sabia quem estava em greve e quem realmente representava os grevistas. Ficou impossível a intervenção da Justiça do Trabalho e, mesmo que fossem dadas liminares e sentenças, o cumprimento seria duvidoso.
A esta situação pretendeu incorporar-se o sindicato dos petroleiros, anunciando greve geral. Já aqui, havendo uma entidade precisa com representação clara, ficou possível a intervenção judicial e a liminar impondo multa pelo TST, o que impediu que a confusão se tornasse ainda mais intensa.
Para confundir mais ainda, houve a participação de entidades de empregadores, parando seus caminhões, porque estavam interessadas no aumento do frete. Todos estes fatos exigiram negociações diretas com as forças atuantes, assumindo o governo posição de um lado, e do outro sindicatos e associações de classe.
Todos estes fatos mostram uma situação nova para a qual o Direito do Trabalho terá que apontar solução, sob pena de correrem livres pressões sociais e desordem coletivas.
Agora o problema toma outra direção, com o governo pretendendo tabelar o frete, o que vem sendo tido como medida inconstitucional. O saudoso prof. Washington Albino, a respeito de tabelamento de preços, escreveu em sua consagrada obra Primeiras Linhas de Direito Econômico, 6ª ed. p. 126 o seguinte: não terá sentido a pretensão de tabelar os preços de certa mercadoria sem atender a seu custo e ao poder aquisitivo do comprador. Predomina a realidade econômica da formação do preço, embora se procure incriminar o produtor ou o vendedor por ter transgredido a tabela ou deixado desaparecer a mercadoria.
O texto não precisa de comentários. Com o tabelamento se estará praticando a cartelização do preço dos combustíveis. O que deveria ser uma livre escolha do comprador, optando pela empresa que melhor o servisse através da livre concorrência, passa a ser agora um preço fixo, que permitirá o acomodamento dos empresários que não precisarão mais de entrar no jogo da saudável concorrência, onde sempre o mais eficiente vence. A cadeia econômica quebrará seu círculo e voltaremos ao velho sonho de querer segurar com normas o que deve ser fixado por livre jogo da concorrência.
Leitor, cuide de seu bolso. Quem vai pagar este imbróglio todo é você com seu trabalho. E a conta será alta.
*Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG