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Segunda-Feira,21 de Outubro

O direito de ter argumentos considerados pelo juiz

06/04/2016 às 21:50.
Atualizado em 16/11/2021 às 02:50

Clóvis de P. P. Nogueira(*)

Novos tempos são esperados com os paradigmas fixados pelo Código de Processo Civil (CPC/2015) que entrou em vigor no último dia 18.

Pautado em um processo constitucional que preza, dentre outras diretrizes, pela autocomposição, ampla defesa e celeridade, o CPC/2015 também voltou mais os olhos para as partes que procuram o Judiciário em busca da solução de um conflito (Jurisdicionado). Essa postura não ocupava lugar de destaque no antigo Código como ocupa no novo CPC.

Apesar do tabuleiro do jogo ser conhecido desde 1988 – ano da Constituição da República – , dentre as novas regras houve substancial modificação na forma de previsão do contraditório, que está sendo denominado pela doutrina como contraditório efetivo ou dinâmico.

Na prática do processo civil anterior, o juiz poderia analisar e considerar apenas um dos argumentos apresentados pelas partes se com esse argumento já estivesse convencido da tese que lhe era apresentada. Assim, as decisões poderiam ser proferidas com base em parte das alegações feitas pelos jurisdicionados.

Essa forma de julgar era ratificada pelo Superior Tribunal de Justiça, o que pode ser constatado de diversos julgados como os seguintes julgados REsp n.º 927.216/RS, Relatora Ministra Eliana Calmon; REsp 1.529.185/RS, Relator Ministro Herman Benjamin e REsp 855.073/SC, Relator Ministro Teori Albino Zavascki.

No novo CPC essa possibilidade foi modificada, constituindo obrigação do julgador dar às partes oportunidade de falarem antes de proferir as decisões (artigo 9º), bem como devendo enfrentar e considerar os argumentos sustentados por elas (artigo 489, parágrafo 1º). E não basta que as partes falem, é preciso que sejam ouvidas. Somente a cumulação dos dois – falar e ouvir – é capaz de definir o contraditório no CPC vigente.

Na conjuntura atual, a sociedade não quer apenas uma sentença impositiva de mérito, mas conduzir o litígio para a conciliação, mediação, autocompo-sição, outras técnicas de negociação, e sobretudo, à participação real das partes, o que só é possível com o direito de manifestação e de ter os argumentos avaliados, de maneira que o resultado seja, de fato, fruto de um processo participativo e cooperativo.

Não é mentira afirmar que o inciso LV, artigo 5º da Constituição de 1.988 dispõe que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Essa diretriz foi também contemplada na literalidade do novo CPC, tendo os artigos 7º e 9º da Lei Federal assegurado às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório.

Em verdade, o direito de manifestar e ser considerado já havia sido expressamente reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, tendo o ministro Gilmar Mendes se posicionado, no ano de 2004, no sentido de que o contraditório é constituído pelo “(I) direito de informação, que obriga o julgador a informar a parte contrária todo o ato praticado no processo, com explicitação dos seus elementos; (II) direito de manifestação, que assegura ao litigante a possibilidade de manifestar-se sobre os elementos fáticos e jurídicos constantes do processo; e (III) direito de ver seus argumentos considerados, o que exigirá do julgador capacidade, apreensão e isenção de ânimo para contemplar as razões apresentadas. Desse modo, incumbe ao julgador não só o dever de informar os atos do processo e garantir a manifestação, mas também o de tomar conhecimento e considerar séria e detidamente as razões apresentadas” (STF – MS n.º 24.268/MG).

O Legislador atual, consciente de que o destinatário do provimento jurisdicional são as partes, e visando a renovação de conceitos, positivou no novo Código de Processo Civil a necessidade de o julgador enfrentar todas as questões trazidas pelas partes, evitando, assim, qualquer discussão ou interpretação diversa a respeito dessa obrigação do Estado (artigo 489, §1º). Entretanto, verifica-se considerável resistência por parte de alguns operadores do direito, em especial da Magistratura, que tem indicado a tendência de que somente precisam ser enfrentados os argumentos relevantes e pertinentes alegados pelas partes. Entendimento marcado por subjetivismo que poderá derruir a intenção do legislador de obrigar o enfrentamento de todos os argumentos.

Conclui-se que o contraditório, idealizado pelo legislador atual no CPC/2015, é embasado em um processo cooperativo, voltado para os destinatários dos provimentos judiciais e onde as partes possam participar do processo, manifestar e ter os argumentos considerados pelo julgador. Contudo, somente o futuro e a hermenêutica pelos tribunais poderão responder se esse ideal será concretizado ou continuará utópico.

(*) Sócio do Escritório Pupo & Castro Advogados Associados

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