Antônio Álvares da Silva*
Entrou em vigência no dia 11 de novembro a chamada “reforma trabalhista”. Infelizmente, perdemos mais esta oportunidade. A reforma não reformou nada de importante e, o que é pior, retalhou a CLT, uma das melhores leis de nossa história republicana, que agora sobreviverá aos pedaços. Vamos demonstrar como ficaram as principais áreas do Direito do Trabalho depois da “reforma”:
No Direito Individual do Trabalho, que regula a relação empregado-empregador, da qual cuida a CLT, nada de qualidade foi alterado. O principal problema, a garantia no emprego, segue em aberto. O art. 7º, I, continua uma velha esperança. Somos um dos poucos países do mundo que não dá nenhuma garantia de permanência no emprego. A dispensa não precisa ser motivada no Brasil. Basta pagar o FGTS. Como falar em combate ao desemprego se há liberdade plena de dispensar?
No Direito Coletivo, que tem por objeto a negociação coletiva entre sindicatos, houve, devemos reconhecer, um passo à frente com a contribuição sindical, que se tornou facultativa. Os sindicatos terão agora que trabalhar para sobreviver. Mas era necessário que se acabasse também com o sindicato único numa mesma localidade, o que impede a concorrência e a livre escolha do trabalhador em relação ao sindicato que entender melhor. É verdade que se trata de matéria constitucional. Mas por que não se votou uma emenda? Não se editam tantas, muitas desnecessárias e até nocivas?
No Direito Público, a fiscalização é precária, e põe em jogo a saúde, segurança e higiene do trabalhador. Temos apenas 2.782 auditores fiscais para atuar no Brasil inteiro e não há de supor que haverá novas nomeações em razão da crise que vivemos. A solução: deixar clara a competência do juiz do trabalho para aplicar as multas administrativas nos processos que julga, pois se trata de matéria derivada da relação de emprego. Por que não aplicar logo a multa, deixando para o auditor a fiscalização e aplicação de sanção nos casos que não estão sub judice? O país poderia contar com 3.687 juízes que aplicariam multas e garantiriam a vigência plena da norma trabalhista. Isto sem custar um centavo aos cofres públicos.
Direito Penal do Trabalho. Basta uma lei determinando a competência penal que na realidade já existe, pois se trata de questão oriunda da relação de trabalho. Em casos graves de violação de normas poderia haver condenação penal do violador. Bastaria uma sentença, como efeito pedagógico e haveria uma diminuição drástica do número de reclamações.
Representante dos trabalhadores: o legislador previu dois representantes nas empresas a partir de 200 empregados, subindo a representação até 7 membros nas empresas com mais de 5000 empregados. Deu-lhes algumas prerrogativas – por exemplo, fiscalizar o cumprimento das leis trabalhistas- mas não lhes outorgou poder de convocar o empregador, para exigir o cumprimento compulsoriamente quando fosse o caso. Ou seja, deu prerrogativa, mas não criou o conselho de empresa ou comissão de fábrica, que arbitraria os conflitos internos, através decisões vinculantes.
No processo do trabalho, persistimos no mesmo erro de sempre: 4 instâncias para julgar a simplicidade do conflito trabalhista. Um conselho ou comissão de fábrica pode resolver 90% destas controvérsias em poucos instantes. Para completar, uma regrinha de ouro: os processos trabalhistas, a partir da decisão de segundo grau (TRTs), transitariam em julgado quanto à matéria de fato. O recurso de revista para o TST só discutiria questões de direito. Os fatos já estão definitivamente julgados. O processo seria remetido à primeira instância para julgamento definitivo. A decisão do TST, que envolve matéria jurídica e não de fato, valeria para o futuro.
Eis aqui a reforma em poucas linhas. Não precisávamos de mais do que uns 10 artigos. Deixamos de lado as grandes questões e cuidamos de miudezas. Quem vai pagar por isto é o trabalhador e o empregador, que sofrerão as consequências de uma reforma que nada reformou.
*Professor titular de Direito do Trabalho da UFMG