A maior abertura para a China, agora considerada economia de mercado, assusta fabricantes de calçados brasileiros. Isso porque a taxação aos produtos, imposta pelo governo brasileiro, pode cair. Para os calçadistas, será uma pedra no sapato, com o perdão do trocadilho.
A principal dúvida é qual será o comportamento do governo brasileiro frente à medida antidumping contra os sapatos chineses, que são taxados em US$ 10,21 a cada par vendido ao Brasil. A possível revisão dessa barreira poderia afetar produção e postos de trabalho no setor, como mostra esta terceira reportagem que o Hoje em Dia publica da série sobre os efeitos da concorrência com a China.
“Assim como não estava claro se os países tinham que reconhecer automaticamente a China como economia de mercado, também não está se as medidas em curso contra os calçados vindos do país podem cair”, afirma o presidente-executivo da Associação Brasileira de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein.
No último domingo, venceu o prazo de 15 anos dado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) para o reconhecimento da China como economia de mercado, o que dificulta a implantação de barreiras comerciais contra os produtos asiáticos. Como o Brasil optou pelo reconhecimento, segundo o Itamaraty, existe uma revisão dos processos antidumping em curso. Mas o governo não explicita ainda quais produtos serão alvos da mudança. A barreira contra os calçados chineses foi colocada em prática em 2010 e terminaria em 2021.
Segundo Klein, desde que foram iniciadas as taxações impostas pela medida antidumping, a indústria calçadista já recuperou 40 mil postos de trabalho que tinham sido perdidos por causa da concorrência com os chineses. Outro dado que mostra o quão devastadora pode ser a influência asiática para o setor no Brasil é o de importação. Em 2009, a compra de calçados chineses pelos brasileiros foi de US$ 183,6 milhões – equivalente a 70% do total importado pelo país naquele ano. Após a aplicação de uma taxa, em 2010, passou para US$ 54,9 milhões, ou 18% do total. Em 2015, foi de US$ 45,9 milhões – número quatro vezes menor do que o de 2009.
E, levando em conta que a China produz 58% do total de sapatos feitos no mundo e consome apenas 17%, há muito espaço para expandir essa influência mundial. A possibilidade de “invasão” do calçado chinês seria perversa também para Minas Gerais, onde existem 1.225 fábricas, segundo a Abicalçados. Elas geram 28,7 mil empregos no Estado.
No principal polo calçadista mineiro, Nova Serrana, os chineses praticamente já eliminaram as chances de competição no mercado externo. “Das 800 indústrias que temos no polo, pouquíssimas exportam e a China é uma das principais responsáveis. Porque é praticamente impossível concorrer com os preços chineses”, afirma o dono de uma das fábricas, que já foi presidente do Sindicato da Indústria de Calçados de Nova Serrana (Sindinova), Júnior César Silva.