Qual o maior problema brasileiro? Muitos dirão que é a corrupção. Será? Olhemos a posição do Brasil nos índices internacionais. O índice mais citado é o de Percepção da Corrupção, desenvolvido pela Transparência Internacional. O escore do Brasil jamais superou 40 pontos, numa escala de zero a 100 pontos. Quase uma centena de países do mundo está em uma posição pior do que a brasileira neste índice.
Em contraste, peguemos o caso da desigualdade. O índice mais utilizado para medir a desigualdade (calculado por vários organismos internacionais, institutos de pesquisa, universidades e pesquisadores individuais), o Coeficiente de Gini, também fornece uma escala que varia entre zero e 100 pontos (alguns preferem utilizá-lo em uma escala de 0 a 1, fazendo uso de duas ou três casas decimais).
Nas décadas de 1970 e 1980, o Coeficiente de Gini brasileiro (calculado pelo Banco Mundial) gravitou sempre em torno de 60 pontos. Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, ele começou a cair de forma razoavelmente continuada, declínio que se acelerou na década passada, chegando ao ponto no qual se encontra hoje, próximo de 50 pontos.
No auge da desigualdade no Brasil, ficamos sempre entre os cinco países com escores mais elevados no Coeficiente de Gini e, mesmo após a significativa queda ocorrida na década passada, nunca deixamos de estar entre os 20 países mais desiguais do planeta. Enquanto cerca de uma centena de países do mundo têm escores no Índice de Percepção da Corrupção piores do que o brasileiro, no caso da desigualdade esse número jamais superou duas dezenas.
Fica claro, assim, que a desigualdade é, tanto em termos absolutos quanto relativos, um mal maior do Brasil do que a corrupção! Infelizmente, o tema da corrupção tem sido, na história republicana brasileira, utilizado politicamente para destruir justamente aqueles que tentaram fazer algo mais significativo contra o mal maior do país, a desigualdade.
Com frequência, quando forças progressistas que lutam para reduzir a desigualdade conquistam a hegemonia política, surge uma aliança entre a mídia conservadora, estratos sociais que se sentem prejudicados e forças políticas reacionárias que levantam a bandeira do combate à corrupção. Foi assim em 1954, foi assim em 1964 e foi assim em 2016!
O problema da corrupção no Brasil é muito sério. Todavia, o combate à corrupção na nossa história tem sido, fundamentalmente, uma cortina de fumaça para esconder um objetivo muito menos nobre: a manutenção de nossa escandalosa desigualdade socioeconômica!