(Flávio Tavares)
Cascas de limão e jabuticaba viram doce e compota. Sementes de melancia são transformadas em petisco salgadinho, leve e saboroso. Arroz “dormido” volta à mesa como bolinho frito ou assado. Aproveitar os alimentos por completo ou reutilizá-los deixou de ser exclusividade de quem quer economizar. Chefs de cozinha provam que luxo mesmo é ser sustentável.
Proprietário do buffet Club do Chef e da Osteria Casa Mattiazzi, ambos em Belo Horizonte, o chef italiano Massimo Battaglini diz que tudo começa no campo. “É uma filosofia que vem da terra. Começa com os ciclos dos plantios, com a conservação de cada produto. Quando chega à cozinha, basicamente o que fazemos é seguir a lógica no cardápio, na ficha técnica dos pratos”, explica.
Fã de abóbora, um clássico quando se fala em utilização integral dos insumos culinários, o italiano reforça que não basta “ir da casca ao caroço”. Ser sustentável, para ele, também é sinônimo de organização em cada etapa. “Quase todas as partes que sobram entram em infusões, caldos e molhos. É básico. Mas se não der para aproveitar a matéria-prima, reutilizo o que está pronto em outro prato”, acrescenta.
No restaurante novo, Eva, que deve ser inaugurado entre abril e maio, no Belvedere (Zona Sul), a burrata, por exemplo, queijo de massa fresca, firme por fora e cremoso por dentro, deve ser reutilizada dentro dos tortelones (tipo de massa). “É um produto fresco, de validade curta. Como recheio, consigo usar por dois, três dias”, diz.
Sustentável em tudo
Chef mineiríssimo, proprietário do Xapuri, na Pampulha, também em BH, e do BR3, no Mercado da Boca, em Nova Lima, Flávio Trombino também exercita a criatividade em prol da sustentabilidade não só ambiental, mas dos negócios. No estabelecimento da capital mineira, serve doce de casca de limão recheado com doce de leite – prova de que tudo, ou quase tudo, pode ser usado do início ao fim.
Para chegar à mesa, a matéria prima, geralmente descartada, passa por nada menos que oito dias de preparo. “Talvez seja a receita mais trabalhosa, pois é preciso tirar todo o amargor da fruta. Mas o resultado é fantástico: um doce delicado, de sabor suave, mas que preserva a característica cítrica do limão”.
Saudades do Cerrado, como foi batizado o prato, também usa batata doce e moranga por completo. Cozidas no vapor e finalizadas no forno chegam à mesa com casca e tudo. “A ideia é que as pessoas comam tudo, mas ainda há quem descarte. É cultural”, comenta.
Inspirado por dona Amélia, dona de um sacolão no bairro Santa Lúcia, na Zona Zul da cidade, Trombino também faz farinha de quiabo com o legume assado a baixa temperatura. “Dá para usar a ideia com cenoura e beterraba, que viram elemento decorativo”, acrescenta.
Berinjela
Proprietário do restaurante Barolio, no Vila da Serra, em Nova Lima, na Grande BH, Carlo Caredda também levanta a bandeira da sustentabilidade na cozinha do estabelecimento especializado em culinária napolitana. “Tento não jogar nada fora, aproveitando desde os ossos à casca dos legumes para fazer um caldo, por exemplo”, conta.
Para incrementar o visual de alguns pratos, o chef de cozinha faz farinha de casca de berinjela, assada no forno. “Fica escura, bonita, e tem milhares de utilizações”.Lucas Prates
DO LIMÃO: TUDO - Proprietário do mineiríssimo Xapuri, na Pampulha, e do BR3, no Mercado da Boca, Flávio Trombino usa casca de limão para fazer um doce recheado com doce de leite; receita leva oito dicas para ficar pronta: “é preciso eliminar todo o amargor”
Ponto a ponto:
Professora de culinária, sócia na Experimente Cozinha – Food Lab, no bairro Santa Lúcia, Zona Sul de BH, Sabrina Gomide dá dicas para evitar o desperdício e fazer uma gastronomia inteligente, aproveitando os alimentos do início ao fim. Inspire-se:
Lucas Prates
CASCA TAMBÉM É COMIDA - Compota de casca de jabuticaba com queijo canastra é uma das entradas servidas no Barolio Cucina Napolitana, restaurante do italiano Carlo Caredda, no Vila da Serra, em Nova Lima: “um cozinheiro é mais reconhecido quanto melhor é a forma que tem de utilizar os alimentos”
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