Dever faz mal à saúde: endividamento afeta sono e produtividade de mais de 53 mi de brasileiros

Janaína Oliveira
19/07/2019 às 21:11.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:37
 (Editoria de Arte)

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Lucas Prates “Vou para a cama pensando em como resolver os problemas financeiros, mas acordo sem solução”, diz 

O policial civil mineiro Tiago Oliveira há tempos não tem uma noite bem dormida. Com o salário parcelado desde 2016 e o aumento das despesas desde que se casou e deixou a casa dos pais, as contas acumularam e ele se viu enrolado em meio a tantas dívidas. “Passei a dormir no máximo quatro horas. Vou para a cama pensando em como resolver os problemas financeiros, mas acordo sem solução. E pior, mais estressado e cansado”, diz.

Oliveira é um dos 54,8 milhões de brasileiros que têm o sono prejudicado por causa do endividamento, conforme aponta pesquisa do Instituto Locomotiva, em parceria com a Negocia Fácil, serviço de cobrança digital. Segundo o estudo feito em todas as regiões do país, inclusive Minas Gerais, 54,1 milhões dos inadimplentes estão com a autoestima prejudicada, 53,5 milhões têm o rendimento profissional afetado e 45,3 milhões sofrem com alterações no apetite.

Além desses efeitos colaterais, 45,9 milhões não atendem ligações de cobradores e 44,7 milhões sentem vergonha e medo de que alguém descubra que estão devendo na praça ou até com o nome sujo. 

 Ainda de acordo com a pesquisa, 57,9 milhões de brasileiros estão atormentados com as contas atrasadas. As preocupações assombram nove em cada dez devedores e quanto menor a renda, maior é a agonia – 84% das pessoas de classe AB se preocupam muito com as dívidas, enquanto 94% das pessoas da classe C e 98% das classes DE têm a mesma aflição.

“O levantamento derruba de uma vez por todas o mito de que o consumidor está inadimplente porque quer. De forma geral, as pessoas se preocupam muito e têm a vida pessoal e a saúde afetadas”, afirma o diretor de Pesquisa do Instituto Locomotiva, João Paulo Cunha. 

Cotidiano
Para ele, a inadimplência está longe de ser um fenômeno puramente financeiro. Ela não só tem um alto impacto no cotidiano, como na economia geral. 
“Uma parcela imensa da população endividada declara que o estado emocional, a concentração, o apetite, as relações familiares e até a vida amorosa são prejudicados. Já quem honra com os compromissos financeiros é mais feliz, saudável e produtivo no trabalho”, completa o diretor de Negócios Digitais do Negocia Fácil, José Moniz. 

Com o nível de estresse elevado e as contas batendo à porta, o policial Tiago Oliveira chegou a pensar em pedir afastamento do serviço. As dificuldades incluem as mensalidades do curso de Direito sempre pagas com atraso e juros embutidos, o IPVA ainda não quitado e a revisão do carro concluída apenas após um empréstimo. 

“Com tantos problemas é difícil trabalhar 100% focado. Mas a terapia tem me ajudado”, afirma ele, que também aposta na proximidade da formatura para finalmente ter alívio no bolso. 

Já a relações públicas Luciana Alves quase viu o casamento ruir após o marido perder o emprego, a autoestima e a capacidade de honrar o aluguel e outras despesas. “Com o que ganho não consigo bancar tudo sozinha. Passo noites em claro, parei de comer e estou até tomando remédio para diminuir a ansiedade. Mas o mercado de trabalho está fechado. O jeito é ter paciência e acreditar que juntos vamos superar essa crise”, diz. 

 Ostentação e falta de planejamento atrapalham as finanças

Segundo dados da Serasa Experian, em maio de 2019, o Brasil registrou um total de 62,8 milhões de consumidores com nome sujo ou com contas em atraso, o que representa 40% da população adulta do país. Mas não são só a crise, o desemprego e a corrosão da renda que afundam o brasileiro no endividamento. Para a professora de Economia das Faculdades Promove Mafalda Ruivo, a falta de planejamento e de educação financeira acaba deixando as pessoas com a corda no pescoço. 

“O ideal é fugir de prestações. Se quiser adquirir um bem, tente juntar o máximo de dinheiro possível para pagar à vista e com desconto. E analise se aquele produto é realmente necessário e cabe no orçamento. É melhor ficar sem do que perder o sono lá na frente”, recomenda. 

Em caso de demissão do emprego, a recomendação é cortar ao máximo as despesas e reestruturar os débitos. “Procure o banco ou o credor para negociar antes que a dívida vire uma bola de neve”, indica a professora, que alerta ainda para os juros exorbitantes do cheque especial e do cartão. 

As compras por impulso são outro fator que joga o consumidor no mar de dívidas. “O que ocorre é um mecanismo de compensação onde se tenta preencher um vazio existencial com bolsas, sapatos e outros objetos”, explica o psiquiatra e homeopata Aloísio Andrade. 

Redes sociais
Segundo ele, a ostentação também é perceptível nas redes sociais, com fotos de viagens e restaurantes chiques que muitas vezes exigem gastos além do orçamento. “Essas postagens são uma forma de autoafir-mação e busca de status. Mas custam caro para o bolso e trazem desequilíbrio financeiro e consequências para a saúde”, adverte. 

Entre os malefícios do endividamento para o organismo, o psiquiatra cita alterações no humor e no ritmo cardíaco e até perda da libido. “O dinheiro não garante a felicidade, mas a falta dele garante a infelicidade. Apesar de não resolver todos os problemas, o dinheiro é fundamental para manter o equilíbrio básico”, afirma. 

  

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