(Canal Brasil/Divulgação)
Pedro Bial confessa que a tentação foi grande em fazer um filme de "sexo, drogas e rock’n’roll" sobre o cantor e compositor Jorge Mautner. Tamanho é o número de histórias que envolvem esse ícone da contracultura.
Algumas delas foram absorvidas no documentário "Jorge Mautner – O Filho do Holocausto", que o jornalista fez ao lado de Helio D’Alincourt, e que é um dos destaques da programação do 40º Festival de Cinema de Gramado, que se inicia na próxima sexta-feira (10).
"Mas o que nos interessava era o lado humano e muito peculiar da personalidade do Jorge e, por isso, não repetimos o que já fizeram no registro de outras trajetórias", salienta. Esse novo olhar se reflete principalmente na tentativa de reparar um grave erro: "A obra do Jorge nunca foi tratada com carinho, as músicas dele sempre foram mal produzidas, mal lançadas", pondera D’Alincourt.
O filme adota o formato de entrevistas aliadas a apresentações musicais, com a releitura de 26 de suas composições mais conhecidas, como "Maracatu Atômico", "Lágrimas Negras" e "Cinco Bombas Atômicas".
O livro autobiográfico de Mautner, que dá título ao filme, também serviu como fonte de inspiração, especialmente na primeira parte, quando o cantor lê trechos da publicação, estampados por imagens de arquivo.
Filho de judeus que fugiram da Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial, ele refaz o caminho de seus pais diante dos horrores do Holocausto. "Sou daqueles que acham que nunca é demais reproduzir as imagens do nazismo. É insuportável lembrar, mas também não podemos esquecer", pondera Bial.
Um dos motivos para o diretor usar muitas imagens da época é que o fascismo não acabou. "Quando cobri os Jogos Olímpicos de 2008, em Pequim, vi na abertura uma cerimônia fascista, primeira vez que o hino do anfitrião foi executado por militares fardados".
Bate-papo com a filha é destaque
Pedro Bial é o primeiro a concordar que um dos pontos altos do documentário é o bate-papo de Jorge Mautner com a sua filha Amora, no qual são lembrados casos pitorescos da infância dela, como a falta de dinheiro em casa, devido à assumida "incompetência" do pai em relação ao controle financeiro. Fora os dias em que Mautner ia buscá-la na porta da escola de sunga de praia.
"Amora foi uma fonte riquíssima para o filme, e sabíamos que era uma questão de colocar um diante do outro para render uma coisa muito legal. Mas, como todas as relações entre pais e filhos, há um jogo de espelhos e ampliação de sentidos. E, no caso de Jorge e Amora, acaba se tornando um acerto de contas", afirma. Ele lamenta não poder usar a entrevista na íntegra, ficando apenas com os momentos principais. "No final das contas, se tornou uma lavação de roupa suja, que continuou mesmo com a câmera desligada. Aliás, a câmera do making of continuou registrando tudo, com os dois quase se esbofeteando. Claro, é um modo de dizer", corrige.
O filme apresenta, ainda, imagens raras de "O Demiurgo", longa-metragem de 1972 feito por Mautner, e de "Carnaval na Lama" (1975), de Rogério Sganzerla, antes considerado perdido.