(Lucas Prates)
Quer manter o coração saudável e a diabetes controlada? Não descuide dos dentes. A boa saúde bucal é aposta para reduzir as chances de um infarto e a glicemia nas alturas. Por outro lado, quem foge da cadeira do dentista e não faz a limpeza adequadamente pode desenvolver infecções na boca e aumentar em quase três vezes as chances de uma enfermidade cardíaca e até morrer.
O alerta foi feito por meio de uma pesquisa publicada no Journal of Dental Research, destinada a artigos científicos. O levantamento examinou pacientes na Finlândia que precisavam ser submetidos ao tratamento de canal ou da gengiva, mas não tinham passado por nenhum deles.
Situação preocupante é também para os diabéticos. Sem tratamento, a glicose descontrolada interfere numa periodontite (inflamação gengival mais séria) e agiliza a perda dos dentes. Por outro lado, o problema bucal tende a elevar os níveis de açúcar no sangue.
Mais que estética
“A questão vai além da estética. Uma boa escovação, visitas a cada seis meses ao dentista e acompanhamento profissional multidisciplinar ajudam a evitar doenças mais graves que acometem outros órgãos”, alerta Alessandra Figueiredo, presidente da Comissão de Odontologia Hospitalar do Conselho Regional de Odontologia (CRO-MG).
Toda dor na região bucal, até mesmo em menor intensidade, merece atenção. De acordo com a especialista, um pequeno incômodo tratado com medicamentos paliativos tem chance de se transformar em um problema bem maior.
Uma vez instalada, uma doença periodontal ou abscesso periapical (acúmulo de pus na raiz do dente) desencadeiam um processo inflamatório crônico, alterando as citocinas (elementos do sangue).
“Dessa forma, elas afetam qualquer outra parte do corpo. Na parede coronária, por exemplo, há depósito de gorduras, fibrose (formação de tecido de cicatriz) e obstrução, causando infarto e AVC (acidente vascular cerebral)”, explica o cardiologista José Pedro Jorge Filho, da Unimed-BH.
Também há bactérias da boca que podem chegar na corrente sanguínea e se alojar na parede do coração, complementa o médico. Nesse caso, há possibilidade do desenvolvimento de uma endocardite, que é uma infecção do revestimento interno do órgão muscular.
Descoberta
Ao mesmo tempo que as infecções bucais são capazes de piorar o quadro da diabetes, a cavidade também é aliada na descoberta da doença, causada pela má absorção ou falta de insulina no organismo.
É o que afirma a endocrinologista Janice Sepúlveda Reis, da Santa Casa de Belo Horizonte. Segundo ela, o hálito cetônico (cheiro de maçã podre) e boca seca, que pode ser causada por uma descompensação da glicemia dão indícios da enfermidade.
“Havendo desidratação, ainda percebe-se o aumento das cáries, fissuras na região bucal, diminuição da salivação e até candidíase oral. Esse quadro indica que a pessoa tem açúcar no sangue e pode não saber. Além disso, a doença pode estar descontrolada”, comenta a médica, que é vice-presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD).
Dificuldade
A especialista reforça a importância de tratamentos para acabar com infecções bucais. Uma inflamação, seja ela em qualquer parte do organismo, demanda mais insulina no organismo. Dessa forma, o diabético vai precisar de uma quantidade maior do hormônio.
“Quando se tem um problema sério na boca, a recomendação é ajustar a dose do medicamento, pois o que está sendo administrado pode não ser suficiente para o controle da enfermidade”, orienta Janice Sepúlveda. (Colaborou Simon Nascimento)
Diferenciado e multidisciplinar
Assim como a prevenção é importante, o tratamento odontológico de cardíacos e diabéticos merece atenção. Pacientes nessas condições devem informar sobre as patologias no consultório do dentista, mesmo que não sejam questionados. É fundamental que as visitas ao profissional sejam a cada seis meses.
O ideal é que as pessoas que precisam tomar insulina para controlar a glicemia sejam atendidas pela manhã, ainda em jejum. “A glicose estará controlada pois não haverá ingestão de alimentos”, explica o professor Paulo Cézar de Oliveira, coordenador da pós-graduação de Odontologia das Faculdades Funorte.
Já os que têm alguma disfunção no coração devem ser rigorosamente acompanhados ao serem submetidos a procedimentos invasivos, como extração de dente e canal. Antes da cirurgia, o cardiopata deve tomar antibióticos, conforme a orientação médica.
Segundo Paulo Cézar, o medicamento impede que as bactérias da boca cheguem na corrente sanguínea. “Provocando um infarto ou algum outro desequilíbrio cardíaco, como arritmias”, complementa.
Os diabéticos, por sua vez, precisam estar com a doença controlada. Presidente da Comissão de Odontologia Hospitalar do CRO-MG, Alessandra Figueiredo o descontrole pode levar a uma maior dificuldade na cicatrização no local tratado.
Assistência completa
A especialista defende, ainda, assistência multidisciplinar aos pacientes cardiopatas e com a glicose desregulada. Para ela, é preciso que todos os médicos envolvidos conheçam o histórico do paciente e mantenham contato.
“Essa conduta vai permitir um melhor tratamento. De acordo com a alteração apresentada, como endocardite ou anemia, por exemplo, haverá um manejo diferente’, frisa a presidente da Comissão.
O coordenador de Odontologia das Faculdades Funorte, Paulo Cézar de Oliveira, ressalta, no entanto, que os cuidados dos profissionais com essas pessoas só terão eficácia se a saúde bucal, em casa, não for deixada de lado.
Ele recomenda fazer a escovação adequada, sempre após as refeições, além de usar fio dental e enxaguante bucal.
Outras enfermidades
De acordo com a presidente da Comissão de Odontologia Hospitalar do CRO-MG, Alessandra Figueiredo, a aspiração leva bactérias, fungos e protozoários localizados na boca para o pulmão, causando um quadro de pneumonia. “A situação fica ainda mais séria se o paciente estiver no ambiente hospitalar, na UTI e com ventilação mecânica”, diz.
O rim também pode ser comprometido pelas bactérias, que causam a inflamação do órgão levando a uma nefrite.Editoria de Arte