A oferta de usinas eólicas deverá ser significativamente menor nos leilões de energia em 2013. O motivo é a decisão do governo federal de não permitir a participação dos projetos que dependem da construção de sistemas de transmissão para escoar a energia. "No ano passado, tínhamos uma oferta de 14 mil MW em novos projetos. Com essa restrição, esse volume pode cair para algo em torno de 2 mil MW", disse a presidente executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Elbia Melo, durante o lançamento do Boletim Anual de Geração Eólica - 2012, nesta segunda-feira, 15.
Segundo a executiva, existe a sinalização do governo de que essa regra pode ser flexibilizada, desde que o próprio gerador se comprometa a realizar o investimento para a conexão da usina à rede elétrica. Há a possibilidade, inclusive, de que os geradores formem um "pool" para realizar esses investimentos, o que reduziria os custos de conexão. "Nessa configuração, não sabemos qual seria a oferta dos leilões", disse a executiva. Hoje, o gerador já realiza o investimento de conexão com da usina eólica com a rede elétrica. Porém, o tamanho da linha de transmissão que será construída para a conexão com a subestação mais próxima será muito maior do que no passado.
"O empreendedor pode ter de construir uma linha de transmissão de 100, 200 ou 300 quilômetros", disse o presidente do conselho de administração da Abeeólica, Otávio Silveira. Recentemente, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Maurício Tolmasquim, reconheceu à Agência Estado que não haveria tempo para realizar um leilão de transmissão visando construir a infraestrutura para escoar a oferta dos projetos eólicos que eventualmente disputem o leilão de energia nova A-3 deste ano, que contratará a demanda do mercado cativo em 2016. Por essa razão que a quantidade de empreendimentos da fonte eólica deverá ser significativamente menor nos leilões deste ano.
Segundo Elbia, a questão da conexão afetará os leilões A-3 e de energia de reserva. Para o leilão A-5, que irá contratar a demanda do mercado cativo em 2018, a sinalização é de que a transmissão não afetará a habilitação dos projetos da fonte eólica. "A sinalização da EPE é de que este problema está resolvido para o médio e longo prazo. A questão está no curto prazo", afirmou. O Programa de Expansão da Transmissão 2013 - 2017, divulgado recentemente pela EPE e que prevê aportes totais de R$ 14,6 bilhões, considera a construção de subestações e linhas de transmissão para escoar a produção de energia dos novos projetos eólicos.
Perda de competitividade
Na prática, a restrição para os projetos eólicos sem conexão com o sistema elétrico faz parte de um conjunto de fatos que mostra que 2013 será desafiador para a fonte. A provável decisão da EPE de adotar o critério P90 para o cálculo da energia assegurada dos projetos irá aumentar em 15% os custos de geração da energia eólica, segundo Elbia. A executiva afirmou que essa informação foi repassada pelo próprio Tolmasquim nas conversas da EPE com a entidade sobre o tema. "Esse é um aumento de custo desnecessário para o setor", disse a executiva.
Até o ano passado, a EPE usava a metodologia P50 para calcular a garantia física dos projetos. Ou seja, para ter declarado um volume "X" de garantia física, a usina eólica teria de gerar esse volume por mais de 50% das vezes. Com a metodologia P90, o porcentual sobe para 90% das vezes. Na entrevista concedida à Agência Estado em março, Tolmasquim explicou que essa mudança irá reduzir a garantia física dos empreendimentos, ou seja, aquilo que pode ser comercializado para o mercado, elevando os custos de geração das usinas.
Nas discussões com a EPE sobre o tema, Silveira argumentou que a Abeeólica propôs à EPE que o critério a ser adotado fosse o do P75, parâmetro utilizado mundialmente pelo mercado de energia eólica. O executivo afirmou que isso elevaria a confiabilidade dos projetos no que diz respeito à geração de energia e, ao mesmo tempo, não oneraria demasiadamente os investidores. "O P90 só é usado pelas instituições financeiras para financiar as usinas eólicas, o que é bastante razoável do ponto de vista financeiro", acrescentou o executivo.
Segundo Elbia, as mudanças profundas no setor não sinalizam que o governo esteja querendo frear a expansão da energia eólica no Brasil, mas sim que está sendo mais conservador na gestão dos riscos do sistema. "O governo federal está com aversão ao risco de problemas no sistema", disse a executiva, lembrando que o Brasil correu o risco de passar por um novo racionamento de energia em função do baixo nível dos reservatórios no começo de 2013. Vale lembrar que o sistema hoje conta com 622 MW de projetos eólicos já concluídos sem operar por falta de conexão com a rede. "Vemos que o governo federal não quer repetir os erros do sistema", acrescentou.
Todos esses problemas ocorrem em um momento crucial para os fabricantes de equipamentos eólicos no Brasil. Para fazer frente às novas exigências do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para o financiamento aos projetos eólicos, os fornecedores terão de realizar grandes investimentos para nacionalizar uma série de itens. Só que para instalar uma indústria nacional de equipamentos eólicos, os fabricantes exigem uma sinalização sobre a demanda da fonte eólica. "A sinalização vai depender do leilão. Se a demanda for igual a 2012, as indústrias não vão ficar no Brasil", afirmou Elbia. No ano passado, o governo só contratou 281,9 MW de projetos eólicos no leilão A-5.
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