(Marcelo Prates)
Com o avanço do dragão sobre o bolso da população e a escalada do desemprego, os brasileiros estão se transformando em “caçadores” de promoção. Eles também estão cada vez mais adeptos ao ato de pechinchar e pedir desconto.
Pesquisa do Instituto Data Popular feita recentemente em 152 municípios do país, incluindo em Belo Horizonte, aponta que 64% dos consumidores já compram habitualmente produtos em oferta. No estudo realizado há cinco anos, esse percentual não chegava a 40%.
Os dados mostram ainda que, atualmente, 87% dos brasileiros pesquisam antes de passar o cartão de crédito e levar a compra pra casa. Em 2010, só 52% faziam levantamento de preço.
“O Brasil é hoje o campeão da pechincha. Pelo menos um em cada cinco habitantes pedem um desconto na hora de comprar, um sinal que o consumidor está alerta para os gastos. Além das pesquisas feitas online, o brasileiro também está ‘chorando’ maiores descontos para economizar”, diz Leonídio de Oliveira Filho, empresário e criador do Dica de Preço, ferramenta da web para comparação de preços.
A mudança de comportamento do consumidor foi percebida pelo varejo, que reforçou estratégias para atrair o público e passou a apostar em sorteios e promoções mais agressivas. No Decisão Atacarejo, o departamento de Marketing ganhou força desde que a crise se instalou.
“A área comercial ficou mais dependente das nossas ações. Analisamos o mercado, pesquisamos o público-alvo e definimos as iniciativas”, diz o analista da área, Jefferson Anjos.
Assim, o calendário de ofertas do grupo ganhou o reforço da Sexta do Churrasco, com descontos em cervejas, destilados, carne, carvão, espetos e até na churrasqueira. A data faz companhia à Segunda Básica (itens do dia a dia da mesa do brasileiro) e à Quarta do Hortifruti. “O fluxo de clientes chega a crescer 18% em relação a um dia normal”, comemora ele.
Atentas
As gêmeas Marli e Marlene Martins não compram nada antes de pesquisar e pechinchar. “Somos as legítimas caçadoras de promoção”, brincam as irmãs, sócias em um bufê na capital. Como o negócio não permite abrir mão da qualidade, o jeito é andar, pesquisar e anotar tudo. Só depois a dupla paga e leva.
“Os olhos e os ouvidos têm de estar 100% atentos”, diz Marli. Desde que a crise estremeceu o país, o carrinho de compras da semana subiu de R$ 200 para quase R$ 400. “Leite, queijo, damasco, camarão. Tudo dobrou de preço. Se não pesquisar, o dinheiro não dá”, afirma Marlene.
Percebendo uma dose extra de cautela na clientela, o Super Nosso também promoveu adequações na agenda de Marketing.
“A partir deste ano, houve uma retração no comércio em geral, em decorrência do cenário econômico desfavorável. Foi então que passamos a trabalhar com mais de um folheto promocional por mês e acrescentamos mais produtos. Também resolvemos apostar em mais ofertas em períodos mais curtos”, revela o gerente de Negócios da rede de supermercados, Hamilton Almeida.
Além da tentativa de fisgar o consumidor pelo preço, o plano de ação para enfrentar a crise exigiu a intensificação de pesquisas nos concorrentes e das negociações com fornecedores. “O planejamento ajudou a melhorar o fluxo de clientes”, diz o gerente.
Grandes redes tentam afastar o ‘baixo astral’ da economia
Não está fácil para ninguém. As vendas do varejo brasileiro recuaram pelo oitavo mês seguido, em setembro, segundo o IBGE, com queda em praticamente todos os setores. Mesmo grandes redes que atuam em todo território nacional sentiram o baque da economia e resolveram inovaram para espantar o baixo astral e fazer o cliente voltar a consumir.
Neste mês, o Grupo Pão de Açúcar lançou o movimento #vamojunto, para pedir “união de forças” diante da crise. É a primeira vez que o GPA promove uma campanha envolvendo todas as empresas da marca, entre elas Casas Bahia, Pontofrio e Extra Supermercados. A ação vale para lojas físicas e para o e-commerce.
“Você que está aí se virando para manter tudo que conquistou e para continuar dando o melhor para a sua família”, diz o ator Lázaro Ramos, na abertura do vídeo. Já no final, a atriz Taís Araújo faz o gesto de “V da Vitória” e declara: “Vamos juntos virar esse jogo”.
Segundo o presidente do GPA, Ronaldo Iabrudi, a campanha, que inclui promoções e preços “melhores” para produtos e serviços, nasceu da necessidade do grupo de se posicionar como aliado do brasileiro diante dos indicadores que apontam queda da confiança.
“Há um grande esforço do consumidor em manter o padrão e a qualidade de vida alcançados nos tempos mais recentes. Com esse movimento, estamos colocando a força e protagonismo do GPA para apoiar nossos clientes nessa tarefa”, afirmou.
Raspadinha
A C&A, uma das maiores rede do varejo de moda do país, também inovou neste ano e lançou as “raspadinhas”. Até 24 de dezembro, a cada R$ 120 em compras nas lojas físicas (exceto celulares, eletrônicos, relógios, óculos e cosméticos), o consumidor concorre a 300 mil prêmios instantâneos de até R$ 300 para gastar nas lojas da rede.
Para o consultor financeiro, Ewerson Moraes, as promoções podem ser tentadoras. Mas é preciso parar e pensar se aquele produto é mesmo essencial para o guarda-roupa ou para a geladeira. “Mais do que nunca, na crise é preciso colocar a cabeça no lugar e controlar gastos”, adverte.
Segundo ele, o principal ensinamento que a recessão pode deixar é o hábito de pesquisar e dar mais valor ao dinheiro.