A decisão da presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, de pedir ao vice, Amado Boudou, que a substitua nos atos de comemoração do Dia da Independência, nesta quarta-feira (9), foi duramente criticada pela oposição. Os partidos contrários ao governo já haviam pedido o afastamento de Boudou do cargo, até que ele prove inocência num escândalo de corrupção, mas a maioria governista impediu a abertura de um processo político. O vice-presidente está sendo processado pela Justiça, acusado de ter usado o cargo público para beneficiar a Gráfica Ciccone, que imprimia as cédulas do peso argentino (moeda oficial do país).
O escândalo data da época em que Boudou foi ministro da Economia, no primeiro mandato de Cristina Kirchner. Ele ocupou o cargo até ser candidato a vice, na reeleição da presidenta em 2011. Naquela época, ele teria salvado a Gráfica Ciccone da falência e ajudado os novos donos (supostos sócios e amigos dele) a fechar contrato com o governo para imprimir o dinheiro dos argentinos.
Cristina Kirchner está de repouso por ordem médica e não vai poder viajar à província de Tucumán, no Norte do país, para as comemorações da festa nacional. O ato passaria até despercebido, porque a seleção argentina joga nesta quarta-feira a semifinal da Copa do Mundo contra a Holanda. Mas a confirmação, de última hora, de que Boudou substituirá a presidenta na cerimônia oficial, foi considerada um “agravo” pela oposição.
“[Boudou] não pode representar o país em nenhuma festa da pátria, em nenhum lugar do mundo e tampouco pode presidir nenhuma sessão do Senado”, disse o senador Ernesto Sanz, da União Cívica Radical (UCR). Na Argentina, o vice-presidente é também presidente do Senado. “É uma ofensa para a Argentina que uma das mais importantes datas para a pátria seja encabeçada por alguém tão severamente questionado e suspeito de estar envolvido em corrupção”, disse o deputado Pablo Tonelli, da Proposta Republicana (PRO).
Parlamentares governistas e ministros defenderam Boudou, que é o primeiro vice-presidente na história argentina a ser processado por corrupção. O secretário de Segurança, Sergio Berni, disse estar “convencido da inocência” de Boudou. O deputado Carlos Kunkel, da Frente pela Vitória (FPV), destacou que o vice é vítima da perseguição política “de interesses externos, vinculados aos fundos abutres”.
Os chamados fundos abutres são aqueles que compraram títulos “podres” da dívida argentina, depois do calote de 2001, e não quiseram participar dos dois planos de reestruturação. Em vez de aceitar receber o devido com um desconto de ate 60% (como 93% dos credores), recorreram à Justiça para receber a totalidade. Um pequeno grupo acaba de ganhar a causa num tribunal de Nova York.
Se a Argentina não desembolsar US$ 1,3 bilhão até o final deste mês, corre o risco de ter que decretar a segunda moratória em 13 anos. Na próxima sexta-feira (11), o ministro da Economia da Argentina, Axel Kicillof, terá uma segunda reunião com um mediador, nomeado pela Justiça norte-americana, para tentar chegar a um acordo com os fundos abutres.