(Fernando Michel)
A disparada do preço do café tem assustado os brasileiros. Com base no IPC-10, calculado pelo FGV-Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), é possível atestar o que o consumidor encara no cotidiano: o café em pó subiu 49,92% no ano passado. Em Belo Horizonte, segundo o Ipead, instituto ligado à UFMG, o aumento foi ainda maior: 64% em 2021. O resultado: pacotes de 500gr de marcas populares já são encontrados por R$18 nos supermercados.
A explicação para a alta passa por dois principais fatores: clima e dólar, explica Matheus Peçanha, economista do FGV-Ibre. “Em 2021, a produção de café sofreu muito por duas vezes. Primeiro, tivemos uma forte seca, depois uma geada, o que impactou a safra”. Aliado aos fatores climáticos, a valorização do dólar perante o real fez o produtor, que já tinha uma safra reduzida, optar por exportar a maior parte do estoque que salvou.
O reflexo não poderia ser diferente, com o cafezinho chegando mais caro na xícara. O tradicional Café Palhares, no centro da capital mineira, por exemplo, segurou o aumento do cafezinho por dois anos. Mas a xícara, antes vendida por R$1,50, precisou ser atualizada para R$2. Segundo o herdeiro do ponto, André Palhares, R$0,50 está distante do reajuste de 50% que seu fornecedor aumentou ao longo do ano passado, mas repassar todo o aumento é inviável. “Com 84 anos de história, trocar a marca não é uma opção, o jeito é tirar na margem de lucro”, diz André.
A poucos metros, no Café Nice, na avenida Afonso Pena, o proprietário Renato Caldeira vive o mesmo dilema. Entre junho do ano passado e janeiro de 2022, seu fornecedor subiu o preço do produto quatro vezes, em média 10% a cada aumento, mas ele repassou apenas dois reajustes à clientela. “Reclamam muito, o povo não tem dinheiro, mas com 80 anos de história, tenho uma freguesia ativa que ameaça não voltar, mas depois volta ao normal”, relata.
Segundo o dono do Comercial Sabiá, tradicional ponto no Mercado Central, Pedro Moreira, as reclamações dos clientes são constantes, mas para manter a saúde do negócio não é possível se basear nas queixas. Em 2020, ele pagava R$400 em uma saca (60kg) de café, hoje, paga R$2.000 pela mesma quantidade, um aumento de 400%. “O que eu faço é equilibrar as compras entre os seis produtores que compro”, diz.
Mercado
Archimedes Coli Neto, presidente do Centro do Comércio de Café do Estado de Minas Gerais (CCCMG), afirma que produtor que tinha estoque garantido se beneficiou com a valorização de 134% no valor de mercado do café, mas essa não foi a realidade de todos. “Grandes produtores faturaram muito, mas a maioria é de pequenos e médios cafeicultores e, como os insumos e o custo de produção também subiram muito, muitas famílias quebraram onde a geada foi mais severa, como no Sul de Minas e no Triângulo Mineiro”, afirma.
Em relação a 2022, Archimedes diz que o cenário é de incerteza. “O produtor está muito resistente, inseguro sobre o potencial da nova safra, prevista para maio, então, por enquanto, ele tem vendido só o necessário para fazer caixa. E o mercado internacional está estagnado, a tendência é que os preços se mantenham firmes diante de uma colheita menor”, avalia.
Matheus ainda ressalta que até as eleições em outubro pode afetar o cafezinho. “Em todos os anos eleitorais, o câmbio é uma incerteza que pode explodir no segundo semestre e alimentar a inflação na commodity”, afirma.