Em tempos de seca, indústria ajuda a preservar a água com reutilização

Janaína Oliveira - Hoje em Dia
11/05/2014 às 08:52.
Atualizado em 18/11/2021 às 02:31
 (Eugênio Moraes)

(Eugênio Moraes)

Em tempos de seca e risco de racionamento de água e energia elétrica, cada gota economizada vale ouro. Nesse cenário, os esforços das empresas para poupar o precioso líquido por meio do reaproveitamento no processo produtivo ganham relevância, sobretudo quando se considera que 100 mil litros de água movem as engrenagens da indústria brasileira, por segundo.   Preocupadas em não serem reconhecidas como vilãs do desperdício, centenas de indústrias no Brasil e em Minas Gerais passaram a adotar tecnologias que diminuem o impacto sobre os recursos hídricos. Em Minas Gerais, a lista inclui nomes como as siderúrgicas Usiminas e Gerdau, a montadora Fiat Automóveis e a têxtil Cedro Cachoeira, entre outras empresas relevantes da economia estadual.   O catálogo dos Representantes da Indústria nos Colegiados de Recursos Hídricos, lançado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em outubro de 2013, lista mais de 700 nomes do setor engajados em implementar o gerenciamento das águas em todas as regiões brasileiras.   De acordo com o coordenador da Rede de Recursos Hídricos da Gerência de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, Percy Baptista Soares Neto, a reutilização da água, por exemplo, além de promover a preservação do recurso, gera resultados econômicos não só em relação à conta de água, mas também na economia de energia e matéria prima.   Grandes consumidoras de água em seu processo produtivo, siderúrgicas levaram a preocupação com a preservação do recurso para a agenda dos negócios. Conforme consta no estudo “Água, Indústria e Sustentabilidade” da CNI, com base em informações do Instituto Aço Brasil, dependendo da rota tecnológica, a faixa de uso da água situa-se entre 137 e 219 metros cúbicos (m³) por tonelada de aço, o que representa uma circulação de água de cerca de 148 m³por segundo, em média.    No entanto, significativo volume dessas águas destina-se aos sistemas de refrigeração de equipamentos, que operam em circuito fechado e requerem a reposição de água apenas para compensar as perdas devido à evaporação. Portanto, o consumo específico médio de água na indústria de aço brasileira encontra-se na faixa entre 2 e 7 m³ por tonelada de aço. E o índice médio de recirculação de água no setor é de 96,7%.   Na Gerdau, esse índice já e superior a 97%. Por meio de novas tecnologias, a captação de água pelas usinas vem diminuindo ano a ano. Em 2013, a empresa afirma ter alcançado a marca global de 2,2 trilhões de litros de água reutilizados no processo de produção do aço, volume equivalente ao abastecimento de água, por quase um ano, do Estado de São Paulo, considerando-se um consumo médio por pessoa de 150 litros diários.   Para os próximos anos, a Gerdau espera manter altos níveis de recirculação de água, visto que atualmente a pequena quantidade não reaproveitada corresponde principalmente a perdas por evaporação.   Preocupação global   O esforço de preservação da água feito pelas indústrias ajuda a amenizar a pressão mundial pelo uso do recurso. Hoje, o setor responde por 22% da demanda global, atrás apenas da agricultura (70%) e à frente do uso doméstico (8%).   E a tendência é de consumo crescente. Estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que agrupa os países mais industrializados do mundo, projeta, até 2050, um aumento de 55% das exigências globais de água, devido principalmente à procura crescente pela indústria (400%), pela geração termelétrica (140%) e pelo consumo doméstico (130%).   Usiminas e ArcelorMittal recirculam 96% da água   Ao longo dos anos, a Usiminas também tem atuado na melhoria de seus sistemas e estações de recirculação de água. Como resultado, as duas plantas siderúrgicas da empresa, em Ipatinga, no Vale do Aço, e Cubatão, em São Paulo, passaram a reaproveitar 96% de toda a água doce necessária ao processo de produção, índice que era de 88% em 1997.    É quase o mesmo patamar da ArcelorMittal Brasil, cujo índice médio de recirculação de água é de 96,7%, com perdas que se devem, quase unicamente, à evaporação. Segundo a assessoria de imprensa, o significativo nível de recirculação é garantido pelo projeto de Descarte Zero de Efluentes Industriais, a partir do qual são tratados todos os efluentes industriais gerados pelas unidades fabris.    Em Sabará, o projeto de Balanço Hídrico implantado na antiga Belgo contou com aplicação de metodologia que contabiliza entradas e saídas de água nos processos produtivos, com o objetivo de aumentar a disponibilidade de recursos hídricos e reduzir custos no tratamento de efluentes líquidos. Como resultado positivo, a empresa destaca o controle mais efetivo de vazamentos e a redução da captação de água em 96% no Ribeirão Gainha e 34% no Córrego Saquinha. “Até pela pressão da regulação, alguns setores, como siderúrgico e minerário, se organizaram e estão mais avançados”, diz o coordenador de Sustentabilidade da CNI, Percy Neto.    O gerente de Produção Sustentável da Fundação Estadual de Meio Ambiente, Antônio Malard, reconhece os avanços, embora considere que estejam distante do desejável. “A maioria só faz o que a legislação obriga. E pequenas e médias empresas sequer conhecem o volume de água que consomem”, adverte.   Mineração lança projetos ambientais   Na mineração, a utilização do recurso hídrico também atinge valores elevados. Não se limita ao processo de lavra, e estende-se para as atividades de beneficiamento e transporte dos minérios até ao encerramento da mina.    A relação entre a quantidade de água nova e a reciclagem ou recirculação varia de processo para processo. No caso do minério de ferro, a porcentagem fica entre 65% e 90%. Já para o ouro, cai de 55% a 81%, segundo a CNI.    A Vale, por exemplo, reduziu a captação de água nova em 3% – ou 10 milhões de metros cúbicos (m³) em 2013, em comparação ao ano anterior, e em mais de 11% na comparação com 2011. Segundo a empresa, a taxa de reutilização de água é de 75%. Por ano, aproximadamente 1 bilhão de m³ de água por ano deixaram de ser captados.   Metas de redução   Para algumas unidades, foram estabelecidas metas de redução da demanda específica que preveem a captação de um volume menor de água por tonelada produzida ou movimentada.   As unidades também estão sendo orientadas a selecionar equipamentos mais modernos e adequados aos processos, o que resulta em monitoramento mais eficiente das vazões de água e efluentes. Cerca de US$ 126 milhões foram destinados à gestão de recursos hídricos, o que representa 12,4% dos investimentos ambientais da Vale em 2013.   “Como a água é um insumo fundamental no nosso negócio, precisamos inserir novas tecnologias, de tal forma que possamos muito mais reusar do que captar água nova. Os novos projetos já nascem incorporando essas novas tecnologias e procedimentos”, afirma a diretora de Meio Ambiente da Vale, Gleuza Jesué.    Um dos melhores exemplos é o projeto S11D, em implantação no Pará, que vai usar a umidade natural do minério no processo de beneficiamento.   Fiat investe mais de R$ 40 milhões em projetos de gestão ambiental   Por uma produção mais “limpa”, de 2008 a 2011, o setor automotivo diminuiu em 29% o uso da água na fabricação de carros, segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Maior montadora do Brasil, a Fiat implantou, em 1994, o Sistema de Gestão Ambiental (SGA). Em 19 anos, a empresa conseguiu reduzir em 68% o consumo de água por veículo produzido.   Nos últimos cinco anos, os investimentos diretos da empresa em gestão ambiental ultrapassaram R$ 40 milhões. Um exemplo é o atual Complexo de Tratamento de Efluentes Líquidos, construído em 1998 e modernizado em 2010, que permite o reúso de 99% da água. Os investimentos em 2010 para modernização foram de R$ 12 milhões.   A utilização dos sistemas de Membranas (MBR) e Osmose Reversa na Estação de Tratamento de Água proporcionou o avanço tecnológico que resultou no aumento do volume de água recirculada de 92% para 99%.    “Assim foi possível economizar água suficiente para abastecer uma cidade de 30 mil habitantes ou para encher mais de 200 mil piscinas olímpicas”, detalha o gerente de Meio Ambiente da Fiat, Cristiano Félix.    Conforme ele explica, a tecnologia MBR – Membrans Bio Reactor – funciona como um filtro que deixa passar, através das membranas, somente água, alguns íons e moléculas de baixo peso molecular, barrando os sólidos e bactérias. Já a Osmose Reversa funciona como uma membrana semipermeável que absorve o sal e componentes nocivos à saúde humana.   Hoje, segundo o gerente de Meio Ambiente da companhia, apenas 30% do consumo de água na fábrica em Betim são destinados ao processo produtivo. O restante corresponde ao consumo humano. Todo o abastecimento é feito pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), já que não há poço artesiano.    “Neste ano, vamos investir R$ 4 milhões na busca por mais eficiência, para utilizar cada vez menos água na produção”, afirma o executivo.   Cedro reaproveita até 20% do efluente tratado   Seja na preparação e fiação de fibras, na tecelagem com ou sem tinturaria, ou no acabamento em fios, tecidos e artefatos, o setor têxtil e de confecção também é um grande consumidor de água. Para atender à regulamentação, todas as empresas do segmento precisam atingir os parâmetros necessários de descarte de efluentes, que só podem ser devolvidos ao ecossistema depois de um tratamento biológico e físico-químico.   Empresa com mais de 140 anos de mercado, a Cedro investe na política de reutilização da água que consome. De acordo com o gerente de Meio Ambiente da companhia, Márcio Alvarenga, atualmente, até 20% dos efluentes tratados são reutilizados no processo industrial, na lavagem de pátios, jardins e em outros fins não potáveis.   Segundo ele, o consumo do recurso hídrico é medido e controlado diariamente. Em 2013, na Unidade Santo Antônio, em Pirapora, no Norte de Minas, foram gastos 42 litros de água por quilo de tecido produzido, uma redução de 6,6% no consumo na comparação com 2012. A meta ideal projetada é baixar o consumo para 38 litros de água por quilo de tecido.    “Só no ano passado, foram investidos mais de meio milhão na conclusão do projeto de modernização e redimensionamento da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) da fábrica Santo Antônio, em Pirapora. O projeto, implantado ao longo dos últimos anos, agregou um grande avanço tecnológico com a adoção do sistema de membranas de ultra-filtração, que, em condições ideais, melhora a eficiência do tratamento e aumento do potencial de reúso para até 30% da água resultante do tratamento”, descreve Alvarenga. 

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