(Eugênio Moraes)
Com um crescimento de 25% no volume de pedidos de patentes em uma década, Minas Gerais começa a colher os frutos de uma integração entre academia e mercado. Entre 2003 e 2013, os chamados tratados de cooperação – quando duas entidades públicas ou privadas registram conjuntamente uma patente – saltaram de zero para oito, retrato de uma mudança ainda incipiente, mas em curso. Dados do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, divulgados pelo Caderno de Indicadores do Escritório de Prioridades Estratégicas de Minas Gerais, apontam que, de 2003 a 2013, a participação do Estado nos pedidos de patentes depositados no Brasil subiu de 8,5% para 10%, com um ganho de qualidade. O coordenador da Rede Mineira de Propriedade Intelectual (RMPI), Rodrigo Gava, destaca que as pesquisas desenvolvidas pelas universidades mineiras em conjunto com a indústria já começaram, mas ainda estão por produzir resultados expressivos. “De todos os depósitos de patentes feito em Minas Gerais, somente cerca de 7% vão efetivamente para o mercado. Durante muito tempo as patentes produzidas em diversas áreas não tiveram utilidade prática. Hoje, estamos mudando o enfoque para que, desde a fase de projeto, elas tenham o acompanhamento para conseguir aplicabilidade comercial”, comenta. Aos poucos, os centros de pesquisas nas universidades começam a despontar como nichos de grande valor agregado. A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) é a instituição de ensino superior com maior registro de pedido de patentes (1.167) no país, segundo dados da RMPI. “A UFMG é muito forte na área farmacêutica. Mas temos também o Sul do Estado, que é forte em eletrônica. Além disso, a Universidade Federal de Viçosa (UFV) tem uma ótima atuação na área de cultivares, sobretudo na soja, feijão e cana-de-açúcar”, destaca. Academia x Indústria A mudança cultural no próprio ambiente acadêmico é um dos indicadores positivos para o aumento do depósito de patentes pelo Estado. De acordo com o diretor da Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT) da UFMG, professor Gilberto Medeiros, a ideia de que as pesquisas podem ter um retorno econômico sem perderem sua finalidade inicial já começa a ser aceita entre os docentes. Para ele, as universidades, de um modo geral, ainda aproveitam pouco o potencial de estudos que poderiam gerar patentes, o que contribui para que os índices ainda não sejam elevados como nos países desenvolvidos, que apostaram na inovação para dar saltos de produtividade. “Fora do Brasil, as empresas reservam a verba para terceirizar a parte de redação das patentes. Aqui, deixamos de fazer redações de invenções muitas vezes por falta de pessoas disponíveis”, relata. Mesmo com as limitações, Medeiros explica que já há um direcionamento para que as novas pesquisas sejam voltadas para atender aos interesses específicos da indústria, levando em consideração todas as etapas desde a concepção da ideia até sua assimilação pelo mercado. “É comum pesquisas maravilhosas não serem patenteadas por falta de potencial mercadológico. Por isso, estamos tentando induzir essa aproximação. O primeiro passo foi a Lei da Inovação, que contribuiu para que os professores entrassem nas empresas. Afinal, patentes paradas na prateleira não valem nada”, avalia. No âmbito industrial, o Instituto Euvaldo Lodi (IEL), vinculado à Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), é atualmente a principal instituição a desenvolver projetos vinculados à inovação promovida em parceria com as universidades. A consultora de Propriedade Intelectual do IEL Gabriela Ferreira Franco explica que os protocolos de intenção e convênios já estão gerando interações de sucesso. “Nosso DNA é fazer essa ponte entre a indústria e a universidade. Uma dificuldade é que o mercado mineiro é muito ligado às commodities, mas nossa percepção é que as possibilidades de inovação seguem uma crescente contínua”, comenta.
Editais públicos priorizam atividades de relevância para a economia do Estado A mudança no modelo de produtividade científica dos grupos de pesquisa é outro ponto a ser aperfeiçoado para a aproximação da academia com o mercado. Atualmente, a necessidade de ter artigos publicados constantemente para garantir acesso aos recursos e verbas públicas dificulta o investimento na redação de patentes. Para a assessora adjunta de Inovação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), Elza Fernandes de Araújo, os editais em parceria com grandes empresas são os exemplos mais objetivos de êxito. Foco “O desafio é desenvolver pesquisa sobre demanda das empresas. Na medida em que a Fapemig faz parcerias com empresas como Vale e Fiat, por exemplo, e lança um edital com temas demandados pelas empresas, é possível que um avanço aconteça. Nós já fizemos três editais junto com a Cemig. Quando surgem tecnologias passíveis de proteção, há um registro conjunto e os direitos dos inventores são protegidos”, explica. UFMG destaca-se como celeiro nacional de biotecnologia Uma das patentes de destaque de 2014 surgiu do estudo desenvolvido por pesquisadores do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG. A pesquisa coordenada pelo pesquisador e líder do grupo de Imuno-biofotônica da Universidade, professor Gustavo Batista de Menezes, descobriu medicamentos específicos para tratar casos de lesão hepática. “Entendemos que o medicamento utilizado destruía muitas células do fígado e, por isso, o organismo do paciente montava uma resposta inflamatória descontrolada. Utilizando outras drogas disponíveis no mercado, conseguimos reduzir a lesão total em até 75% em testes com camundongos. A partir daí, patenteamos o uso de um grupo específico de novos anti-inflamatórios para tratar falência hepática aguda induzida por medicamentos ou álcool”, explica.