(Wilson Dias)
RIO DE JANEIRO - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a revogação da lei criada pelo governo do Rio que permite o uso de depósitos judiciais para o pagamento de precatórios. Ele afirma na ação direta de inconstitucionalidade que a nova norma autoriza um "empréstimo compulsório velado". O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), assinou a lei em junho, após aprovação da Assembleia Legislativa, e se prepara para executá-la em janeiro. A Secretaria de Fazenda afirma que a nova regra vai permitir o pagamento de R$ 3,4 bilhões a todos os 12 mil credores do Estado. O precatório é um título emitido pelo Tribunal de Justiça quando uma pessoa física ou jurídica vence um processo contra o Estado, sem possibilidades de novos recursos. Ele indica o valor devido pelos cofres públicos. Os governos estaduais e não apenas do Rio, porém, demoram anos a pagar as dívidas. Há precatórios da década de 1990 que ainda não foram quitados. Os depósitos judiciais, por sua vez, são feitos quando uma das partes de um processo (envolvendo ou não o Estado) é intimada a depositar em juízo determinada quantia enquanto o processo não acaba. Por exemplo: uma empresa aérea que está sendo processada por um cliente pode ser obrigada a depositar o valor de uma possível indenização em juízo enquanto o processo não é encerrado. O valor visa garantir o pagamento do vencedor. A nova lei estadual autoriza que o Estado use 25% dos depósitos judiciais em poder do TJ para pagar o estoque dos precatórios. De acordo com o governo, um quarto do estoque atual é suficiente para saldar toda a dívida de precatórios do Estado. Isso permitiria o pagamento de todos os precatórios existentes atualmente. O procurador-geral da República, porém, questiona a prática no STF. Ele afirma que a lei institui um "empréstimo compulsório velado", uma vez que os depósitos são feitos para garantir o pagamento de vencedores de processos, e não para o pagamento de precatórios. "Destinar recursos de terceiros, depositados em conta à disposição do Judiciário, à revelia deles, para pagamento de dívidas da Fazenda Pública estadual com outras pessoas constitui apropriação do patrimônio alheio, com interferência na relação jurídica civil do depósito e no direito de propriedade dos titulares dos valores depositados", escreveu o procurador-geral na ação, proposta no início de dezembro. Ele ressalta ainda que a lei estadual, apesar de estabelecer como teto o uso de 25% dos depósitos judiciais, abre brecha para uso de valor superior. De acordo com a norma, nesse caso o Estado deveria restituir o valor ao TJ num prazo de um mês. Para Janot, a lei não define a fonte de recursos para a restituição desse valor. E ressalta que isso pode agravar a possibilidade de vencedores de processos judiciais não conseguirem sacar sua indenização, antes garantida pelo depósito. "Não se trata de mera especulação, desconfiança ou má vontade de apontar a potencialidade de inadimplemento do Estado do Rio diante de ordens judicias de levantamento de valores depositados, caso se adote a sistemática da lei [aprovada]. Afinal, em relação a precatórios que está juridicamente compelido a honrar, o Estado do Rio de Janeiro devia R$ 4,755 bilhões em 2012", escreve Janot. O secretário estadual de Fazenda, Renato Villela, disse à Folha de S.Paulo que o ritmo das sentenças não costuma ser rápido o suficiente para esgotar 75% dos depósitos judicias. De qualquer forma, disse ele, o Estado irá repor ao longo dos próximos anos os 25% utilizados. "O depósito judicial não é um dinheiro do governo, mas está à disposição do Estado pela lei. Com esse mecanismo, quitaremos 100% dos nossos precatórios em atraso, o que para nós é histórico", disse Villela. Janot pede na ação a suspensão imediata da lei, uma vez que o Estado pretende dispor dos depósitos em breve. O governo anunciou na sexta-feira (27) que cerca de R$ 3,4 bilhões já foram transferidos para a conta do TJ responsável para o pagamento de precatórios. O tribunal afirmou que os primeiros pagamentos ocorrerão logo após o fim do recesso da Justiça, em 7 de janeiro. Toda a dívida deve ser quitada até março, segundo o TJ.