Em dois anos, inflação e recuo do desemprego alteram hábitos de consumo do belo-horizontino

Paulo Henrique Lobato
20/06/2019 às 19:51.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:12

Duas situações opostas – o avanço da inflação e a redução do desemprego – mudaram o perfil do consumidor belo-horizontino em pouco menos de dois anos. Agora, a maioria (59,2%) tem ao menos uma compra parcelada. Antes, a minoria (49,2%) é que tinha contratado a prazo. A reviravolta foi diagnosticada pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL-BH) na comparação entre duas pesquisas sobre o perfil de quem vai às compras. A primeira foi elaborada em julho de 2017. À época, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é a inflação oficial do país e é calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), havia subido “apenas” 1,88%, em BH, no acumulado iniciado 12 meses antes.
O IPCA saltou para 4,82% quando o acumulado de 12 meses foi encerrado em abril de 2019, período em que os entrevistadores da CDL-BH foram a campo para a segunda pesquisa.
 A alta da inflação freia o consumo ou leva a pessoa a parcelar compras. Esta é uma má notícia, pois há incidência de juros, dependendo do número de parcelas. Por outro lado, o recuo no desemprego, mesmo que ainda continue alto em BH, leva a pessoa a quitar dívidas e a usar parte do que sobra no salário para compras, muitas vezes, a prazo.
 Foi o que aconteceu na capital. Em julho de 2017, quando a minoria dos consumidores comprava a prazo, o contingente de desocupadas era de 205 mil indivíduos, segundo o IBGE. Já em abril de 2019, quando a maioria adquiriu produtos a prazo, os desempregados somavam 178 mil.
 Um indicativo de que muitos que retornaram ao mercado de trabalho passaram a fazer compras a prazo é o crescimento do gasto médio com pagamentos de dívidas, o que aperta o orçamento do lar. Pulou, no período entre as duas pesquisas, de R$ 494,83 para R$ 561,17. “O desemprego deu uma pequena reduzida e (muita gente) passou a poder comprar a prazo”, disse a economista da CDL Ana Paula Bastos.
 A especialista acrescenta que, se o desemprego reduzir mais, engordará a massa daqueles que voltam ao consumo. Mas ter disciplina financeira é essencial para não alimentar a inadimplência. “A tendência das pessoas é voltar ao mercado de consumo, mas podendo comprar de forma parcelada”.

Controle
 A sabedoria para não ter a renda comprometida faz parte do dia a dia de Hugo Leonardo de Souza, morador do bairro Castelo, região da Pampulha. Ele não passa aperto financeiro: dono de um salão de beleza no bairro Padre Eustáquio, região Noroeste de Belo Horizonte, optou por comprar quase tudo a prazo porque tem consciência de como gastar sua renda.
 “Adquiro muita coisa no cartão de crédito, desde o pão na padaria a materiais para uso no trabalho. Mas é preciso ter disciplina financeira. Eu faço este controle do gasto. E por que faço compras a prazo? Porque, no meu caso, mais vale uma compra parcelada que cabe no bolso do que uma à vista que me deixará zerado”, justificou, acrescentando que ainda se beneficia de programas de crédito, como milhas, oferecidas pelas operadoras da moeda de plástico. RIVA MOREIRA

Hugo Leonardo opta pela compra parcelada no cartão de crédito para não ficar com bolso “zerado” Economia A pequena horta que dona Rosângela Carlota, de 57 anos, cultiva no quintal de sua reformadora de móveis lhe rende alface, couve, tomate, abóbora, cebolinha, hortelã, rúcula, tomate, salsinha e mais ou menos R$ 120 por mês. Mas o dinheiro não é resultado de vendas do que ela tira da terra. Pelo contrário: “Esse é o valor que passei a deixar de gastar com sacolão ou supermercado desde que plantei a horta”, explica a comerciante.
 O que a microempresária-consumidora faz é o que especialistas em consumo recomendam: economize no que puder. “A alta da inflação, o desemprego elevado (ainda que tenha ocorrido um recuo) e a falta de hábito de poupar podem gerar inadimplência. Por isso é preciso planejar o consumo”, advertiu a economista Ana Paula Bastos, da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH).
O bom exemplo de dona Rosângela ajuda ainda a explicar parte de o gasto médio do belo-horizontino ter recuado com os alimentos consumidos em supermercado entre em 2017 e 2019, de R$ 505,51 para R$ 478,04, segundo os estudos da CDL-BH.  

 Substituições
 Outro motivo para a redução dos gastos em supermercados é apontado pela economista Ana Paula Bastos: “As pessoas estão comprando o que precisam e muitas substituíram bens. Se antes adquiriam manteiga; agora, levam margarina para casa. Se antes era carne de primeira; agora, nem sempre. São os bens substitutos”.
 Dona Rosângela aproveitou uma área ociosa em sua empresa e, juntamente com funcionários, enterraram sementes de hortifrutigranjeiros. “Todos levam um pouco para o lar a cada colheita. Dá uma boa economia no fim do mês”, garante a mulher, que tem disciplina financeira.
Por fim, a pesquisa da CDL-BH aponta também uma alta nas despesas com planos de saúde/odontológicos e com farmácia, que historicamente sobem mais que a inflação oficial. Esse fator também faz com que o consumidor tente cortar despesas em outras áreas. 

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