(Maurício Vieira)
Os vândalos não dão trégua em Belo Horizonte. De janeiro a agosto deste ano, 654 crimes contra o patrimônio público foram registrados. Em apenas oito meses, o número já supera o total de 2017, que teve 610 casos. As regiões Centro-Sul e Pampulha são as mais depredadas.
As estatísticas, no entanto, tendem a ser maiores. O levantamento só inclui os boletins gerados pela Guarda Municipal.
Há estragos de todo tipo: danos em lixeiras, calçadas e até em monumentos históricos. Pichações e furtos de cabos de semáforos também são cada vez mais frequentes. O último, inclusive, é apontado pela prefeitura como o responsável pelo crescimento das ocorrências na metrópole.
“Infelizmente, deve-se a uma questão social, ao aumento da população em situação de rua. Além do furto de fios, há quem também danifique a lâmpada e outros componentes do semáforo”, diz o inspetor Crislem Martins, da Guarda Municipal.
Onde
O vandalismo é mais perceptível na área central da cidade. O maior número de instalações públicas nessa região é uma das justificativas apontadas pela Polícia Militar. Além disso, contribuem os eventos realizados e a grande circulação de pessoas.
Um exemplo é a Praça 7, no quarteirão fechado da rua Rio de Janeiro, onde bueiros estão sem tampas e calçadas, com o concreto aos pedaços. Outra constatação é a condição das lixeiras, que estão danificadas.
Na Praça da Estação, na avenida dos Andradas, os problemas se repetem. Lá, há até bancos de madeira quebrados. Atravessando a via, na Praça Rui Barbosa, a base de duas estátuas aguarda a reposição das imagens que representam uma ninfa e um tigre. Ambas foram atacadas por vândalos.
De acordo com a Fundação Municipal de Cultura, os jardins do espaço serão revitalizados e as estátuas, refeitas.Maurício VieiraEncosto de madeira foi arrancado de banco na Praça da Estação
Combate
Para coibir os crimes no município, a Guarda Municipal garante fazer patrulhamento em viaturas, 24 horas por dia. Os trabalhos são auxiliados por câmeras do Centro Integrado de Operações (COP-BH) para a identificação de suspeitos.
Especialista em segurança pública, o professor Luiz Flávio Sapori defende a revisão das estratégias de combate às ocorrências.
“É preciso priorizar locais onde os delitos são recorrentes na tentativa de descobrir quem são os autores”.
Para ele, o cenário de depredação é reflexo do uso de drogas. “É importante intensificar as ações nas áreas de saúde pública e assistência social para dar encaminhamento a um tratamento do vício dessas pessoas, para tentar impedir a ação desses indivíduos”, afirma Sapori.
Pessoas em situação de rua também preocupam. Segundo a PM, muitos furtos de cabos de cobre são realizados por quem está nessas condições.
Na tentativa de combater os casos, a corporação faz abordagens de suspeitos em locais onde os delitos são frequentes. Com relação à pichação, ainda conforme a Polícia Militar, vários infratores são menores de idade.Maurício VieiraEstruturas de concreto estão danificadas em várias vias da região
Chancela mundial não tira Pampulha da mira de vândalos
O título de Patrimônio Cultural da Humanidade não afasta da Pampulha os atos de vandalismo. Grades e pilastras da Praça Geralda Damata Pimentel, ao lado da lagoa, estão cobertas por pichações.
A falta de educação também prejudica os espaços públicos. Ainda na praça, um espaço feito de tijolos e utilizado pela população para piqueniques e confraternizações perdeu o tom laranja, que deu lugar a manchas escuras causadas pelo excesso de urina.
Moradora da região, a professora Rose Souza, de 57 anos, diz que à noite o lugar sofre com a presença de usuários de droga. “É triste ver um local tão bonito se danificando assim”.Maurício VieiraEscadaria que liga a avenida Portugal à orla da Lagoa está toda pichada
Tudo igual
Na outra ponta da Lagoa da Pampulha, uma escadaria que liga a avenida Portugal, no bairro Santa Amélia, à orla é alvo frequente de pichações. A travessia foi visitada pelo Hoje em Dia em 2016 e, dois anos depois, o cenário não mudou.
“Evito vir aqui à noite. Tenho medo. É muito escuro, a gente sempre fica sabendo de pessoas que foram assaltadas. Aqui é muito perigoso”, contou o jardineiro Gilmar Gonçalves, de 49 anos, que passa diariamente pela escada para trabalhar em casas da região. “É muito triste ver tudo isso. Podia ser um lugar para admirar a lagoa, mas esses rabiscos estragam o cenário”, acrescenta.
Para a urbanista e arquiteta Suzana Meinberg, que há mais de 30 anos atua na área, os recorrentes casos de vandalismo descaracterizam a cidade. “É uma situação muito complexa, um prejuízo financeiro, moral e comportamental em termos de sociedade. É um reflexo da falta de educação e instrução, em não respeitar o espaço público e o próximo”, explicou.
Semáfotos
Número s apresentados pela BHTrans ajudam a explicar por quê o roubo de cabos de semáforo é um dos principais desafios a serem enfrentados. Segundo a empresa, até oito ocorrências são notificadas, por dia, nos sinais de trânsito da cidade. Só no primeiro semestre, os gastos com o conserto chegaram a R$ 261 mil – valor 13 vezes maior que o desembolsado em 2017.
Somam-se à lista de problemas os transtornos causados aos motoristas, como congestionamento por conta de equipamentos desativados. Na última semana, duas estruturas estavam desligadas nas ruas da Bahia e Guaicurus, no Centro de BH.
Retornos
Conforme a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), por meio de notas das secretarias municipais de Saúde e de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania, um serviço especializado em abordagem social, voltado para quem vive nas ruas, é realizado diariamente na cidade. Os trabalhos, conduzidos por equipes formadas por profissionais de diversas áreas, consistem em conversar com essas pessoas, na tentativa de convencê-las a sair dessa condição.
Dentre as ações para o atendimento a esse público, destacam-se, conforme a administração municipal, a ampliação das vagas em unidades de acolhimento e abertura dos Centros de Referência da Assistência Social (Creas) Miguilim (rua Varginha, 210 – Floresta) e Leste (rua Lauro Jacques, 20 – Floresta) nos fins de semana e feriados.
Há também mil vagas em abrigos, albergues e repúblicas para que moradores de rua utilizem os banheiros, pernoitem e façam as refeições. Dependendo do tipo de acolhimento, existem estruturas onde essas pessoas podem até morar.Editoria de Arte