Azul quente: vencedora da Palma de Ouro estreia nesta sexta nos cinemas

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
06/12/2013 às 07:35.
Atualizado em 20/11/2021 às 14:36
 (Imovision/Divulgação)

(Imovision/Divulgação)

O tema das próximas rodinhas de bate-papo já tem nome: “Azul é a Cor Mais Quente”, produção francesa ganhadora da Palma de Ouro do Festival de Cannes e principal estreia de hoje nos cinemas. É certo que terá lugar de destaque nas listas dos melhores do ano pela crítica dos quatro cantos do mundo – já aparece no top ten das revistas especializadas “Cahiers du Cinema” e “Sight & Sound”.

É garantia também de debates acalorados, em vários segmentos da sociedade, em torno da maneira como o diretor franco-tunisiano Abdellatif Kechiche aborda a relação amorosa entre duas garotas.

“Prostituta”

E, sim, o filme exibe algumas das mais ousadas cenas de sexo do cinema, despertando a curiosidade sobre os limites entre realidade e interpretação quando Adèle Exarchopoulos e Léa Seydoux estão na cama. Léa, que vive a namorada de cabelos azuis, chegou a dizer que se sentiu como uma “prostituta” no set, reclamando das ordens de Kechiche para garantir autenticidade à longa sequência de amor lésbico.

A cena mais polêmica, que deixou irritada Julie Maroh, autora do livro em que “Azul é a Cor Mais Quente” se baseia, conta com seis minutos de um sexo com posições e closes raramente vistos antes. Julie definiu como pornografia. As feministas reclamaram que o olhar do cineasta foi machista, mais preocupado em mostrar o corpo das atrizes do que tratar dos conflitantes sentimentos das personagens.

Temperatura

Apesar desse fogo cruzado, o filme tem qualidades. A maior delas está justamente na forma como a câmera está sempre próxima, rente à pele, mais suscetível às mudanças de temperatura das protagonistas. Em essência, é uma história simples sobre os muitos estágios do amor, que vai da paixão avassaladora aos desencontros, passando pela rotina que vitima qualquer relação duradoura.
Indiferentemente aos gêneros e gostos sexuais, o que Kechiche quer enfatizar é a duração das coisas, o fato de elas terem um ciclo muito claro de começo-meio-fim até que se encontrem substitutos.

Novo mundo

Talvez por isso o filme seja tão longo (quase três horas), para tornar mais crível o processo que vai do desejo ao inevitável rompimento. O azul é quente porque simboliza o início desse amor. A adolescente Léa, que luta internamente para conter seus verdadeiros impulsos, se apaixona à primeira vista por uma garota de madeixas azuladas. Ela é identificada apenas por esse detalhe.

A cor gradualmente ganha nome (Emma), profissão (artista plástica) e personalidade (experiente e dominadora), representando a abertura de um novo mundo para Léa. Mas depois que se acomoda a esse lugar, as diferenças recebem cores mais sombrias.

Desejo e cumplicidade em jogo

O rosto de Adèle Exarchopoulos enche a tela em vários momentos de “Azul é a Cor Mais Quente”. Nas primeiras cenas, seus cabelos estão sensualmente bagunçados e os lábios, sempre entreabertos. Há uma clara erotização da personagem. Aliás, não só dela, mas de todos aqueles com quem ela tem contato.

A questão que vem gerando tanta celeuma é que essa ebulição visual não representa o olhar dela ou de alguém em específico. É a visão do diretor Abdellatif Kechiche sobre aqueles corpos jovens e carentes. Para não ser tachado de polemista, o realizador busca dar à essa erotização um caráter mais verdadeiro.

Sem desperdício

Ele se estende nas cenas, usando muita câmera na mão e se aproximando do registro documental, embora nunca possamos dizer que haja um desperdício. Os diálogos são envolventes e importantes para compreendermos o grau de desejo e cumplicidade que está em jogo.

Os preâmbulos amorosos ganham maior espaço, como não se quisessem deixar escapar nada. Igualmente longa é a sequência que representa o ponto de inflexão da relação, quando, durante uma festa, Adèle sente que o calor inicial deu lugar à vida rotineira de qualquer casal.

O sexo não poderia ser menos dilatado. A intenção é a mesma que está por trás das outras cenas, com a tentativa de pôr os sentimentos mais genuínos em primeiro plano. Para Kechiche, o que as move na cama é o ato de dar e receber prazer. Para criar essa troca, o diretor não mede esforços em deixar o sexo ao alcance de nossos olhos.

Voyeur

A sequência mais comentada traz a câmera tão próxima aos corpos de Adèle e Léa que se torna quase impossível acreditar que as duas estavam apenas simulando sexo oral. Em outro instante, porém, quando o plano foca as partes íntimas de Adéle, fica patente o olhar voyeur do cineasta.

Esse porém não retira a força do questionamento do filme, sobre os grilhões que o amor (ou sua idealização) nos impõe. Expresso nos encontros com os pais de Léa, ambos saídos de outros relacionamentos e exitosos ao superarem os problemas do rompimento. O final, em aberto, também aponta a essa possibilidade.
 

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