Chico Lobo lança livro com simpatias e mandingas do mundo da viola

Elemara Duarte - Hoje em Dia
20/08/2015 às 07:50.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:25
 (Hoje em Dia)

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Tem gente que procura simpatia – mandinga mesmo – para ser um bom violeiro. Mesmo com talento de sobra, o cuidado com o “desconhecido”, do aquém ou do além, não pode ser esquecido no ofício. São estas regrinhas que o violeiro Chico Lobo divulga nesta quinta-feira (20) no lançamento (com show) do livro “Conversa de Violeiro – Viola Caipira: Tradição, Mistérios e Crenças de um Instrumento com a Alma do Brasil”, escrito em parceria com o pesquisador Fábio Sombra.   O leitor pode até não acreditar. Mas é melhor não ignorar. Chico Lobo vai na segunda opção. Todas as violas da coleção dele guardam um chocalho de cobra cascavel no bojo. E detalhe: doados por outro violeiro. Mas ele não pode ter matado o bicho – tem que ter achado a relíquia no mato. “Isso melhora o som da viola”, afiança.   “Meu aprendizado aconteceu quando me tornei amigo dos mestres violeiros dos sertões. Eles têm uma função muito importante nas comunidades, seja nas festas ou eventos religiosos”, diz. E isso ainda hoje, “em pleno século 21”. E foi nesta convivência que ele absorveu os misticismos que reúne no livro.   Meninos, eu vi!   “Isso eu vi o mestre folião Nelson Jacó, de Jequitibá, fazendo!”, avisa Lobo, sobre a simpatia para que o violeiro tenha destreza nas mãos.   Primeiro, é preciso achar uma cobra coral e conseguir mantê-la esticada por cerca de 12 horas, ponteando com o dedo indicador as pintas no corpo da pobrezinha.   A dica é se desviar do bote. Em seguida, deixe o animal fugir, pois quem se arriscou a cumprir o processo até então, acabou de roubar a “magia” da coral – e ela vai persegui-lo para sempre.  

VIOLEIRO NA SELVA DE PEDRA - Jansen Felipe (esq.) organiza o "Viola BH". Crédito: Arquivo pessoal     Viola para a juventude   “Hoje o jovem está redescobrindo a viola”, garante. Recentemente, o músico fundou o Instituto Chico Lobo, com aulas de viola para jovens da zona rural de São João del-Rei, onde nasceu. “Queremos recuperar a cultura que a massificação tem deixado perder”.   Outra iniciativa para a cultura da viola teve início no final do ano passado: o grupo virtual “Viola BH”. Jansen Felipe, 25, nasceu em BH é analista de sistema, programador e… violeiro desde os 14! “Meu pai é da cidade de Leandro Ferreira. Eles fazem muito dessas rodas de viola por lá, e ele nos levava sempre”.   Jansen diz que participa de vários grupos da área de programação no Meet Up até que pensou: “Por que não fazer um de viola?”. E assim foi. O link para quem quiser entrar no grupo é meetup.com/pt/ViolaBH/   Hoje, pelo menos uma dezena de amigos dele – entre violeiros, violonistas ou mesmo quem gosta apenas de cantar música caipira – se encontram para as rodas feitas em bares da capital.   E mística da viola, conhece alguma, Jansen? “Existem vários tipos de afinações da viola. Meu pai conta que meu avô não permitia que ele usasse a afinação ‘Rio-Acima’ por dizer que era do capeta”.   Ave Maria! E que São Gonçalo do Amarante – protetor dos violeiros – proteja a todos!   SERVIÇO   Show e lançamento do livro “Conversa de Violeiro” e do CD “Cantigas de Violeiro, com Chico Lobo. Nesta quinta-feira (20), às 21h, no Teatro Bradesco (rua da Bahia, 2244). R$30 e R$ 15 (meia).         Algumas sugestões do universo místico dos violeiros. Não custa tentar...   Simpatia do cemitério. Creio em Deus pai!   Descubra onde está enterrado o melhor violeiro que viveu na região e vá até a sepultura dele, exatamente à meia-noite de uma sexta-feira da Paixão. Erga a mão sobre a sepultura e reze sete orações do Pai Nosso, sete da Ave Maria e sete Credos. Você vai sentir um pé de vento. Dizem que é a alma do violeiro voltando. Assim que o dia raiar, você se tornará um violeiro dos bons.   Fitas na viola. (A preta, não!)   Cada cor de fita representa uma proteção. A branca representa o Menino Jesus e protege o violeiro da maldade e das energias negativas. A rosa, é outro exemplo, e representa São José. A rosa, juntamente com as fitas branca e azul forma a união da Sagrada Família. Mas atenção! Desconfie de violeiros que trazem uma fita preta amarrada no braço da viola – ele pode ter feito um trato com o “tinhoso”.   Verso para chamar o aguaceiro   Quando é chamado para tocar para uma pessoa doente, o violeiro recita versos. Há quadras tradicionais para “dor de dente”, para “curar um engasgado” ou para “curar espinhela caída”. Mas um destes versos vale para boa parte do Brasil em plena seca. São as quadras “Para Pedir Chuva”: “Vou pedir pra meu São Pedro/ Pra de nós não se esquecê,/ Faz cair chuva na terra/ Pras plantinha não morrê”.   Oração para São Gonçalo   O protetor dos violeiros também tem fama de casamenteiro, segundo tradição portuguesa. Mas para os chamados “solteirões encruados”. E para isso tem verso também. Que tal arrumar um violeiro e pedir a ele para fazer o tema musical enquanto você exprime esta sincera prece? “Ai, meu rico São Gonçalo/ Casai-me, que bem podeis,/ Já tenho teias de aranha/ Naquilo que bem sabeis”. Ê, vida...

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