(Playart)
A aguardada cinebiografia de Steve Jobs – o visionário fundador da Apple e criador do computador pessoal, do iPod e do iPhone – certamente deixará muitos espectadores incomodados ao final, especialmente aqueles que esperam por uma redenção completa do protagonista.
Principal estreia desta sexta-feira (6) nos cinemas, "Jobs" evita fazer do ex-hippie californiano um exemplo de vida; ao contrário do que normalmente se vê nesses perfis de gente bem-sucedida, como se, para justificar a trajetória de êxito, necessariamente haja um ingrediente bom em seu caráter.
Não é o caso de Jobs. O personagem de Ashton Kutcher fecha seu ciclo praticamente da mesma forma como começou, avesso às pessoas, sem piedade e extremamente vingativo. Longe do que a plateia espera, até porque, a primeira cena exibe o inventor aparentemente doente e idolatrado.
O que ele aprendeu em pouco menos de 40 anos (Jobs faleceu em 2011, de câncer)? A não só entender melhor o mercado como a ser um bom negociador, deixando de lado as reações intempestivas para incorporar uma frieza calculista.
O amigo de primeira hora, Steve Wozniak, não recebe o esperado pedido de perdão de Jobs, após este passar-lhe para trás já no primeiro trabalho conjunto. "Woz" surge no filme como uma espécie de voz interior, alertando Steve para o desprezo com o qual tratava os outros, mostrando que seu grande inimigo era o próprio Steve.
É uma abordagem ousada do diretor Joshua Michael Stern ("Promessas de um Cara de Pau"), que não injeta melodrama na biografia, preferindo apresentar uma personalidade difícil e enigmática. O que não quer dizer que não seja encantador. As falhas são inerentes ao ser humano.
O que torna Jobs atraente, no filme, é a forma como ele capitaliza a atenção de quem está à sua volta, reconhecendo nele alguém em quem vale a pena apostar. Não é à toa que a narrativa adota, como balizas, só as mudanças no campo profissional, porque parecia não existir outra preocupação do que materializar suas visões.
Não é muito diferente do que acontece em nossas vidas, cada vez mais intermediadas pela tecnologia. O que falta em "Jobs" é amor, fazendo de Steve um triste espelho da humanidade. E Kutcher está perfeito ao reproduzir, com fidelidade, essa faceta indigesta.