(Downtown)
"Você não faz um filme para bater ‘Titanic’ em sua terra. O pensamento mais otimista jamais permitiria isso", avisa Halder Gomes, ainda inebriado com os muitos recordes de "Cine Holliúdy", comédia cearense que desafiou a lógica do mercado exibidor brasileiro e estabeleceu um novo marco no cinema do país.
Após conquistar o Nordeste, especialmente a terra natal, onde é a maior bilheteria de todos os tempos, batendo blockbusters como o filme de James Cameron, o longa-metragem parte para o segundo round nesta sexta-feira, quando estreia em pouco mais de 50 salas da região Sudeste, o Eldorado das distribuidoras.
O ex-lutador de tae-kwon-do e dublê nos Estados Unidos garante estar tranquilo. "Já estamos no lucro. Fizemos, até agora, uma trajetória muito acima da expectativa inicial, que era de 100 mil espectadores", afirma. Somente na parte de cima do país, "Cine Holliúdy" foi visto por 450 mil pessoas.
No Ceará, virou o campeão absoluto, em cartaz desde 9 de agosto. O nascedouro do humor popular, de onde saíram Chico Anysio e Renato Aragão, contabiliza público de 284 mil, número que 90% dos filmes nacionais não alcançam em lançamento de Norte a Sul. Em apenas dez salas, quebrou os recordes de melhor média de espectadores por sala e de sessões esgotadas consecutivas.
Francisgleydisson
Sem qualquer tipo de apelação, tanto no humor quanto nas cenas de sexo, a comédia acompanha um apaixonado por cinema que, na década de 70, abre uma sala de exibição no interior do Ceará contra a vontade das autoridades locais. O personagem Francisgleydisson já tinha dados as caras no premiado curta "O Astista Contra o Caba do Mal".
Lançado em 2004, a história protagonizada por Edmilson Filho – adepto de artes marcais como o diretor e que virou pop star nas ruas de Fortaleza – foi um sucesso estrondoso no Estado, vendendo mais do que "Matrix" nas locadoras. "Por conta desse curta, sabia que teria uma grande plateia para o longa".
Apesar de contar com um elaborado plano de lançamento, baseado no desejo de os nordestinos se verem na tela grande, muitas distribuidoras capitularam. "Várias passaram batidas pelo filme. Agora certamente estarão mais atentas, olhando com mais atenção propostas fora das regras de mercado", analisa.
Para Gomes, "Cine Holliúdy" deixa um grande legado para o cinema brasileiro. "O principal deles é mostrar que temos uma produção regional autossustentável. Quebramos o paradigma de que todo o lançamento deve acontecer no Rio de Janeiro e em São Paulo, para depois espalhar pelo Brasil. Nós invertemos essa direção", comemora.
Francisgleydisson é um herói brasileiro
Halder Gomes também usa exemplos no exterior para reforçar a importância do investimento no cinema regional. "Os nordestinos estão para os brasileiros como os latinos para os americanos. Estes são uma plateia forte, suprida em todos os segmentos artísticos", compara.
No Brasil, os nordestinos só tinham a música para se identificar. "Nosso filme é o primeiro a mostrar o humor cearense no cinema. Ele pode parecer caricato, mas é nosso naturalismo. O cearense é brincalhão, nômade e batalhador".
Para o diretor, Francisgleydisson é um herói brasileiro. "A gente se identifica com ele porque ele é aquele herói que mata um leão por dia e que, apesar das dificuldades, preserva a ética. Ao contrário dos americanos, usa a brasilidade como arma para superar as adversidades".
Gomes revela que já trabalha numa parte 2, mas o primeiro filme a chegar nos cinemas será "Shaolin do Sertão", outra comédia, embora com mais ação. "Retratará o momento que o vale tudo perdeu força para o telecatch e foi para o interior, desafiando qualquer pessoa que quisesse entrar no ringue", adianta.