(Flávio Tavares)
Milton Machado está prestes a quitar sua dívida com Belo Horizonte – mais precisamente a partir desta quarta-feira (4). Afinal, nos 45 anos que dedica-se à arte, essa será a primeira vez que o carioca apresenta seu trabalho na capital mineira em uma exposição individual. O artista vai ocupar todo o terceiro andar e o pátio do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), na Praça da Liberdade.
“Cabeça” é um retrospecto que tem o próprio artista como curador. Não bastasse o desembarcar de Machado na capital, o público belo-horizontino ainda será presenteado com “Paraíso” – obra que será montada pela primeira vez pelo artista.
“Existe claramente um eixo Rio-São Paulo e Belo Horizonte está sempre um pouco à margem. Não sei se são as montanhas, os rios ou as minas”, diz aos risos para protestar em seguida: “mas o problema, na verdade, é a política da arte”, critica.
“Por causa disso sei que muita gente não conhece meu trabalho por aqui. Essa é uma experiência nova, mas sinceramente não é um problema. Para mim basta estar aqui e fico curioso sobre como a exposição vai ser lida e recebida”, comenta o artista que tem no currículo três Bienais de Arte de São Paulo.
O próprio Milton Machado fala sobre a sua exposição da capital mineira. Clique e ouça:
Destaques
Das obras expostas no CCBB, estão clássicos que colocam Machado no hall dos importantes nomes da arte crítica e experimental do país: “Módulo de Destruição Atravessado por Nômade”, “Princípio do Fim” (da coleção de Gilberto Chateaubriand), “Esperança no Porvir”, “21 Formas de Amnésia” (1.707 fragmentos que antes compunham um único desenho), as “Mapotecas”, “Hum (Romano)”, a série “Desenhos Raivosos” (que até 2013 nunca havia sido exposta) e “Mão Pesada”.
O destaque é “História do Futuro”. “Este é um trabalho que tem uma importância muito especial. Não porque eu gosto mais, mas é o que me persegue o tempo todo e está sempre se transformando – e sempre atual. Em progresso iniciado em 1978, ‘História’ é um trabalho de reflexão filosófica”, explica o artista de 68 anos.
Nessa obra, assim como em todos os outros trabalhos – das esculturas às instalações, das fotografias aos desenhos, e pinturas aos vídeos – o que move o artista é a desconfiança, o incômodo. A construção, destruição e vida são conceitos que fazem parte do imaginário (e de todo o trabalho de pesquisa) de Machado desde 1972, como se o simples olhar do artista sobre cada objeto, pessoa e situação o movesse a edificar uma nova obra.
“O meu trabalho é resultado disso: cada obra é fragmento do que já foi, cada trabalho são as novas vocações que fui descobrindo. Todos eles têm essa estratégia de desconfiar da coisa dada e de que ela deve ser uma outra coisa. Tenho um olhar crítico que suspeita das coisas e que as coloca em crise e que, sobretudo, as transforma”.
Também arquiteto e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o carioca cita como influência os artistas italianos Vittore Carpaccio (1460–1520) e Giovanni Piranesi (1720–1778). Diz ainda que qualquer semelhança com pinturas de Salvador Dali (1904–1989) e Escher (1898–1972) fazem parte de um passado distante. “Uma época que eu tinha cabelos longos, andava por aí com meu narguilé e chegava num navio chamado certeza”.
Cabeça”, de Milton Machado Centro Cultural Banco do Brasil (Praça da Liberdade, 450, Funcionários). Quarta a segunda, das 9h às 21h. Até 30/3. Entrada franca.