Equilibrar vida artística e família ainda é um desafio para as mulheres

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
15/09/2015 às 07:17.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:45
 (Frederico Haikal)

(Frederico Haikal)

Bastam os primeiros acordes ao violão e Tânia Braz soltar a voz, apresentando uma composição própria (“Everyway”), para os olhos de Seu Expedito começarem a marejar. Aos 91 anos de idade, o pai da cantora mineira é uma das razões para a artista dar primazia à família, diminuindo o ritmo de sua agenda de shows.   Na verdade, Tânia nunca foi adepta do sucesso a qualquer preço, como a protagonista de “Ricki & The Flash – De Volta para Casa”, em cartaz nos cinemas (confira roteiro). Interpretada por Meryl Streep, a roqueira do filme abandonou marido e filhos para se dedicar completamente à carreira musical, retornando ao lar anos depois.   Ricki é uma personagem fictícia, mas resume os dilemas de qualquer mulher de hoje, dividida entre ganhar a independência e se dedicar à família. Tânia, que lidera a banda Arion, há quase 20 anos na estrada com um repertório de rock progressivo, não condena a roqueira, ressaltando que se deve fazer a “opção que o coração apontar”.   Escolha   Ela mesma já teve a chance de “deslanchar sua carreira”, como prometeram vários produtores, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Optou por continuar em BH, cantando com o mesmo empenho diante de uma grande plateia ou para uma pessoa só – como geralmente faz quando seu pai está por perto.   Seu Expedito tem suas preferidas, como “Va, pensiero”, da ópera “Nabuco”, de Giuseppe Verdi, e “La Golondrina”, conhecida nas vozes de Nat King Cole e Caetano Veloso. “Não são bem as músicas que toco, mas as que ele mais gosta”, ressalta Tânia, mostrando o apanhado de papéis com cifras.   Só a imagem   Feliz com a sua opção, ela relativiza o fascínio pelo sucesso, destacando que há um preço alto a se pagar pelo topo do hit parade. “É igual ao Facebook: você está ali para aparecer, ser admirado. E, muitas vezes, as pessoas que vão ao show só querem aquela imagem, não a sua música”, analisa.   Tânia sublinha que essa relação cria bastante confusão entre o personagem e a vida real. “Queira ou não, você está representando, mostrando a sua parte legal e bonita. O que é normal, pois vivemos disso”, explica a cantora, que se aproximou do progressivo por conta de sua paixão pelo grupo Renaissance.   Prestes a lançar um novo disco, dessa vez com a banda Ladylike, ela tem em seu pai o fã número 1. A razão de ele se emocionar a cada vez que Tânia canta tem a ver com as suas lembranças do passado. “Gostava de dançar quando era mais jovem, sempre tirava as moças”.   Titane nunca sonhou ser ‘apenas’ esposa e mãe   Cantora rejeita “aquilo que se espera” da mulher   Arquivo pessoal EM FAMÍLIA – Titane acabou sendo mãe de Maria Íris aos 40 anos; na foto, com o marido João das Neves e a enteada Maria João   A ideia de se casar e se dedicar à vida ao lar estava entranhada na família da cantora Titane, que passou a sua infância em Oliveira, no interior de Minas Gerais, ouvindo as regras para exercer, da melhor maneira possível, os lados esposa e mãe.   “Mesmo antes de querer ser artista, sempre neguei isso com força. Lembro que, aos oito anos, ouvi de uma colega que não iria brincar porque tinha que passar o bife para o irmão. Perguntei se ele fazia o mesmo, mas não, pois jogava futebol”, recorda.   Outro episódio marcante foi ouvir da mãe, pianista, a história de Chiquinha Gonzaga. “Como meus pais eram muito apaixonados, mostrando uma harmonia grande, fiquei assustada quando me disse que Chiquinha se separou e criou o filho sozinha, ganhando dinheiro com música”, relembra.   Titane nunca teve problemas com suas escolhas. Os pais sabiam de todos os passos, do uso de cigarro à perda de virgindade. Quando saiu de Oliveira, amigas da mãe indagavam “E a Titane, casou?”. Uma respondeu que “não, já que era cantora”, revelando outro tipo de preconceito.   Mãe aos 40   “Comecei a cantar na década de 90 e até hoje a questão feminina está na ordem do dia. Toda nossa história, desde a Grécia Antiga, foi escrita a partir do poder do homem. Felizmente isso começa a mudar agora”, analisa Titane, que não se arrepende de ter adiado os planos de maternidade.   “Sempre soube o que queria da minha vida. Filho nunca fez parte desse imaginário. Só fui querer aos 40 anos, quando surtei da noite para o dia. Ou fazia análise ou teria um filho. Preferi a prática. Hoje a Maria Íris tem 15 anos”, salienta Titane.   Além disso   “Ricki & The Flash” pertence à mesma lavra de “Aqui é o Meu Lugar” (2011) e “Não Olhe para Trás” (2015), filmes sobre estrelas do rock acima dos 50 anos, que vivem de seus sucessos antigos e que não se adaptaram aos novos tempos, em que as drogas e o lema “paz e amor” sucumbiram ao consumismo e outras formas de culto proporcionadas pela tecnologia.   Além da música, evidenciada como uma espécie de canto do cisne do velho e bom rock’n’roll, o que esses protagonistas têm em comum é a dificuldade de se relacionar com a família, especialmente os filhos, que mal conhecem, criando vários conflitos que, a certa altura da vida, quando passam a questionar as suas escolhas, precisarão ser resolvidos.   Os filhos geralmente são a negação de seus pais, como em “Não Olhe para Trás”, ou vivem problemas complexos, carentes que estão de, no caso de “Ricki & The Flash”, uma figura materna, vivida por Meryl Streep. Seu “retorno” será um divisor de águas. Não só pelo reencontro familiar, mas também pelo aprendizado recíproco, de reinserção social desses astros como também pelo que eles ainda têm a ensinar.   SONY PICTURES/Divulgação NOS CINEMAS – Meryl Streep vive uma roqueira em “Ricki & The Flash – De Volta para Casa”

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