(Carlos Rhienck )
Na década de 90, pais ficavam assustados com as contas telefônicas. Não era raro encontrar algum indignado com as ligações que os filhos faziam para o “Disque Amizade”, uma verdadeira febre entre jovens que desejavam fazer amigos. Normalmente, era só uma conversa atravessada em meio a tantas outras, mas algumas delas geravam encontros. Uma historinha nostálgica para mostrar que a necessidade dos adolescentes em promover encontros é muito mais antiga e ampla que os tão falados “rolezinhos”, que ganharam a mídia nas últimas semanas. A internet trouxe novas possibilidades de socialização que vão bem além dos shoppings e acontecem nos mais diferentes espaços públicos, como praças e parques. Basta criar um evento no Facebook. Pode aparecer meia dúzia de gatos pingados ou uma pequena multidão. É sempre difícil prever. Parque Há algum tempo, o Parque Municipal passou a ser um ponto de encontro marcado por jovens pela internet. Um grupo de MC’s de funk convidou os fãs para uma confraternização na semana passada e aproximadamente 30 pessoas apareceram.
Gostaram tanto do resultado que marcaram um novo encontro para o dia 15 de fevereiro, que ganhou uma característica importante: os jovens estão convocando uma doação de alimentos (leite em especial) e brinquedos, que serão entregues a um hospital especializado em câncer infantil. “O povo vê o funk como som de bagunceiro. Queremos mostrar que a gente não é isso, não. Nosso encontro é bem tranquilo”, conta Gabriel de Azevedo, o MC GB, um dos organizadores do evento. Segundo o rapaz, que tem 15 anos, o Parque Municipal foi o local escolhido por ser numa região central e de acesso para qualquer pessoa, independentemente de idade e renda. “No primeiro encontro, ficou todo mundo reunido no coreto. Tiramos fotos, ficamos conversando e fazendo rimas na hora”, conta Gabriel. E teve beijo na boca? “Alguns beijaram, sim”. Num grupo de mais de 30 adolescentes, não poderia ser diferente. O encontro agendado pelos amigos de MC GB é apenas um dos vários que vem tomando conta do Parque Municipal. Hoje mesmo, às 14 horas, outros funkeiros devem receber seus fãs perto do coreto. Ao menos é o que consta em um dos vários eventos marcados no Facebook, sendo este com mais de 500 confirmações de comparecimento. Se vai bombar, só indo até lá para conferir. Encontro no Hemominas Os eventos beneficentes pipocam nas redes sociais. No dia 1º de março, acontece um encontro no Hemominas. A intenção é chamar a atenção para a doação de sangue. Mais de 100 pessoas já confirmaram presença. Um dos organizadores, Lucas Castano, de 18 anos, promete instruir os amigos a fazer o agendamento prévio. Para cantar junto ou protestar Todo mundo se sente meio estranho na adolescência, meio deslocado do mundo. Mas, convenhamos, hoje é muito mais fácil encontrar pessoas com as mesmas afinidades culturais, basta procurar pelas redes sociais. Música, religião, política, literatura, videogame... Qualquer assunto pode reunir pessoas que talvez não se esbarrariam na rua espontaneamente. É o caso de um grupo de fãs da banda Paramore. No último dia 25, cerca de 60 jovens de 13 a 25 anos (a maioria ainda adolescente) se reuniram na Praça da Liberdade para celebrar a segunda edição do “Paramore Brazilian Day”, movimentação realizada em 15 cidades do país. Na oportunidade, os jovens se apresentaram, conversaram, cantaram as músicas da banda favorita e participaram de sorteios e brincadeiras promovidos pelos organizadores do encontro. Alguns dos participantes pareciam bem tímidos, mas foram se soltando no decorrer do encontro. “É também uma forma de fazer novos amigos. Além da internet, temos um grupo no Whatsapp e mantemos contato constante”, disse Aline Ingrid, de 21 anos, uma das organizadoras do encontro. Movimento As manifestações de junho de 2013 são provas de que a internet é uma poderosa ferramenta de mobilização quando o assunto é política. E o punk ativista Augusto Felipe Soares, de 18 anos, conta com a rede para o fortalecimento do movimento a qual aderiu. Ele aproveitou a convocação nacional do “Não Vai Ter Copa” do último dia 25 e criou um evento no Facebook, conclamando para um protesto na Praça Sete. Apenas os punks apareceram, algo que ele não viu como ruim. “Mais do que protestar contra a Copa, queremos mostrar o ideal de um movimento que não morreu”, afirmou. Em um encontro anterior, no Parque Municipal, os punks chegaram a arrecadar R$ 80 junto a transeuntes, dinheiro usado para confeccionar bandeiras e cartazes. Encontros pela internet, claro, não são fenômeno exclusivo dos adolescentes. Eventos dos mais diversos são criados a todo momento no Facebook por pessoas de todas as idades. Uma das novidades é o “Isoporzinho BH”, marcado para o dia 22, na Praça Duque de Caxias. Cada pessoa vai levar sua bebida em um isopor, como protesto pelos preços abusivos dos bares. Mais de 2.500 pessoas já confirmaram presença. Abertura para a novidade Simbolicamente, a adolescência é o momento de desligamento dos pais. A hora de desbravar as novidades e, por isso, buscar novas relações interpessoais. “O adolescente vive a abertura para o novo e está sempre conectado com o seu tempo. Por isso usa todas as possibilidades que a internet oferece”, afirma a psicanalista e professora da UFMG Cristiane Cunha.
De acordo com a especialista, é preciso vê-los como protagonistas. “O adolescente não só absorve a novidade, ele é também produtor de invenções. Basta ouvir uma conversa e observar a linguagem própria que eles criam”, afirma Cristiane, que faz ainda um alerta: “Não se pode generalizar. Assim como há os jovens interessados em socialização, existem também aqueles que vivem a reclusa do convívio”.