Músicos de gêneros variados mostram a versatilidade da viola caipira

Thais Oliveira
taoliveira@hojeemdia.com.br
21/10/2016 às 19:44.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:20
 (Wesley Rodrigues)

(Wesley Rodrigues)

A viola está na roda ou melhor, na moda. E não é só caipira não. As novas gerações têm trazido frescor a um dos instrumentos mais antigos do mundo agregando ritmos que vão do rock ao drum’n’bass nas cordas até então mais difundidas nos rincões do país. 

A mineira Letícia Leal, de 31 anos, faz parte dessa turma. À música de raiz a violeira acrescenta jazz, blues, folk, choro e música afro. Vendo-a no palco, ninguém imagina, porém, que ela começou a tocar há oito anos, tamanha destreza. 

Letícia sempre teve os olhos voltado para o campo – não, contudo, por causa da música. O sonho era cuidar de cavalos. Por isso, cursou veterinária e até atuou na área. Um belo dia, Almir Sater – violeiro de mão cheia, um dos mais respeitados e conhecidos do país – fez a jovem inclinar os ouvidos para uma nova possibilidade. “Ganhei um CD dele e me apaixonei. Comecei a querer fazer uma música assim, que saísse de dentro de mim”, diz.

Bruna Viola, de 23 anos, tem despontado na cena musical. Só no YouTube, a violeira tem mais de 5 milhões de views em apenas oito vídeos

Violeiras, sim
A despeito do preconceito que já sofreu, ela tem se destacado na cena, mostrando que as mulheres podem ser, sim, referência na viola. Tanto que, atualmente, Letícia dá aulas do instrumento. “Muitas meninas dizem que começaram a tocar por minha causa. Isso é muito gratificante”, celebra. Para 2017, a artista prepara o primeiro disco com canções autorais e, possivelmente, algumas releituras.

Letícia ensina a tocar "Luzeiro", de Almir Sater:

E não para por aí. Letícia será a única mulher a se apresentar logo mais, às 21h, no Sesc Palladium, ao lado de medalhões como Pereira da Viola, Bilora, Joaci Ornelas, Gustavo Guimarães e Wilson Dias. O show marca a inauguração do Instituto Vivaviola. O movimento busca uma visão contemporânea do universo da viola, além de refletir sobre valores tradicionais ligados ao instrumento.

O grupo Cega Machado já trouxe sons que vão do maracatu ao drum’n’bass na viola caipira

Mistura de rock, jazz e outros gêneros cai no gosto do público

Fernando Sodré também se enveredou pela viola após escutar um grande mestre, o violeiro Renato Andrade. A influência do ritmo adotado no começo – o choro – veio, porém, por causa de Sebastião Idelfonso, o primeiro professor de viola de Sodré. Desde 2007, quando lançou o segundo disco, “Rio de Contrastes”, o instrumentista belo-horizontino agregou o jazz ao trabalho. Hoje, aos 38 anos, é comumente lembrado pelos colegas de profissão quando o assunto é referência violeira. Trilhar esse caminho, contudo, não foi tarefa das mais fáceis.Matheus Aredes/Divulgação / N/AREFERÊNCIA - Fernando Sodré agregou o choro e o jazz ao seu trabalho

“Como são músicas (choro e jazz) que pedem muito do artista, pesquisei o universo caipira do instrumento e estudei com vários professores até criar um idiomatismo da minha arte para mostrar a viola em outros estilos sem perder a essência. Não tinha material didático para isso e até hoje não tem muito”, relata. 

Celeiro de violeiros
Conforme o violeiro, nos últimos tempos têm surgido muitos artistas interessados em ampliar as possibilidades do instrumento. Entre eles, destaca o paulista Arnaldo Freitas e o curitibano Victor Gulin. Contudo, é o estado mineiro ao qual ele se refere como “celeiro de violeiros”. 

“A diversidade é grande em BH, mas também em outras regiões, como Norte e Triângulo. A cena é muito boa aqui”, comenta. 

 Desse cenário que vem inovando, ele considera relevante o trabalho de artistas como Letícia Leal, Chico Almeida e Gabriel Nascimento. Sodré ressalva que a base continua sendo a música caipira. “Qualquer um que está começando a tocar tem que, antes, beber dessa fonte. A música caipira é o ponto de partida”, afirma.

Rock’n’roll

Renato Caetano é outro músico destacado por Sodré. É outro “discípulo” de Almir Sater. Mas frisa sempre ter gostado de rock. Por isso, acabou dando um jeito de aliar a paixão pelo gênero e o instrumento num só trabalho. Neste ano, lançou o disco “As Dez Cordas de Liverpool”, tributo instrumental aos Beatles, feito na viola, no Teatro Bradesco. O som de Renato foi aprovado com louvor pelo espectadores. 

 “Foi um show solo, de um cara que não é tão conhecido pelo público geral e que toca rock na viola. Foram mais de 400 pessoas, muito mais do que eu esperava”.

Segundo Renato, apesar do estereótipo construído em torno da viola, o público aprova as novidades. “As pessoas, na verdade, não têm preconceito quanto a isso; têm é desconhecimento”.Élcio Paraíso/Divulgação / N/AROQUEIRO - Renato Caetano traz o rock na viola e diz que o público tem aprovado o seu som

Instrumento ajuda artistas a contar a história cultural do Brasil
Do outro lado da esteira está o violeiro Erick Castanho, que vem trabalhando no resgate da cultura regional por meio da viola. Natural de Uberlândia, o músico desde criança frequenta as famosas folias de reis, absorvendo, assim, influência de artistas como Pena Branca e Xavantinho – conterrâneo dele.

Na região do Triângulo Mineiro ele diz ter, além de uma nova geração de violeiros, uma renovação do público amante do som produzido pelo instrumento. "Costuma ir um pessoal jovem assistir às apresentações. Hoje, acho que metade é de universitários”, diz. 

  

O violeiro integra o projeto “Dandô – Circuito de Música Décio Marques”, movimento que busca mostrar sonoridades regionais. Com a iniciativa, ele tem tocado pelo país e garante que cada região usa a viola de um jeito. “A gente consegue tratar a história cultural do Brasil tendo a viola como pano de fundo”, afirma.Violeta Paiva

TRADIÇÃO - Erick Castanho trabalha com resgate da cultura por meio da viola caipira

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