O mestre português pela autora-fã Elisa Lucinda

Elemara Duarte
20/07/2014 às 15:16.
Atualizado em 18/11/2021 às 03:27
 (Reprodução)

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Uma lição, muitas avós nos ensinam: “Não deixem que falem por você”. E quando alguém assume a voz de um dos maiores poetas da língua portuguesa, mas que já morreu? O resultado pode ser conferido no recém-lançado “Fernando Pessoa: O Cavaleiro de Nada” (Editora Record, 416 páginas, R$ 55), da atriz, escritora e jornalista capixaba (mas radicada no Rio de Janeiro) Elisa Lucinda. Trata-se do primeiro romance entre os 16 títulos – entre infatojuvenis e de poesia – que ela já publicou.

Em vida, o português Fernando Pessoa (1888-1935) criou vários heterônimos – Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caeiro os mais conhecidos. Mas neste livro, é como se a escritora, usando seu lado atriz por meio da palavra escrita, quisesse ser o poeta, para contar a história dele.

Mas, não se esqueça, alguns fatos são reais, outros, ficção. É confusa demais essa prática em publicações best-seller como “O Código Da Vinci”, de Dan Brown. Parece que o autor precisa de um impulso baseado em alguma história real para fazer a sua, por vezes, aquém da original. Mas a arte permite tudo, não é verdade? E, sejamos justos, em alguns casos a narrativa criada até que prende a atenção.

Quem poderia dizer se os textos de “O Cavaleiro do Nada” ficaram, pelo menos, parecidos com o que Pessoa poderia dizer sobre si? No caso, a escritora usa a voz de Pessoa – o real – por meio de trechos de cartas, diários e até de poemas. Estes são intercalados no texto de Lucinda. Porém, com uma lógica romanceada idealizada pela escritora.

Nisso, a ideia soa pretensiosa. Fica clara a distância entre as linguagens da fã/escritora e a do mestre português. Um trecho de autoria dela: “Portanto, essas considerações, esses vácuos na lógica daquela mitologia judaico-cristã, tudo ia ficando cada vez mais claro e misterioso em meu juízo inquiridor”.

Aleatoriamente, abre-se o livro e, em outra situação, o texto “pessoano”, retirado de uma das cartas do português, diz: “Há barcos para muitos portos, mas nenhum para a vida não doer, nem há desembarque onde se esqueça”. Eis a característica que se almeja em letra e musicalidade.

A arte é uma mãezona liberal que dá a chave da casa para quando bem entendermos ser a hora de entrar. Porém, há situações nas quais respeitar o horário do sono dos moradores é mais elegante.

Vida de Eça de Queiroz é esmiuçada em caprichada biografia

Outro lançamento sobre um escritor da terra do descobridores do Brasil chega às livrarias: “Eça de Queiroz: Uma Biografia” (coedição Ateliê Editorial e Unicamp, 600 páginas, R$ 110). Trata-se de mais um livro do especialista em estudos queirozianos, o português Alfredo Campos Matos.

A biografia de Eça de Queiroz (1845-1900) foi originalmente publicada na França e, em seguida, com edição ampliada, em Portugal, em 2009. A edição brasileira também recebeu acréscimos. Nela, o autor introduziu informações aos retratos psicológicos de Eça e de Emília de Castro, a mulher dele.

Outras pitadas biográficas novas se referem aos anos do escritor como estudante, no Porto. Completam o megalivro (de capa dura), vários textos de críticos da obra de Eça, dinamizando a pesquisa do biógrafo, um arquiteto por formação.

O autor de romances como “O Primo Basílio” (1878) e “Os Maias” (1888), ambos inspiradores de dramaturgias televisivas nacionais, nunca veio ao Brasil mas com poucos meses passou a ser criado por sua ama e madrinha brasileira, a costureira pernambucana Ana Joaquina Leal de Barros, e junto aos avós paternos. Eça viveu sob os cuidados de Ana até os cinco anos, quando ela morreu.

Outra relação com o Brasil vem da parte do avô dele, José Joaquim de Queiroz e Almeida, que refugiara-se no Rio de Janeiro, na época das lutas liberais. Em terras cariocas, em 1820, nasceu José Maria de Almeida Teixeira de Queirós, pai do romancista. Anos depois, a família retornou para Portugal.

Eça foi rejeitado pela mãe, Carolina Augusta Pereira d’Eça, uma jovem de 19 anos que se envolveu com o pai do romancista, mais velho do que ela. Anos depois, eles acabaram se casando e o reconheceram. A biografia é ricamente detalhada sobre este processo, trazendo, por exemplo, a carta do pai à mãe de Eça, explicando-a sobre o porquê de estar ignorando o nome dela no registro da criança, seguindo conselhos do avô.

“Isto é essencial para o futuro de meu filho, e para que, no caso de se verificar o meu casamento consigo – o que talvez haja de acontecer brevemente –, não seja ‘precisa’ sem tempo algum justificação de filiação”, cita a biografia.

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