(Jackson Romanelli/Universo Produção/Divulgação)
Em 2001, Odilon Lopez estava retornando para a cidade natal Raul Soares (Zona da Mata mineira), após 50 anos morando em Porto Alegre, quando faleceu durante o voo. Infarto fulminante. Um dos primeiros diretores negros a assinar um longa-metragem no país, o trabalho dele ficou guardado numa prateleira da casa da filha Vanessa por 16 anos, até ser redescoberto pelos curadores da 12ª Mostra de Cinema de Ouro Preto, encerrada ontem na cidade histórica.
Com diálogos escritos por Luís Fernando Veríssimo, “Um é Pouco, Dois é Bom”, lançado em 1970, foi exibido no Cine Vila Rica, despertando novamente o interesse pela trajetória do cineasta mineiro e da necessidade de preservação da obra dele, que inclui imagens exclusivas do embarque do presidente deposto João Goulart para o Uruguai, em 1964. “Ele era um legalista, ajudando a divulgar a resistência ao golpe”, destaca Vanessa.
Essas imagens estão perdidas, após Odilon enviá-las à embaixada americana como parte de seu currículo, para conseguir uma bolsa de estudos nos Estados Unidos. “Eles enviaram de volta o dobro de filme virgem, explicando que o material havia extraviado. Hoje ele pode estar numa cinemateca dos Estados Unidos”, lamenta Vanessa, que tem em casa uma estante com vários rolinhos de filmes, sem qualquer identificação.
Ajuda
“Meu pai vivia sozinho em Porto Alegre. Tinha conquistado muitas mulheres e vivido loucamente os anos 60 e 70. Quando morreu, fui com meu irmão, que mora nos Estados Unidos, ver as coisas dele e trouxe tudo para cá. Há muita coisa, como equipamento em Super-8. Estava sempre filmando”, registra a filha, que espera a ajuda de instituições especializadas em preservação para dar um destino adequado ao material.
“O festival foi importante para isso, para que a gente possa cuidar do patrimônio do pai”, salienta Vanessa. Ela lembra que Odilon Lopez nunca atentou para o fato de estar fazendo história como um dos diretores negros pioneiros no cinema brasileiro. “Só pensava em realizar esse desejo de fazer um longa-metragem. Sempre foi apaixonado por cinema, desde que saiu de Minas Gerais. O cinema era a vida dele”, sublinha.
Carlitos
Nascido em 1941, órfão de pai e mãe, o cineasta foi criado pelos avós em Belo Horizonte, onde conheceu os filmes de Charles Chaplin, logo pondo na cabeça que um dia veria o próprio nome num cartaz de cinema. Com a morte do avô, foi levado ao Rio de Janeiro, para um abrigo de menores. Em pouco tempo, passou a trabalhar em algumas produtoras de filmes da Cidade Maravilhosa. Em 1959, aceitou proposta para trabalhar em Porto Alegre.
Para fazer “Um é Pouco, Dois é Bom”, que reúne dois episódios, vendeu um apartamento. “Não me lembro do filme, pois nasci depois, em 1971, mas me recordo do apartamento que serviu de locação. Depois de feito o filme, o alugamos por seis anos. E toda a louça que aparece era a da minha mãe. Ela tem até hoje”, assinala. Odilon realizou também dois curtas, “Um Dia de Chuva”, nos anos 60, e “Jamboree”, em 1982.