Pablo Giorgelli, um diretor à procura do público latino-americano

Paulo Henrique Silva* - Hoje em Dia
12/06/2013 às 08:12.
Atualizado em 20/11/2021 às 19:03

CURITIBA – Desemprego, pai doente e divórcio. Crise pessoal, somada à débâcle econômica argentina ocorrida no início do milênio, retardou em mais de dez anos a estreia do diretor Pablo Giorgelli em longas. Até que a sorte mudou de lado. O Câmera D’Or, no Festival de Cannes 2011, foi o ponto alto do "milagre", palavra à qual ele recorre para definir o sucesso alcançado com "Las Acacias". "Nem em sonho poderia imaginar que isso iria acontecer", relata o cineasta, convidado do "2º Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba", em cartaz na capital paranaense até sexta-feira (14).

Jurado da mostra competitiva, após "Las Acacias" ter sido escolhido o melhor filme do público, na edição anterior, ele também vê, com o convite, a oportunidade de lançar o trabalho no Brasil – tema que dá início à conversa com o Hoje em Dia, realizada num café do Museu Oscar Niemeyer, onde o diretor conferiu as exposições dedicadas a Paulo Leminsky e Maurits Escher.

"Há 20 anos passo férias no Brasil. Tenho uma relação de carinho com o país, além de muitos amigos", registra Giorgelli, agora torcedor do Atlético Mineiro – após o seu time do coração, o Boca Juniors, ser eliminado da Libertadores pelo Newell’s Old Boys.

Para o diretor, é "algo muito triste e estranho" que países vizinhos não vejam filmes uns dos outros. "A grande desculpa dos exibidores e distribuidores é que o público não quer (ver filmes latino-americanos). Uma inverdade que responde a outros interesses, de estratégia comercial", diz ele. Cumpre lembrar que o filme teve um excelente público na Europa.

Sucesso na França

Uma das saídas propostas por Giorgelli é a criação de salas alternativas pelos governos. Ele cita o caso da Argentina, na relação com os próprios filmes. O Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales (INCAA) administra cinco salas no centro de Buenos Aires, com ingressos a preços reduzidos. Dos 40 mil espectadores que assistiram a "Las Acacias" em solo argentino, 13 mil foram a essas salas.

Comparado à performance na França, no entanto, o número ainda é baixo. "Enquanto tivemos 11 salas no lançamento em Buenos Aires, na França foram 70 cinemas, resultando num público de 130 mil".

Carona

Com a repercussão na mídia, Giorgelli esperava mais em seu continente. Especialmente no Paraguai, que destacou a presença de "uma paraguaia em Cannes", devido à participação de Hebe Duarte como protagonista, ao lado de Gérman Silva.

"O que os exibidores alegam é que trata-se de uma produção lenta, mais difícil. Mas o filme não tem nada de hermético. É muito simples e, por isso, funciona tão bem com o público", ressalta. É verdade: "Las Acacias" toca o coração, sem ser melodramático.
Na tela, um motorista de cara fechada e poucas palavras é obrigado a dar carona, em seu caminhão, a uma mulher e seu bebê. Através de pequenos gestos e olhares, a relação antes distanciada se transforma ao final da jornada.

A escolha dos atores foi um capítulo à parte

Depois que escreveu o roteiro, Pablo se deu conta que tinha feito um filme sobre o sentimento de ser pai, o que estaria relacionado ao fato de o seu genitor ter ficado doente num momento difícil de sua vida. E, ainda, com o pai que gostaria de ser.

Aliás, os bastidores da produção são dignos de nota. Giorgelli lembra que uma fase em que "todos os males" pareciam ter se abatido sobre ele, no campo afetivo e profissional, terminou com um caminho dourado para Cannes.

No aeroporto de Havana, onde tinha participado de um concurso de pós-produção, o realizador foi "beneficiado" pelo atraso dos voos ao encontrar um dos curadores do festival francês. "Entreguei uma cópia não finalizada de ‘Las Acacias’. Dois meses depois, o diretor artístico da ‘Semana da Crítica’ me escreve dizendo que tinha gostado muito e queria ver a cópia mais ‘terminada’", recorda.

Uma das chaves para se compreender o sucesso do longa é a química entre os atores, o que inclui o bebê Nayra Manami, dono do doce sorriso de Anahí. "Os três realmente formaram uma família", salienta. Cada um entrou no filme de uma forma. Para o papel de Rubén, o cineasta queria um motorista de verdade. Gastou seis meses na procura, sem êxito.

"Para trabalhar com atores amadores, é preciso improvisar. E queria seguir o roteiro". O personagem ganhou a pele de Germán, ator de teatro independente na Argentina. Já a melhor opção para Jacinta estava sob seu nariz. "Fiz testes no Paraguai, em hospitais e escolas. A Hebe Duarte era assistente de casting e percebemos que, fisicamente, ela era a pessoa ideal para o papel. Revelou-se uma atriz incrível", detalha ele, agora envolvido no projeto "Monobloco", sobre pessoas que vivem em prédios iguais em La Boca, Buenos Aires "Tem a ver com as minhas sensações de infância".


(*) O repórter viajou a convite do Festival Internacional de Curitiba.

© Copyright 2024Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por
Distribuido por