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Quem tem menos de 40 anos de idade certamente sabe quem é Pedro Bandeira. Desde os anos 80, milhões de crianças e adolescentes leem suas obras – são mais de 80 títulos escritos e 30 milhões de livros vendidos. Agora, esse escritor paulista de 72 anos surpreende os leitores com mais um título da bem-sucedida série Os Karas, iniciada em 1984 com “A Droga da Obediência”. Todos poderão saber mais sobre passado e futuro da turminha do Colégio Elite em “A Droga da Amizade” (Moderna).
Confira uma entrevista com o escritor que fará o lançamento da obra na sexta-feira (26), às 19h, na Livraria Saraiva do Diamond Mall.
Vi que "A Droga da Amizade" nasceu dos pedidos dos fãs. Quando o sr. tomou a decisão de voltar com Os Karas?
Toda a sequência de “A droga da obediência” acabou acontecendo por causa da insistência dos leitores. Quando lancei esta aventura, em 1984, não intentava aproveitar seus personagens em novos enredos. Mas o sucesso do livro foi tão grande, tantas cartas passaram a pedir a volta daquela turminha em outras estripulias, que conclui serem eles ótimos veículos para que eu discutisse com os jovens certos assuntos que julgava relevantes, como a defesa da natureza, em “Pântano de Sangue”, como o Holocausto, o nazismo e o racismo, em “Anjo da Morte”, como as doenças sexualmente transmissíveis e a exploração da saúde, em “A droga do Amor”, e como as relações internacionais e a situação de dependência de nosso País, em “Droga de Americana”. Para abordar temas como estes, de modo metafórico e exagerado (é claro!), por que criar outros protagonistas, se eu já tinha Os Karas e meus leitores gostavam deles? Mas, no caso da aventura que agora estou lançando, que dificuldade! Passei cerca de dez anos escrevendo, jogando fora, reescrevendo, mudando de rumo, desesperando-me, desistindo, retomando e... e agora a coisa ficou pronta. Ufa! Espero que o pessoal goste...
Além de trabalhar as lembranças dos personagens como estratégia narrativa, o que há em "A Droga da Amizade" que não está presente nos livros anteriores da série?
Houve um lapso de 14 anos entre “Droga de Americana” e este lançamento, e houve outro de 30 anos entre ele e “A droga da obediência”. Assim, se meus personagens teriam uns 14 anos no primeiro livro, estariam com bem mais de 40 hoje, não? E que tal atender à curiosidade de meus leitores-correspondentes e dar-lhes respostas sobre “o que eles se tornaram quando adultos?”, “quem casou com quem?”, “como Miguel originalmente reuniu a turma?”, “como foram criados os famosos códigos secretos?” e mais maluquices como estas?
O sr. pensou no adolescente do século 21 para escrever o novo livro ou agiu como se o leitor fosse o mesmo da série nos anos 80 e 90? O sr ainda costuma produzir livros para esse público?
Pensei no adolescente eterno, o de qualquer época, quer ele seja do século XV, XXI ou XXX, pois o ser humano não muda: em qualquer época ele sentirá amor, raiva, desespero, ciúme, cobiça, inveja, chorará, gargalhará e terá medo do escuro. Por que Shakespeare agrada ainda hoje, embora suas peças tenham sido escritas há mais de 400 anos? Porque ele tratou das emoções humanas, não do ser humano “do seu tempo”. Para Shakespeare, o ser humano é eterno. Para mim também. Creio que seja por isso que livros meus que já têm mais de 30 anos, agradam atualmente ainda mais do que por ocasião de seu lançamento: você acredita que há até pessoas que leram mais de quatro vezes “A Marca de uma Lágrima”?
Como é escrever para adolescentes? É importante que o autor se preocupe com as características desse grupo ao desenvolver um livro? Como o sr se informa sobre esse público-alvo?
Quando um artista decide dedicar-se a um certo grupo etário, ele deve procurar entender a especificidade psicológica, sociológica e emocional dessas pessoas. Se eu escrevo para crianças, e em meu enredo há um casal de coelhos com seus filhos, tenho de saber que meu pequeno leitor entenderá esse casal como metáfora de seus próprios pais e os coelhinhos como ele e seus irmãos. O mesmo ocorre com outras faixas etárias. Minha formação foi Literatura, História e Sociologia; eu não havia estudado nada de Pedagogia ou de Psicologia. No entanto, aos 40 anos, quando decidi dedicar-me a produzir sonhos para faixas etárias desde a primeira cartilha até a primeira barba ou o primeiro salto alto, passei a estudar essas duas ciências. Acabei por especializar-me em Psicologia do desenvolvimento humano e dou conferências sobre o assunto por todo o Brasil para professores do Ensino Fundamental.
Por que Os Karas fizeram tanto sucesso? A série agrada aos adolescentes do século 21?
Creio que o seu sucesso vem da identificação de meus leitores com esses personagens. Eles se veem espelhados nos Karas, com sua luta pela justiça, pela liberdade, pela defesa do mais fraco, pelo que é certo. Aristóteles falou-nos da catarse como um dos principais efeitos da arte e acho que é isso que todos procuramos na Literatura: sentir como se efetivamente estivéssemos vivendo as emoções das personagens, como se fossemos os protagonistas de cada enredo. Quando uma criança pequena treme de medo no colo da mãe que lhe conta a história de “João e Maria” por causa da situação horrorosa de os irmãozinhos serem abandonados na floresta pelos próprios pais, ela exorciza dentro de si mesma o medo de ser abandonada por sua mãe, por seu pai, e amadurece emocionalmente com essa catarse. Meus leitores sabem que não passarão pelos incríveis perigos enfrentados pelos Karas nas aventuras que criei, mas alimentam-se dos finais felizes ao verem o bem triunfar, como se, ao torcer pela vitória dos Karas, eles mesmos tivessem vencido.
Na orelha de "A Droga da Amizade", Marisa Majolo conta que "A Droga da Obediência" fazia uma referência à ditadura. A crítica social é uma preocupação sua?
Cada livro com os Karas procura apresentar ao adolescente algum aspecto importante da vida que ele logo terá de enfrentar ao tornar-se adulto. Em “A Droga da Obediência”, a metáfora foi minha própria exorcização do que eu havia sofrido com a censura ao cinema, ao teatro e ao jornalismo durante toda minha vida de jovem adulto, pois fui ator de teatro e jornalista durante todo o período da ditadura militar. Ela começou quando eu tinha 22 anos e murchou quando eu já tinha 43, isto é, por todo o meu período de jovem adulto. A droga da obediência é a droga da censura, do “cala a boca”, do “não pense”, da fogueira aos “hereges” que ousavam sonhar com um Brasil livre e produtivo. Felizmente, desde 1985 meu País procura construir-se de modo livre, sem autoritarismo. Mas, para que ele não volte, é preciso que nossos jovens estejam preparados para agir, para votar bem.