Por trás das câmeras:‘Hollywood’ recria os bastidores da meca do cinema nos anos 40 e 50

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
02/05/2020 às 17:18.
Atualizado em 27/10/2021 às 03:25
 (Netflix/divulgação)

(Netflix/divulgação)

Criador de séries premiadas e de grande audiência como “Nip/Tuck”, “Glee” e “American Crime Story”, Ryan Murphy promove em “Hollywood”, a sua mais nova produção, já disponível na Netflix, uma recriação fantasiosa da história da meca do cinema, reescrevendo, com tintas politicamente corretas, a trajetória e o envolvimento de grupos marginalizados na sociedade.

Estamos falando do final da década de 1940, época de ouro do chamado star system, em que os grandes estúdios controlavam rigidamente o destino de seus astros. Mas talvez Murphy mire o momento atual, em que, 80 anos depois, a discussão sobre a sub-representação de mulheres e minorias é um dos temas, a partir de cerimônias como o Oscar e de movimentos como o #MeToo.

Na série, um grupo de jovens chega à “terra dos sonhos” na expectativa de trabalhar com cinema. São rapazes do interior, descendentes de imigrantes, negros e homossexuais em sua maioria. O primeiro – com destaque para Jack (David Corenswet, que lembra muito o “Superman” Henry Cavill) – e o segundo capítulos acompanham o início da jornada deles neste sórdido e preconceituoso universo.

À medida que a narrativa avança (a temporada tem sete episódios), porém, Murphy lança luz sobre outros personagens, especialmente a ala mais veterana do estúdio Ace, onde um inovador longa-metragem, “Peg”, tenta ser viabilizado, atentando-se contra a moral “wasp” (acrônimo em inglês de branco, anglo-saxão e protestante) e o Código Hays, que estipulava quais conteúdos poderiam ser abordados.

O código realmente existiu, entre 1922 e 1945, assim como outras referências elencadas nos episódios, especialmente nomes de atores e diretores. Entre os fatos reais que a série usa como forro documental para o desenvolvimento de personagens fictícios estão as festas de arromba realizadas na casa do cineasta George Cukor (“Minha Bela Dama”, “Adorável Pecadora”), homossexual assumido.

 Homossexual proibido de ‘sair do armário’ é destaque na trama

É neste ambiente de prazeres secretos que circulam, entre outros, Noel Coward, Vivien Leigh e Talulah Bankhead. Vivien cita, por exemplo, os bastidores de “...E o Vento Levou” e as traições ao marido Laurence Olivier. O nome de maior destaque na trama é Rock Hudson, com muitos elementos de sua trajetória romanceados em prol de uma fantasia romântica ao melhor estilo de Hollywood (título de um dos capítulos).

Hudson, que protagonizaria comédias de sucesso ao lado de Doris Day, teve mesmo um agente chamado Henry Wilson (outro personagem importante em “Hollywood”, vivido por Jim Parsons, o Sheldon de “Big Bang Theory”) e, num dos seus primeiros filmes, refez nada menos do que 38 vezes uma cena em que só exibia uma fala - mas não foi em “Peg”, e sim em “Sangue, Suor e Lágrimas”.

“Peg” também é fruto de ficção. Em sua filmografia, há uma comédia intitulada “Peggy” (1950), sem nenhuma relação com que o vemos na série. A Peg de “Hollywood” se refere a uma história real, da atriz Peg Entwistle, que se suicidou pulando do famoso letreiro da capital do cinema, em 1932. O caso é usado por Murphy como um retrato da pressão que os produtores exerciam sobre os contratados.

A influência dos estúdios vitimou vários atores, como Judy Garland (mostrada recentemente em “Judy - Muito Além do Arco-Íris”) e Rock Hudson, que nunca pôde assumir a orientação sexual, embora fosse notório entre os colegas de tela que era gay. Um símbolo de perseguição que a série reverte para ilustrar, de maneira emocionante, um sonho oculto e real dentro da propagandeada terra dos sonhos.
 

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