(Samuel Costa)
A arte contemporânea ganha a partir do dia 6 de setembro novos abrigos. Em Inhotim, os artistas Lygia Pape, Carlos Garaicoa, Cristina Iglesias e Tunga ocuparão galerias do museu ora com exposições permanentes, ora com mostras de longa estadia.
Se a consagração desses nomes fez-se ao longo de uma extensa (e intensa) jornada, agora a trupe assina com altivez cada um dos espaços que ocupa. E surpreende. Das muitas referências que o quarteto compartilha – como os acasos da contemporaneidade – há a inquietude amparada pela natureza.
Se de um lado, Lygia Pape refaz os passos (e teias) de uma aranha, Garaicoa mostra a força do fogo ruindo templos e representações de poder. Se Tunga passeia seu olhar sobre o sonho e a morte, do outro estão os muitos labirintos de Cristina Iglesias.
Fato é que é a natureza que se sobrepõe em todos os diálogos criados (ou reinventados), articulando todas as faces - de artista, obra e público.
Sonhos
"Quero recriar algo originário, representar a reminiscência de um sonho que se esvai ou se concretiza. As obras neste espaço são uma conjunção de ideias, momentos e reflexões. Uma mostra que busca provocar um estado de percepção", explica Tunga descrevendo o próprio trabalho.
Mas que estado seria? "A arte e o jardim são enriquecedores, e acredito que a floresta, tal como está, é a expressão mais alta de uma cultura. Mas o estado de percepção a que o público irá chegar somente será estabelecido quando ele estiver aqui e experimentar", diz o artista.
Para receber o trabalho de Tunga foram abertas paredes de vidro em um espaço com cerca de 2.600 m². Assim, o público pode ver as obras também do lado de fora da galeria. O local foi ocupado com oito grandes instalações e esculturas – um retrospecto dos 30 anos de sua produção artística.
Dentre as obras estão "Lézart" (1989), "Palíndromo Incesto" (1990–1992), o filme-instalação "Ão" (1980) – obra matricial na sua carreira – e outra até então nunca apresentada no Brasil: "À la Lumière des deux mondes" (2005), criada originalmente no Museu do Louvre.
Inox
Da espanhola Cristina Iglesias, o público ganha a exposição "Vegetation Room Inhotim". A partir de aço inox, bronze e outros materiais, a artista criou um meticuloso labirinto – um dos discursos escultóricos mais marcantes do nosso tempo.
A partir de claros elementos do Barroco, Cristina manipula a escultura e conduz o visitante a defrontar-se com uma arquitetura espelhada que dialoga com a água, a luz natural e os baixos relevos vegetais que cercam a obra. As mostras de Tunga e Iglesias serão permanentes em Inhotim.
Garaicoa e Lygia Pape também em destaque
Um privilégio que, infelizmente, não atende ao trabalho de Carlos Garaicoa. Para ele, o diretor artístico de Inhotim, Jochen Volz, reservou um espaço de ocupação de aproximados três anos. A razão é simples: a instalação do artista depende exclusivamente da queima de velas que reproduzem vários edifícios que conhecemos muito bem: o Vaticano, o Pentágono ou ainda a Torre Eiffel.
Ao todo são 300 velas em que se reproduzem 44 modelos diferentes. O trabalho do artista foi adaptado especialmente para Inhotim. E, como as velas queimam e acabam, o museu precisou lançar mão da sua própria fábrica. Pequena, é verdade, mas Volz calcula que ao menos uma vez por mês toda a obra precisará ser remontada.
Teia
Uma preocupação que não acomete o trabalho de Lygia Pape (1927-2004). A instalação "Ttéia nº 1 C" de 2002 (que, ao contrário, será permanente), conta com cinco quilômetros de fios de tecidos que por muito pouco não se assemelham ao ouro.
O trabalho foi criado em 2002, mas exibido pela primeira vez somente em 2005. "O prédio que envolve a obra possui uma certa distorção em sua estrutura, o que permite ao visitante, uma vez frente ao trabalho, perder a capacidade de orientação diante da obra", conta Volz. Uma informação curiosa: "Ttéia" é uma homenagem da artista a uma velha hóspede de seu ateliê: uma aranha, que teimava tecer seus fios sobre a mente criadora de uma das mais importantes artistas do neoconcretismo brasileiro.