Val Prochnow lança primeiro livro

Thiago Pereira
talberto@hojeemdia.com.br
11/08/2017 às 17:35.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:02
 (Bianca de Sá/divulgação)

(Bianca de Sá/divulgação)

A primeiro ponto que orienta a cartografia deste “Inventário de Mulheres Possíveis”, livro de estreia da mineira Val Prochnow é seu (lindo) título. Diante da urgente centralidade que as questões do universo feminino ganham atualmente, a obra ganha, de saída uma entonação, ou como a autora diz, “mais uma voz, que soma a outras vozes, a outros textos feitos por mulheres”.

Assim, as figuras femininas nascidas deste arquivo perceptivo-afetivo evocam e reverberam modos de sentir, pensar e agir. “A ideia de uma coleção de tipos femininos se tornou bastante clara quando comecei o processo de feitura dos textos, mas não gostei da ideia de ‘colecionar mulheres’ por essa questão de objetificação mesmo, tão comumemente disseminada de que somos peças colecionáveis. É aí que entra o termo inventário, ele me salva”, diz Prochnow.

Lançado na última semana, o livro nasceu de um método de escrita– ou da busca rigorosa de um. “Escrevo todos os dias e quase nunca finalizava um texto. Eles ficavam–e ainda ficam– meio perdidos em cadernos e anotações. Iam existindo em formatos inacabados enquanto a urgência de acabar ‘coisas com prazos’das atividades corriqueiras acabavam ganhando mais espaço e tempo”.

Método

Uma caixa apareceu como repositório ideal para os dilemas. “A cada dia, tinha uma única obrigação com ela, que era depositar no rasgo da tampa um trecho, texto, uma anotação qualquer que tivesse me impulsionado a ponto de me fazer parar e escrever sobre o assunto”.

Instaurou-se uma nova rotina para tal ‘desorientação’ da escritora, e passada a primeira semana de trabalho, surgiram aquilo que os gregos chamavam de musas, fonte de inspirações poéticas. “Percebi que todas as anotações traziam a mulher de alguma foram. Lembro-me de uma, que registrei debaixo do Viaduto Santa Tereza: a moça passa na calçada e já é passado. O chão, este, jamais o mesmo. Passeia no passeio e é livre. Acho que tem um filho. Jamais saberei seu nome”, revela, em um gesto que poderia ser notado como um flanêurismo do feminino.

Depois de um tempo de decantação, ela abriu o objeto e ...surpresa! Um universo se reuniu ali. “Me reencontrei com toda essa diversidade de tipos, gestos, frases soltas coletadas. Foi a partir desses pequenos fragmentos que os textos começaram a ganhar forma. Nesse tempo, outras mulheres apareceram, alguns registros me lembraram mulheres que conheço, outras ganharam outros corpos, uns trechos se emendaram a outros para compor cada uma delas”, enumera. E assim fez-se o inventário, que foi guia mestra para a tessitura de sua estreia.

Imagem e palavra contornam o imaginário do inventário de mulheres

A equipe de produção do livro também pode ser notada como um inventário feminino: editora, ilustradora, revisora, artista gráfica, comunicação, fotografia, todas as pessoas envolvidas na obra são mulheres.

Dentro de todo o processo, vale destacar os desenhos de Julia Panadés, artista que possui assinatura marcante– e que foi além da ilustração neste processo. “Ela entrou tanto e tão profundamente no projeto, que passamos a fazer encontros para falar dos textos. Líamos em voz alta, entrávamos no estado de cada uma das mulheres. Foi muito natural que a gente passasse a editar o que estava ali. Sempre juntas –num trabalho presencial muito intenso e mágico em tempos digitais, passamos a trabalhar palavra a palavra” revela Prochnow.

Nesta direção, o caminho estético tomado por Panadés– imagens que trariam elementos dos reinos humano e vegetal– contorna outros imaginários, complementares à escrita da autora, produções arterialmente conectadas. “Os desenhos são narrativas que ganham uma vida bastante própria. Desde o começo eu tinha muito certo de que não queria que o livro fosse ilustrado. Não queria dar rosto nem forma para essas mulheres, senão indícios”, diz. “Chegar nas plantas e no reino vegetal foi maravilhoso. São desenhos muito femininos, não só por saírem da ‘mulher que desenha’, mas porque são carregados de dobras, texturas, formas explícitas que denunciam um tempo de passagem.” (TP)

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