(Flávio Tavares)
O período de chuvas na região Sudeste já chegou e com ele surgem as preocupações com riscos de deslizamentos de encostas, o que causa acidentes graves e com mortes. O professor da Faculdade de Geologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e pesquisador, Francisco Dourado, disse que as chuvas começam a ficar mais frequentes a partir de setembro, mas vão se intensificando e a interferência no solo é maior próximo ao fim do verão, época em que há acúmulo de água de todo o período. Aí, a possibilidade de deslizamentos aumenta. O único período em que os riscos são quase inexistentes é entre maio e agosto, considerado mais seco.
“A gente vê uma concentração mais para o fim do verão, porque vem de meses e meses de chuva e tem acúmulo de água no solo, cada vez mais saturado. Quando acontece uma pancada no fim do verão é quando ocorrem os piores problemas, já dizia Tom Jobim, “são as águas de março fechando o verão”, contou, em entrevista à Agência Brasil.
Para o professor, a redução de desastres e de risco, de uma maneira geral, é um ciclo. Começa com uma preparação e prevenção, depois uma atuação durante um desastre que possa ocorrer, seguida da fase de recuperação. Acabada a recuperação deve voltar para a fase de prevenção. O problema é que, segundo ele, historicamente, no Brasil, a preocupação costuma ocorrer durante o desastre e nas obras depois dos desastres.
“A parte de prevenção é pouco trabalhada. A gente investe muito dinheiro no pós, no depois do que aconteceu e pouco na prevenção”, disse acrescentando, no entanto, que depois da tragédia que ocorreu Região Serrana do Rio em 2011, “os governos federal, estadual e municipal se viraram para a temática de prevenção, mas não no nível desejável.”
Pouco investimento
Apesar da adoção de medidas para evitar os desastres ter melhorado, isso ainda não chegou ao nível adequado. “Na comparação com anos atrás, a gente está um pouco melhor, mas ainda muito aquém do que deveria. Se investe muito pouco no mapeamento das áreas de risco e das áreas de susceptibilidades. Esses mapas têm funções diferentes.
O mapa de risco mostra onde tem a maior chance de perdas, então, é mais de atuação direta. O de suscetibilidades indica as áreas mais propensas aos movimentos de massa, inundação, ou seja qual for o processo, que a gente esteja trabalhando, então, serve mais como planejamento. Vejo que falta fazer muito para se chegar a uma situação mínima aceitável”, assegurou.
“Às vezes, a gente acorda com um grande evento. As pessoas ficam emocionadas com as mortes, mas passou o momento inicial, é vida que segue e aí não há preocupação em se preparar para os anos seguintes”, afirmou.
Na visão do professor, falta ao Brasil a cultura de preparação de risco, que existe em outros países como o Japão e alguns países da Europa. “Planta no verão para ter comida no inverno. Aqui, a gente tem um lugar abundante, tem comida o tempo todo, tem água o tempo todo, mas não se trabalha com a questão da preparação. Isso é um exemplo que reverbera para outras áreas e termina caindo na redução de riscos de desastres”, garantiu.
Ocupação desordenada
Francisco Dourado afirmou, também, que a construção irregular é parte do problema. Na visão do pesquisador, o movimento de massa, termo usado para deslizamentos e inundações de solo, e a ocupação desordenada sempre vão andar juntos, porque a primeira alteração que se verifica no local é a canalização precária de água, e isso acaba provocando a concentração, resultando na retenção da água.
O professor que trabalha com modelagem matemática, além da elaboração de mapas para identificar as áreas mais ou menos suscetíveis, disse que a entrada do fator humano sai do controle de qualquer modelo.
Estrada das Paineiras ainda afetada por deslizamentos de terra das chuvas que atingiram o Rio de Janeiro na semana passada e prejudicam o acesso ao Cristo Redentor e Parque Nacional da Tijuca.
“Qualquer lugar onde tem rompimento da drenagem a água vai acumular ali e quando se acumula muita água no fundo está potencializando um movimento de massa naquele lugar e o problema está formado”, afirmou, destacando três tipos de processos perigosos.
“Tem o das encostas, há os elementos expostos que são as pessoas e tem o gatilho, o fator detonador que é a concentração de água em um ponto. É uma bomba relógio, que infelizmente a gente vê praticamente em todas as ocupações irregulares”, alertou.
Segundo ele, a retirada de pessoas dos locais de risco enfrenta questões diferentes, porque infelizmente é comum se tirar uma família de uma área de risco, levar para uma outra área e ela voltar. Nesse caso, o pesquisador avaliou que as responsabilidades precisam ser compartilhadas pelos gestores, governador e prefeito, mas também pela própria população.
“É preciso mostrar que ela também tem essa responsabilidade, uma coisa compartilhada. Quando exponho a minha família e meus filhos a uma situação de risco, óbvio que há casos e casos e precisa analisar, sempre vai ser uma responsabilidade. Os governos também têm responsabilidade de não permitir que essas pessoas fiquem em áreas de risco. É um problema social e político”, observou. Em algumas áreas de risco há famílias que apontam questões econômicas para a permanência nesses locais.
Para o professor, o que menos pesa nessa questão é o problema geológico, que entende ser relativamente simples e pode ser resolvido com a elaboração de mapas de identificação das áreas de risco. “A gente mapeia e vê onde cai, onde não cai, onde não inunda, só que por trás tem problema social e político de difícil solução”, completou.
Áreas complicadas
Para ele, todas as áreas assentadas nos morros são complicadas e isso significa uma preocupação maior no Rio de Janeiro. No entanto, na região metropolitana e no interior há muita área sensível.
No caso da capital, como a densidade é maior com mais pessoas agrupadas, elas acabam sendo priorizadas, mas o interior já registra um aumento no êxodo de pessoas que vão para lá em busca de melhor situação financeira ou por segurança.
“Esse problema está indo para lá também. A ocupação irregular está aumentando no interior. Junto com isso está levando um problema de segurança pública obviamente e o problema de segurança geológica em relação aos movimentos de massa e de inundação”, disse.
Alerta
A Secretaria de Estado de Defesa Civil do Rio de Janeiro (Sedec-RJ) mantém um serviço de alerta de desastres naturais por meio de envio de SMS. O cadastro é gratuito e para receber as mensagens a pessoa interessada deve apenas enviar o CEP (Código de Endereçamento Postal) da sua localidade para o número 40199. Se quiser mais informações pode consultar o site.
Cuidados
A secretaria orienta que, em caso de deslizamentos, se a pessoa tiver que sair de casa, que desligue o gás e os disjuntores de energia elétrica. Deve avaliar também se a casa apresenta rachaduras, se as portas abrem e fecham com a mesma facilidade de antes, se há estufamento nos muros ou rachaduras no solo e se há água minando no pé da encosta. “Caso constate essas alterações, entre em contato com a Defesa Civil Municipal (Tel: 199), informe as mudanças verificadas e atenda às orientações”.
A secretaria também informou que, em caso de previsão de chuva forte, a população precisa tirar das ruas os sacos de lixo, que ainda aguardam recolhimento pela companhia de limpeza urbana. Se residir em área suscetível a deslizamentos e inundações, deve-se verificar a existência de uma rota de fuga para local seguro e ficar atenta aos alertas feitos por SMS e aos toques de sirenes. Outra sugestão é que prepare um kit com a sua documentação, medicamentos controlados, material de higiene e limpeza básico e uma muda de roupas para o caso de ter que sair de casa.
Manter a calma
Uma outra orientação da Defesa Civil é não ter pressa para voltar para casa e se manter em local seguro. “Quando ocorrem chuvas fortes, as pessoas se apressam para chegar em casa e acabam por ignorar os riscos que enfrentarão no trajeto. Nossa sugestão é para que as pessoas não tenham pressa. Caso estejam em local seguro, permaneçam até que a chuva e as consequências dela estejam sob controle”, opinou.
Já em casos de inundações o recomendado é procurar um lugar seguro, plano e que fique a um nível elevado do solo. “As pessoas não devem atravessar áreas alagadas ou inundadas a pé, pois há risco de choque, queda em buracos ou bueiros abertos, além da possibilidade de se contrair doenças. Caso esteja de carro, verifique se a água ultrapassa 1/4 do pneu, pois acima deste nível há elevado risco de o carro perder a dirigibilidade e ser conduzido pela correnteza”, apontou.
Se houver ventos fortes, o melhor é se manter abrigado em local de estrutura firme, como casas e estabelecimentos comerciais. No caso de falta de luz, todos os equipamentos elétricos possíveis devem ser desligados. “Opte por lanternas, e não por velas, mas caso a substituição não seja possível, mantenha a vela em um suporte com água e apague-a antes de dormir”, finalizou