(Ricardo Bastos/Hoje em Dia)
Internacional, Grêmio, Coritiba e Juventude. O currículo do centroavante Carlos Henrique é de invejar muito jogador. Nascido na pequena cidade de Sorrisos, no Mato Grosso, ele já passou por importantes clubes do futebol brasileiro. Contratado pelo Figueirense há três meses, veste sua sétima camisa diferente. A história deste atacante de 19 anos e 1,82m de altura não é diferente de boa parte dos jovens que sonham em brilhar no mundo da bola. A incessante busca por uma vaga atrapalha a formação de uma base mais sólida, que poderia contribuir para a renovação do futebol brasileiro, tão cobrada principalmente após o fracasso na Copa. “Quero chegar ao profissional, ser reconhecido pelo meu futebol, vestir a camisa da Seleção Brasileira e depois jogar na Europa”, resume Carlos Henrique, ainda tímido na hora da entrevista. Ele é um dos 700 jovens que estão em Belo Horizonte para a disputa da Taça BH de Futebol Júnior, que entra na fase decisiva. Mais do que levantar o caneco em 30 de agosto, estes meninos sonham com uma oportunidade de acertar com algum clube do futebol nacional ou mesmo do exterior. “Encaro essa mudança de clubes como um trampolim para eu poder chegar onde sonho. Em cada equipe eu sempre aprendo algo e vou amadurecendo, como jogador e pessoa. Já trabalhei com várias treinadores e filosofias diferentes. É um aprendizado a cada dia”, afirma o camisa 9. Até “desembarcar” na equipe catarinense, Carlos Henrique passou por Brasil Central (Mato Grosso), Grêmio, Internacional, Juventude e Veranópolis (todos do Rio Grande do Sul) e Coritiba (Paraná). No Veranópolis e Juventude, chegou a fazer parte do elenco profissional. “Quando achei que minha carreira já estava engatilhada, não tive outras propostas e fui obrigado a voltar para a base”, diz. Início História semelhante vive o brasiliense Brayan José, de 19 anos. Em busca do seu lugar dentro das quatro linhas, ele deu os primeiros chutes em escolinhas de futebol do Distrito Federal. Em seguida, com apenas 15 anos, foi para o Fluminense, do Rio de Janeiro, depois Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, e acaba de acertar um contrato com o Brasília Futebol Clube, uma das 28 equipes que participam da Taça BH. “Nasci em uma cidade que não tem muita tradição no futebol. Não tive outra saída a não ser buscar meu caminho em outro lugar. Curiosamente, acabei voltando para Brasília, pois foi onde eu consegui esta oportunidade”, explica o atacante. Toda a família mobilizada pelo projeto “Nossa casa é onde ele estiver jogando”, brinca a consultora de beleza Edileuza Cristina Souza Vançan, de 40 anos, mãe do lateral-esquerdo Daniel Vançan, de 17, que mora de aluguel em Belo Horizonte. Ela e o marido venderam uma confortável casa no interior do Paraná. O casal investiu o dinheiro em uma carreta, dirigida pelo marido de Edileuza. Fazendo fretes, eles ficam de cidade em cidade acompanhando de perto a carreira do futuro craque. “Não me arrependo de nada. Faria tudo de novo”, diz Edileuza. Os primeiros frutos começam a ser colhidos. Daniel acaba de assinar um contrato de três anos com o Cruzeiro. Antes de chegar em BH, a família Vançan passou por Maringá, no Paraná, onde Daniel começou, na escolinha do São Caetano. Depois por Santos, quando ele defendeu o Peixe, e Porto Feliz, também no interior paulista, época em que o jogador vestiu a camisa do Desportivo Brasil. “Já recomeçamos nossa vida várias vezes. Vamos com a cara e a coragem”, diz Edileuza. Ela morou de favor em Santos e trabalhou em uma casa de família para levar adiante o sonho do filho caçula. A estudante Bruna Regina, de 17 anos, noiva de Daniel, também veio pra BH. “Ter essas pessoas queridas ao meu lado é fundamental. Me ajuda muito, como foi num momento difícil, quando uma contusão me deixou quatro meses parado, sem por os pés no chão”, diz o lateral. Enquanto alguns jogadores gostam da mudança constante de clubes, outros tentam contratos mais longos em busca de experiência. É o caso do atacante do Atlético Luiz Guilherme, de 18 anos. “Acho que quando você passa mais tempo numa mesma equipe, você acaba aprendendo mais. Mas nem sempre é assim que acontece. Eu dei sorte. Comecei no Marília, da minha cidade natal, e logo em seguida consegui um contrato de três anos com o Atlético”, comemora. Ele mostra no celular a foto do armador Bernard, revelado na Cidade do Galo. “Ele é um exemplo para todos nós que estamos aqui no mesmo lugar em que ele estava até bem pouco tempo”. Mudanças também prejudicam a educação Debaixo de sol forte, um torcedor ilustre passa quase despercebido em muitas partidas da Taça BH de Futebol Júnior. Poucos o reconhecem. Mas, com toda certeza, qualquer um dos 700 jovens que disputam a competição sonham com um currículo como o dele. Aposentado aos 34 anos, Geovanni, que começou a carreira no Cruzeiro, passou pelo América e jogou também no Barcelona e Manchester City, na Europa, se dedica à carreira de empresário. Nascido em Acaiaca, no interior de Minas Gerais, ele foi trazido ao Cruzeiro por um amigo. “Vendo estes meninos aqui fico lembrando do meu início de carreira. Não é fácil. Sei o que eles passam, mas acho que hoje é até mais fácil, pelo grande número de competições de base que existem para você mostrar seu futebol”, diz Geovanni. “Eu não tive que mudar tanto de clube assim, mas isso é bastante normal”, completa Giovanni. Para a psicopedagoga, Jane Patrícia Hadad, que atende alguns jogadores da base, essa constante mudança de cidade é prejudicial em vários aspectos. “Tenho um paciente muito jovem, que já mudou de cidade quatro vezes. Isso atrapalha na formação da pessoa, porque todos ainda são muito jovens. E temos que tomar um cuidado grande, pois é um sonho meio ilusório”, explica Jane. “Além disso, é prejudicial na educação também, porque cada hora a pessoa está em uma escola diferente”, completa e psicopedagoga. Para ela, o ideal é que o jovem tenha um acompanhamento psicológico, como acontece em grandes clubes.