Em sua última Euro, CR7 vive momento de instabilidade emocional
CR7 encara os franceses nas quartas da Eurocopa (Diogo Pinto - FPF)
Nesta sexta-feira (5) Portugal e França jogam no Volksparkstadion, em Hamburgo, pelas quartas de final da Eurocopa 2024. Este confronto é uma reedição da final de 2016, vencida pelos Lusitanos. O desempenho de Ronaldo será observado de perto, tentando deixar para trás o desequilíbrio emocional da última partida.
Na ocasião, a seleção Rubro-Verde enfrentou dificuldades nas oitavas de final contra a Eslovênia. Portugal não conseguiu marcar no tempo regulamentar. Na prorrogação, Cristiano Ronaldo teve a oportunidade de garantir a classificação em um pênalti crucial, mas foi frustrado pela defesa do goleiro Oblak, levando-o às lágrimas. Portugal avançou nos pênaltis após Diogo Costa defender três pênaltis em sequência, garantindo a vaga para a próxima fase.
Apesar da classificação, Cristiano Ronaldo, muitas vezes visto como inspiração quando se trata de um pensamento vencedor, vive um momento conturbado na questão emocional.
Esse não é o primeiro episódio de descontrole do atleta. No Manchester United, na derrota do Manchester United por 1 a 0 para o Everton, em abril de 2022, ele deu um tapa no celular de um torcedor, derrubando o objeto no chão. Mais recentemente, no Al-Nassr, ele respondeu torcedores do Al-Shabab que gritavam o nome de Messi. Depois de marcar um gol de pênalti, o atacante colocou as mãos nos ouvidos e fez um gesto obsceno tocando suas partes íntimas.
Mas ele não é o único que já passou por momentos de desequilíbrios em termos psicológicos. Na Copa de 2022, disputada no Catar, por exemplo, após a eliminação para a Croácia, nos pênaltis, alguns jogadores brasileiros desabafaram nas redes sociais. O atacante Richarlison, na época, publicou no Instagram: “Ontem ainda não passou, foi impossível dormir e o que aconteceu ainda doi”. Neymar, principal referência técnica da seleção, escreveu: “Estou destruído psicologicamente, essa com certeza foi a derrota que mais me doeu”.
E no futebol, a saúde mental dos jogadores tem sido um tema cada vez mais discutido e tratado como fundamental. Com psicólogos em 13 das 20 equipes da Série A do Brasileirão, a preocupação com a mente dos atletas é evidente. Cuidar da parte emocional tem sido primordial para tornar a equipe mais competitiva e deixá-la mentalmente mais forte.
"Nunca se falou tanto em saúde mental no futebol como atualmente. É um assunto de extrema relevância, com impactos na carreira de qualquer pessoa, em especial na dos atletas. Vimos reflexos de mudanças da geração e também da capacidade de lidar com a frustração nos atuais grupos de jogadores", afirma a Dra. Flávia Magalhães, médica que atua no esporte há mais de 20 anos e que já esteve presente em edições da Copa América e dos Jogos Olímpicos.
Em busca de um melhor desempenho, não somente físico, mas também mental, a Seleção Brasileira, comandada por Dorival Júnior, voltou a levar um psicólogo em uma competição oficial, colocando fim a um hiato de 10 anos. Coube à psicóloga do Bahia, Marisa Lúcia Santiago, contratada em março deste ano pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF), a missão de acompanhar e cuidar da parte mental dos jogadores durante a disputa da Copa América.
Eduardo Cillo, coordenador de psicologia esportiva do Comitê Olímpico do Brasil (COB), explica a importância da retomada desse tipo de profissional na comissão técnica.
"É crucial para atender às necessidades individuais dos atletas e proporcionar suporte para o desenvolvimento do grupo, contribuindo para manter um ambiente favorável. Além disso, é fundamental para compreender as mudanças de comportamento e auxiliar o treinador nas decisões durante a Copa América”, explica.
Em 2024, alguns casos acabaram sendo evidenciados e mostraram a importância da psicologia no esporte. O mais emblemático talvez tenha sido o vivido pelo goleiro Cássio. Em seus últimos jogos pelo Corinthians, onde passou 12 anos e se tornou ídolo da equipe, o jogador ficou no banco de reservas. O goleiro, há um bom tempo, parecia estar insatisfeito não só com seu próprio desempenho, mas também com o fato de ser responsabilizado por tudo de errado que acontecia dentro de campo.
O jogador optou por deixar o clube e seguir para o Cruzeiro. Na coletiva de imprensa que marcou sua despedida do time paulista, Cássio falou como foram esses últimos tempos para ele. “Acho que era pelo momento, os últimos anos foram difíceis. Chega um tempo que as coisas pesam um pouco, tem dias que estressam e eu sou um ser humano como qualquer outro.”
O zagueiro Lyanco, com passagem pelo São Paulo e pelo futebol inglês, usou as redes sociais no mês passado para falar sobre o seu estado mental. Na última temporada, o defensor estava defendendo o Al-Gharafa, do Catar.
“Temporada cheia de desafios. Tanto no clube quanto na vida. Por tudo que passei e estou passando devido à ansiedade, ataques de pânico, tomando remédios todos os dias para poder treinar e jogar com a cabeça mais tranquila e poder dar o meu melhor. Não tenho medo e nem vergonha de falar sobre isso”, desabafou.
Na Seleção Brasileira, o principal astro do momento, Vinícius Júnior, também já passou por um acompanhamento de perto feito por Marisa após ser vítima de ataques racistas. Desde março ela monitora de perto o dia a dia dos atletas e tem sessões para entender como cada um dos jogadores se sente, produzindo relatórios que vão parar nas mãos do técnico Dorival Júnior para que ele possa ter cuidado sobre alguns temas e possíveis incômodos.
“No esporte, não basta apenas treinos físicos e de mobilidade para tornar os atletas excelentes e aptos. O cuidado com a mente também implica diversos benefícios em locais onde a competitividade é alta, como em competições esportivas. É preciso um acompanhamento próximo para que o foco do atleta não se disperse e permaneça saudável”, opina Alex Araújo, CEO da 4Life Prime, uma das maiores empresas de saúde ocupacional do país.
Rosângela Vieira, psicóloga do Sport, complementa: “Já é comprovado que a valência mental é responsável por 70% do comportamento do atleta. Ele precisa conhecer como funciona sua estrutura mental para lidar com as emoções positivas e negativas durante os treinos e jogos. Não adianta cuidar da parte técnica, física, sono e alimentação, se ele não cuida da sua preparação psicológica”, explica.
Nessa linha, o CEO da SAF do Fortaleza, Marcelo Paz, ressalta a importância do trabalho psicológico realizado dentro do clube: “Temos que olhar para os atletas como o ser humano que joga futebol, e que têm seus dramas, suas questões, sua história e seus momentos. Tudo isso afeta o resultado do campo. No Fortaleza, temos um psicólogo integrado à comissão técnica, presente todos os dias junto ao elenco, nas viagens, concentrações e treinamentos. A psicologia se faz muito importante. Os atletas devem treinar o corpo, mas, sobretudo, a mente”, pontua.
A preocupação tem sido tanta com o tema, que os trabalhos e os profissionais já existem até mesmo nas categorias de base, não se restringindo apenas aos profissionais.
Segundo Cristiano Dresch, presidente do Cuiabá, a preocupação com a saúde mental começa desde as categorias de base para que os jovens atletas não se sintam pressionados e estejam confiantes para disputar as partidas de forma competitiva rumo ao elenco profissional.
“O Cuiabá é um clube que valoriza as categorias de base e disponibilizamos psicólogos para que os nossos jovens atletas consigam se desenvolver da maneira ideal dentro e fora das quatro linhas. Sabemos a importância da saúde mental e desejamos que nossos jogadores tenham todo o suporte para que consigam apresentar seu talento com tranquilidade e segurança”, afirma Cristiano.
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