Papo em Dia: Éderson fala sobre boa fase no Cruzeiro, Seleção, sangue indígena e a família

Guilherme Piu e Thiago Prata
25/10/2019 às 15:57.
Atualizado em 05/09/2021 às 22:24
 (MAURICIO VIEIRA)

(MAURICIO VIEIRA)

Marcas na pele mostram que a dor obrigou Éderson a ‘criar casca' logo cedo para superar as dificuldades em seu início de carreira. O corte da Seleção de base às vésperas de um importante torneio, por conta de uma lesão no joelho, doeu no jogador. Mas não tão forte quanto o sofrimento pela saudade, que marcou cicatriz em sua alma pela distância de casa ainda quando garoto. 

Tão intenso esse sentimento que o agora destaque do Cruzeiro, que carrega nas veias o sangue guerreiro de uma linhagem indígena, quase desistiu de tentar a sorte no futebol. Mas após seguir firme e 'combater o bom combate', Ederson trabalha firme para conquistar cada vez mais espaço no clube estrelado.

Nesta entrevista ao Hoje em Dia, ele fala sobre sua trajetória, o momento positivo pelo Cruzeiro, sua origem indígena, a expectativa de voltar à Seleção, entre outros assuntos.

Como vem sendo sua trajetória, desde o momento em que você subiu da base até conquistar a titularidade inquestionável no profissional do Cruzeiro?
Eu vim do Desportivo Brasil no ano passado, por empréstimo, e fiquei em definitivo. Fiz alguns jogos pela base do Cruzeiro. Depois fui para o profissional. Com a chegada do Rogério (Ceni) ganhei uma sequência (de jogos). O Abel continuou me dando oportunidades. Fico muito feliz pela confiança que o Abel vem me passando e pela sequência que tenho tido.

Você esteve sob a tutela de três técnicos do profissional no Cruzeiro: o Mano Menezes, o Rogério Ceni e o Abel Braga. O que cada um deles acrescentou para você?
Fico feliz por ter trabalhado com os três. O Mano me deu algumas oportunidades e foi o cara que me trouxe para o Cruzeiro. O Rogério me deu a sequência que eu tanto esperava e precisava. E o Abel é quem tem me dado mais confiança e tranquilidade para trabalhar. Cada um deles teve um papel importante para mim.MAURICIO VIEIRA

E o pessoal tem endossado o coro do Abel, de querer você na Seleção Brasileira Olímpica e até na principal.
Já servi a Seleção nas categorias sub-17 e sub-20. Na sub-23, houve uma convocação só. É sempre uma honra servir a Seleção. Um lugar onde todo jogador sonha em estar. Tenho esse sonho de ser convocado novamente.

Você acabou ficando fora de uma convocação, por conta de uma lesão. Está com saudades da Seleção? Esse intervalo sem ser chamado para vestir a amarelinha pode te “atrapalhar”?
A Seleção convoca quem está melhor no momento. Acho que tenho feito um bom trabalho no Cruzeiro, mesmo não estando nessas últimas convocações. Estou mostrando meu futebol. Fico na expectativa, agora com essa sequência de bons jogos.

Desde as primeiras convocações, clubes estrangeiros estão te monitorando. Agora no time principal do Cruzeiro, principalmente depois do gol que você fez sobre o Corinthians, seu nome voltou aos holofotes, e já se fala que clubes europeus estão de olho em você. O que você acha disso, de estar no radar de clubes de fora?
Um dia desejo (jogar na Europa). Se chegou alguma coisa, foi para meus empresários, mas ninguém me falou nada. Não tenho com o que me preocupar ou esperar algo de fora. As janelas também estão fechadas. Meu foco é no Cruzeiro. Como todos estão vendo, dou meu máximo nos jogos e nos treinos. Se chegar algo para mim vou pensar e conversar. Mas até agora meu foco é no Cruzeiro.Daniel Vorley/LightPress/Cruzeiro

O Cruzeiro ganhou duas partidas importantíssimas, em cima de São Paulo e Corinthians. E agora enfrenta o Fortaleza, mas você está suspenso. Como será ficar na torcida contra o treinador que te deu a primeira sequência como titular?
Fui assistir o jogo contra o Fluminense, quando não joguei, por conta de um desgaste muscular. Ser torcedor é difícil (risos). Fiquei um pouco agoniado em alguns momentos. Não vai ser diferente para este jogo. Eu queria poder jogar. Mas com certeza estarei lá, torcendo e passando boas energias ao grupo. Não tem nada demais em enfrentar o Rogério. Agora ele está do lado do Fortaleza, e eu estou do lado do Cruzeiro. Espero que ele tenha sucesso na carreira, mas não neste sábado (risos).

Você tem uma tatuagem com uma data no braço direito.
Sim, é da minha avó (data de nascimento dela).

Fala um pouco dessa relação dela com você. E também de sua relação com a família. Estão todos perto ou longe?
Sempre mantenho um contato com minha família. É toda de Campo Grande (MS). Minha família sempre me apoia, desde quando comecei a jogar futebol e fui para escolinha. Essa data (da tatuagem) foi em homenagem à minha vó. Sempre fui muito apegado a ela, desde muito novo. Ela sempre me ajudou, disse para eu nunca desistir. Senti muita falta dela quando saí de casa. Fiz para me sentir um pouco mais perto dela e homenageá-la.MAURICIO VIEIRA

Você tem raízes indígenas, certo?
Sim, minha avó é indígena. A família por parte da minha mãe é indígena. A do meu pai não. 

Então metade do seu sangue é indígena. Você conhece essa sua parte da história?
Conheço sim, até visitei algumas tribos perto da minha cidade. Minha avó tem alguns familiares lá (nessas tribos). Não sou tão conhecedor quanto minha avó, ela fala tudo da língua (da tribo) terena, ela é indígena 100%. Tive curiosidade quando era muito novo em conhecer essa cultura. É muito bacana ver outras culturas.

Existe essa coisa de indígena ter um lado guerreiro. Você leva esse seu lado guerreiro para o campo também, certo?
Sim, exatamente. Sempre dou meu máximo em tudo que faço, sempre joguei para vencer, desde pequeno, com meus amigos. Isso não mudou ao longo dos anos. Esse lado indígena veio para me fortalecer. Só tenho a agradecer, é algo que me deixa com mais disposição.MAURICIO VIEIRA

Relembrando aquele gol que você fez sobre o Corinthians, para quem você o dedicou?
Liguei para minha família depois do jogo. Estava todo mundo emocionado em casa. Conversei com todo mundo. Conversei com minha mãe sobre tudo que a gente passou, as dificuldades que passamos. Dediquei o gol para todo mundo que me apoiou nessa trajetória, minha avó que sempre me pedia um gol, minha namorada que também vinha me pedindo gol... Posso dizer que aquele foi para todos. Ainda não fiz um para cada. Mas os gols vão saindo naturalmente.

Um gol que pegou todo mundo de surpresa. Você chegou a ouvir as narrações de vários lugares depois da partida?
Ouvi a do Samuel (Venâncio, da Itatiaia, com Alberto Rodrigues). E também aquela de São Paulo (Energia 97 FM), em que, creio eu, reunia pessoas corintianas (risos). Não liguei muito para isso, não (a narração dos paulistas). Gostei muito da narração do Samuel, que viralizou. Até brinquei depois como Samuel. Tenho que dar uma camisa a ele depois, que estou devendo (risos).

Da garotada do Cruzeiro, você foi um dos primeiros que fez gol. O Mauricio fez antes de você. Houve alguma aposta entre vocês, de quem faria o gol primeiro?
Teve sim. Se o Maurício fizesse gol primeiro, eu pagaria um churrasco. Se eu fizesse primeiro, ele pagaria um churrasco. Ele fez primeiro, e estou devendo (risos). Estávamos esperando passar um pouco aquela turbulência para ter essa comemoração. Vou pagar o churrasco com a maior felicidade do mundo. Torço muito por ele, que veio do Desportivo Brasil comigo. Eu o vi jogando e vendo sua evolução.MAURICIO VIEIRA

Vocês possuem uma boa relação, assim como com outros garotos, como Gabriel Severo, Rômulo...
Sim, o Maurício veio um pouco depois (para o Cruzeiro). O Rômulo ainda está no sub-20. Viemos todos praticamente juntos do Desportivo Brasil. A gente conheceu o Gabriel Severo. Hoje mesmo almocei na casa dele (referindo-se à quinta-feira passada). Ele sempre apoia a gente. Temos amizade com o (Vinícius) Popó também. Uma amizade com todos que está se firmando cada vez mais.

Individualmente, vocês mais jovens vêm tendo momentos positivos. Como um todo, o Cruzeiro ainda está num momento perigoso, precisando manter uma sequência de vitórias. Queria que nos falasse desse momento do Cruzeiro, como os mais experientes ajudam vocês mais jovens? Como vem sendo o clima do vestiário?
Antes, o clima estava um pouco mais pesado, porque a gente não conseguia ganhar. Mas agora, com essas duas últimas vitórias, o clima ficou um pouco mais tranquilo. A gente jogava bem, mas faltava alguma coisa. Temos que manter agora a sequência de vitórias. Sabemos que essas duas vitórias não vão nos tirar do problema, mas ajudaram. Importante fazer nosso melhor dentro de campo. Grande parte dos jogadores experientes nos ajudam, como Fábio, Thiago Neves, Edilson, Robinho... Eles tentam nos deixar mais tranquilos, falam que a pressão não é sobre a gente e dizem para fazermos nosso jogo para ajudar. Me mantive o mais tranquilo possível para mostrar meu futebol. Eles já estão acostumados a contornar essa pressão. Graças a Deus tenho ajudado, como nos últimos jogos. Fico muito feliz. Olho para trás e vejo que os conselhos deles nos ajudam mesmo.

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