(CPB/DIVULGAÇÃO)
Dono de 24 medalhas em Paralimpíadas e de um sorriso infindável, o nadador Daniel Dias, maior paratleta brasileiro de todos os tempos, parece ainda não acreditar na grandeza de suas recentes conquistas. Só nos Jogos Rio-2016, o paulista, de 28 anos, levou para casa nove medalhas. Foram quatro de ouro, três de prata e duas de bronze.
Na semana em que a seção Papo em Dia completa dois anos, o novo ‘herói’ brasileiro, em entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, fala sobre sua trajetória dentro e fora do esporte. Belo Horizonte e Minas, inclusive, tem capítulo especial na vida do nadador. Foi na capital mineira, em julho de 2005, que Daniel conquistou suas primeiras duas medalhas em competições nacionais. Para ele, o início de tudo. Além disso, viveu boa parte da infância em Camanducaia.
Você acumula 24 medalhas paralímpicas. Já consegue ter a noção exata do que conquistou como atleta?
Muita gente tem me feito esta pergunta. Te confesso que a ficha ainda tem caído aos poucos. Fico extremamente feliz com estas conquistas, de colocar o nome do esporte paralímpico em evidência no Brasil e até mesmo no mundo, e a cada dia que passa tenho a noção do quão grande é este feito. As pessoas se emocionam ao me ver, me dão muito carinho e hoje conhecem mais o esporte.
Na Olimpíada do Rio você ultrapassou o australiano Matthew Cowdrey em número de medalhas. Se tornar o maior nadador paralímpico da história era o seu objetivo antes de os Jogos começarem?
Sempre quis melhorar minhas marcas e nesses Jogos meu objetivo era conquistar pelo menos seis medalhas nas provas individuais. No revezamento queria dar o meu melhor para ajudar o Brasil. Sinceramente, eu nunca visei superar o australiano. Porém, quando soube que havia conseguido, fiquei muito feliz.
Muitas pessoas começaram a te chamar de “Phelps Brasileiro”. Gostou do apelido?
Primeiro, eu sou mais bonito do que ele (risos). Mas, para mim é uma grande honra. Ele é um grande atleta que tem feitos incríveis. Fico extremamente feliz. Por outro lado, sou o Daniel Dias e quero conquistar o meu espaço no esporte paralímpico brasileiro; creio que estou já estou conseguindo.
A Paralimpíada ainda está longe de ter o mesmo destaque na mídia se comparada à Olimpíada. Você acredita que esta disparidade na cobertura um dia acabe e as duas competições tenham o mesmo valor midiático?
Estamos na caminhada para que isso aconteça. Sempre acreditamos que com os Jogos acontecendo em casa, teríamos grandes chances de mostrar o valor do esporte e da pessoa com deficiência. Acredito que realizamos este feito e quebrar esta barreira do preconceito. As pessoas passaram a ver que é sim uma competição de alto rendimento. Foi a grande vitrine para nós que fazemos parte do esporte paralímpico brasileiro. Nunca quisemos competir com o esporte olímpico; só queremos o nosso espaço.
Ao contrário de muitos paratletas, você já nasceu com a deficiência física. Acredita que isso tenha facilitado sua trajetória como desportista? Quando e como começou a nadar?
Entrar no esporte paralímpico hoje é muito mais fácil do que quando eu comecei. Hoje existem associações para deficientes e as pessoas podem procurá-las em suas próprias cidades e iniciar a vida no esporte paralímpico. Há atletas com 16 e 17 anos, idade que comecei a nadar, já competindo em alto nível; é muito bom. Estamos no caminho certo para ter uma renovação no esporte e ter continuidade no trabalho que estamos fazer.
Se não fosse a deficiência física, você acha que teria seguido a vida de esportista?
Não imagino a minha vida sem a deficiência. O esporte me ajudou a entender que sou como qualquer pessoa. Não ter os braços ou a perna não define quem eu sou. Às vezes olhando para mim, até é possível ver a deficiência, mas as pessoas já aprenderam que isso não define quem é quem. Sinceramente não sei qual rumo teria tomado. Comecei a praticar esporte, primeiramente, para mostrar para mim mesmo que, independente de ter a deficiência, poderia jogar o futebol, o vôlei... Assim consegui quebrar o preconceito na escola. Agradeço muito aos meus pais por isso. Todos nós somos capazes; a força está dentro de cada um de nós.
Não é segredo para ninguém que os atletas com deficiência precisam superar diversos obstáculos para competir. Mas como é a vida real, fora das competições? Quais as barreiras que você enfrentou e enfrenta nos dias comuns?
Por eu caminhar, as coisas ficam mais fáceis. O que eu mais sinto falta, até por fazer parte do movimento paralímpico, é da acessibilidade. É o que mais falta. Quando o Rio foi escolhido em 2009 para sediar os Jogos, eu fiquei extremamente feliz, porque eles teriam que se preparar para receber os atletas. A cidade teria que ser uma cidade acessível. Fiquei muito feliz e vários atletas vieram falar comigo que foram aos pontos turísticos sem dificuldades. Porém, confesso que estamos muito atrasados em relação a isso. Em Bragança Paulista, onde vivo, um cadeirante não consegue circular no Centro da cidade. É assim em tantos outros lugares que vou.
Tem alguma coisa que você não consiga fazer? Se sim, como lida com isso?
Sempre tem coisas que você vai parar na sua vida, achando que é um obstáculo enorme e insuperável. Mas o que eu costumo dizer é que você sempre vai cair. O importante é levantar e entender que a força está dentro de cada um de nós. Desde criança eu fiz a escolha de ser feliz e ir atrás dos meus sonhos. Não é porque tenho deficiência que a minha vida é mais difícil que a sua, por exemplo. Vejo os obstáculos como a chance de me superar; sempre sorrindo.
Todo atleta que coloca uma medalha de ouro no peito acaba se tornando herói nacional. No seu caso, foram 14 delas. O que o Daniel representa hoje para o país? Você se vê como espelho para as novas gerações de atletas e paratletas?
Confesso que eu ainda não sei o que o Daniel representa. Tenho recebido um carinho enorme pelas redes sociais. Isso tem me deixado muito feliz. Acabei sim me tornando um herói. Em um dos comentários, por exemplo, um rapaz disse que tinha certeza que eu era um X-Men (risos). É fantástica esta admiração que as pessoas passaram a ter por mim. Quero curtir este momento e aproveitar ao máximo para colocar o esporte paralímpico onde ele merece.
Quais são seus próximos objetivos dentro e fora do esporte? Ainda tem um grande sonho?
Meu objetivo agora é curtir a minha família ao máximo até o final do ano. Quero ir para Tóquio, conhecer o Japão e quem sabe fazer parte de mais um ciclo. E, claro, incentivar a molecada com deficiência que queira participar do esporte paralímpico. Sei da importância que é ter uma inspiração, assim como me inspirei no Clodoaldo (Silva). Talvez muitos sintam o mesmo por mim. Quero dar um abraço em cada um deles.