Nos últimos anos, frequente foi, no Brasil, uma espécie de subestimação da seleção espanhola – os motivos para este fenômeno, por ora, deixemos de lado. Em algum grau, atualmente, acontece algo nesta linha: não se costuma dar à Fúria o potencial devido. A armada que dominou a Europa em 2008 e 2012, e conquistou o mundo em 2010, se renovou. E se os méritos principais em sua época de ouro eram os meio-campistas, os organizadores, talvez não surpreendentemente, hoje as virtudes soberanas seguem as mesmas. Nomes diferentes: mas qualidade parecida e estilo incrivelmente similar.
Foram-se Xabi Alonso, Xavi e até Fàbregas – ainda em atividade em clube importante (Chelsea), porém não convocado; seguiram em alto nível Busquets, David Silva e, óbvio, o gênio Iniesta; surgiram ou subiram de patamar, se firmaram no primeiro escalão Koke, Isco e Thiago Alcântara: só mencionei aqui expoentes da construção do jogo; peças capazes de ditar o ritmo, pensar, passar com esmero ímpar. Controladores da posse, da partida. Nem "volantes" na acepção que no nosso país ainda se esparge – talvez Busquets poderia assim ser chamado; mas ele é tão especial e fundamental, com sua elegância que lembra outra época, na edificação das ações ofensivas lá de trás, que... –, nem meias armadores, de ligação, claramente adiantados, pouco participativos perto do círculo central, como tendemos a imaginar os mais talentosos – algo na linha do que Zagallo chamava de "número 1".
"Ah, a Espanha tem estes passadores, mas carece de profundidade, velocidade, verticalidade": relativo na medida em que caras como Isco, David Silva e o próprio Iniesta sabem muito bem como mesclar a filosofia de toques, associações, com os instantes de infiltrar, conduzir a bola aproveitando os buracos na defesa inimiga. Além disso, e talvez principalmente, Asensio e Lucas Vásquez, ambos do Real, surgiram para ampliar o cardápio, o leque de opções: jovens, intensos, rápidos, agudos. Iago Aspas, pouco badalado provavelmente apenas por atuar no Celta, é contundente acréscimo quando pensamos em futebolistas desta estirpe.
"Ainda não me convenci. Após o ocaso de Fernando Torres, e com a aproximação do fim de carreira de David Villa, a Espanha ficou sem centroavantes". Um nome: Diego Costa. Raro por unir velocidade à boa técnica e força física. É homem de área, é atacante de lado; é brigador, é driblador; serve para o abafa, funciona no contragolpe. Uma opção ideal por se provar capaz de manter o estilo do conjunto – de técnica, qualidade, bola no chão, deslocamentos ágeis – na mesma medida em que agrega, sem rupturas, novos adjetivos – imposição corporal, por exemplo.
Noves fora este olhar ofensivo, recordemos: De Gea tem sido, nas últimas temporadas, o melhor goleiro do mundo; Carvajal, se perder para alguém no planeta em sua posição, é só para Daniel Alves; Jordi Alba está claramente atrás de Marcelo, mas provavelmente bem à frente do terceiro na lista dos maiorais do setor; a zaga Piqué e Sérgio Ramos dispensa apresentações...
Minha vontade seria a de escalar a Espanha com De Gea, Carvajal, Sérgio Ramos, Piqué e Alba; Busquets, Thiago Alcântara e Iniesta; Isco e David Silva; Diego Costa. 4-3-2-1 e a volta do sistema "árvore de natal". Três meio-campistas para ao melhor estilo Barça dos tempos áureos, Real das temporadas recentes (nem sempre, mas muitas vezes jogaram assim), e da própria fúria na sua fase mágica alugar o meio-campo; à frente deles, não um trio com dois "pontas" e um centroavante; Isco e David Silva (poderiam trocar com Iniesta) transitando, flutuando entre os meio-campistas e o "9" da equipe; como Hazard e Willian às vezes se comportam no 3-4-2-1 do Chelsea (eles formam a dupla por trás do homem gol).