Filme 'Zama' expõe feridas da colonização

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
26/10/2017 às 09:10.
Atualizado em 02/11/2021 às 23:24
 (Bananeira/Filmes)

(Bananeira/Filmes)


SÃO PAULO - Vicuña Porto é um bandido que ninguém vê, citado diversas vezes ao longo de “Zama” - uma das atrações da 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo - por personagens que disseram tê-lo visto ou matado, sendo a principal razão para os problemas da colonização espanhola na América do Sul.

Porto também é uma espécie de metáfora do complexo arranjo entre espanhóis, índios e escravos, em que tudo anda a passos vagarosos e ninguém se sente pertencente aquele lugar, com apenas um “fantasma” a uni-los.

Quando surge de fato, nos movimentos finais, Vicuña pode ser o que não é: apenas uma apropriação, um retrato que a diretora argentina Lucrecia Martel (“O Pântano”, “Menina Santa”) realiza dos colonizadores, sem nunca se identificarem com a terra.

O corregedor Dom Diego de Zama (Daniel Giménez Cacho) é quem nos conduz neste mergulho atordoante a um passado sem conquistas, em que o protagonista percorre um longo caminho para conseguir uma simples transferência.

Ele parece preso ao lugar, definhando-se à medida que tudo ao redor se pulveriza: da casa em que todos os pertences são arrancados ao cólera que assola a região. Porto seria um morto-vivo, também retratado num capitão que tem um braço em “carne podre”.

Produzido pela mineira Vania Catani, “Zama” é uma adaptação do livro homônimo de Antonio di Benedetto e foi escolhido para representar a Argentina no Oscar. Alegórico e pessimista, o filme não se encaixa no perfil dos acadêmicos.

De certa maneira, ele dialoga com “Joaquim” na forçada fusão cultural de uma época, nas imagens suja, na busca por um reconhecimento impossível e no entendimento de que o protagonista é mais uma vítima de forças que não se dá conta.

Zama está ansioso por sair daquele cenário desolador, sem nada fazer por ele. Uma incompreensão e “sujeira”, parece-nos dizer Lucrecia, que estampa a América do Sul de hoje, ainda pagando por sua má formação. 

(*) O repórter viajou a convite da organização da Mostra

© Copyright 2024Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por
Distribuido por