Millôr Fernandes costumava dizer que "quem tem obra é pedreiro", talvez demonstrando certa ojeriza pela "canonização" de um legado. Com a remoção, esta semana, do acervo que o artista gráfico, caricaturista, cartunista, escritor, dramaturgo e jornalista deixou em sua cobertura-estúdio em Ipanema, fica claro que ele foi um pedreiro pródigo, que erigiu condomínios intelectuais inteiros.
Cedido em comodato por 10 anos ao Instituto Moreira Salles (IMS) pelo seu filho, Ivan Fernandes, o acervo pictórico de Millôr Fernandes revela notável capacidade de produção, que compreende sua carreira desde o início, aos 13 anos, até a morte, aos 88 anos, em março de 2012. Há também 44 quadros, cartas, álbuns, uma mapoteca, artigos de jornais e revistas (foi colaborador do Estado entre 1996 e 2000).
"Estou cedendo o acervo sem nenhum tipo de restrição, a não ser a exigência de que seja mantido no Rio de Janeiro", diz Ivan Fernandes, de 59 anos, filho do artista. "Claro que isso não impede de o instituto fazer exposições em qualquer lugar do País ou do mundo." Fernandes acredita que o material inventariado na cobertura possa conter pelo menos 80% do que Millôr produziu, considerando-se a data inicial de 1945 como base.
A obra de Millôr será abrigada, no Instituto Moreira Salles, na reserva técnica da coleção de iconografia, que possui cerca de 2,7 mil imagens (a maioria de pintores-viajantes dos séculos 16 a 19). Millôr trará o setor para os séculos 20 e 21. O Instituto Moreira Salles informou que não pagou pelo arquivo, foi uma cessão voluntária da família. E que não tem intenção de incorporar novos acervos que tenham "algum parentesco" com a produção gráfica de Millôr. A peculiaridade da obra é que atraiu o IMS.
"Ele é tão absolutamente excepcional que não inaugurará nenhuma ala no instituto, será apenas ele. É porque é o Millôr, um cara de exceção: um excepcional artista gráfico, que escrevia muito, que também produzia aforismos e haicais, que também era dramaturgo e um tremendo tradutor", afirma Flávio Pinheiro, superintendente do Instituto Moreira Salles.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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