Índios tiram título de eleitor no Rio para lutar por um emprego

Flávia Villela - Agência Brasil
02/10/2012 às 17:44.
Atualizado em 22/11/2021 às 01:45

RIO DE JANEIRO – Embora o voto seja opcional para os índios brasileiros, dos cerca de 600 indígenas que moram no Rio de Janeiro, aproximadamente 300 fizeram questão de tirar o título de eleitor. O motivo, porém, não é apenas conscientização da importância do voto, mas, sobretudo, a necessidade do documento para os jovens em busca de emprego, segundo as lideranças das aldeias.

Marcos Caraí Peralto, 21 anos, da Aldeia Itaxim, tirou o título aos 18, pois todos os lugares onde procurou trabalho pediam título de eleitor. Ele se queixou da dificuldade de se tirar o título nas aldeias, pois muitos não têm certidão de nascimento, documento obrigatório para se tirar a cédula eleitoral.

“Para tirarmos o título, precisamos tirar dos nossos próprios recursos, mas eu tirei, porque hoje em dia, para trabalhar, precisamos do título. No momento não estou trabalhando, mas estou procurando”. O jovem disse, porém, que acredita que, por meio do voto, eles podem eleger representantes para ajudá-los a garantir os direitos dos índios.

Na Aldeia Itaxim, em Paraty, na Costa Verde do estado, com 180 índios da etnia Guarani, cerca de 70 vão votar no dia 7 de outubro. Na Aldeia Sapukai, a maior das quatro aldeias do estado, em Angra dos Reis, na mesma região, dos cerca de 400 guaranis, pouco mais de 130 têm título de eleitor.

O vice-cacique da Aldeia Sapukai, Domingos Venite, de 61 anos, disse que alguns membros da comunidade estão até se alistando no Exército, embora não seja obrigatório aos índios, para ajudar em uma futura vaga de emprego. Ele lamentou a realidade dos jovens indígenas, hoje em dia sem oportunidades dentro da terra indígena, e alertou que se não forem feitas políticas públicas para essa faixa etária, a delinquência pode se tornar uma realidade entre a juventude indígena.

“Hoje está muito difícil para os povos indígenas. Não temos terra para trabalhar. É pouca terra e é pouco produtiva. Não dá para viver apenas do artesanato. A gente está preocupado, porque os jovens querem ficar, mas não têm condições de trabalhar e ganhar dinheiro. A gente se preocupa que, daqui a uns 10, 15 anos, possa ter índio roubando, assaltando”.

O vice-cacique informou que, atualmente, a maioria vive do artesanato, da profissão de professor, agente social e de benefícios de programas sociais do governo, como o Bolsa Família.

A presidente da Associação Indígena Guarani, Ivanilde da Silva, 37 anos, também da Aldeia Itaxim, tirou o título com mais de 20 anos, por exigência do empregador na época. Mas ela acredita que a consciência sobre a participação dos índios nas eleições tem aumentado. “Este ano é o mais consciente aqui na aldeia, a gente quer ficar mais inserido no município e com mais direitos de cobrar das autoridades. Agora estamos analisando os candidatos”, disse ela.

De acordo com o coordenador técnico da Fundação Nacional do Índio (Funai) na região, Cristino Cabreira, uma pequena parcela dos índios têm acompanhado, sobretudo, pelos meios de comunicação, a política nacional e estão integrados com outros grupos indígenas de outras regiões do país. Segundo Cabreira, quase todos são lideranças das aldeias.

“Alguns estão sendo contratados como agentes de saúde e professores dentro das aldeias, e têm uma consciência política”, disse o técnico indigenista. Já entre os jovens, ele acredita que essa consciência ainda não exista, na sua maioria.

No estado do Rio, a estimativa do Centro de Assessoria Intercultural Kondo, associação civil sem fins lucrativos criada para promover e proteger a cultura Guarani, cerca de 35 mil índios dessa etnia vivem atualmente no território brasileiro e 90 mil estão distribuídos entre a Bolívia, Argentina e o Paraguai.

Eleito deputado federal em 1982, o cacique Mário Juruna foi o único representante indígena no Congresso Nacional até hoje. Dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estima que os índios representem cerca de 0,5% da população brasileira. Para se candidatar, o índio precisa ser alfabetizado e falar português. Já para votar, é necessário apenas um documento com foto e o título de eleitor.

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